quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Os trabalhos dos Serviços Florestais na Serra do Gerês em 1907-1908

 


O ano económico de 1907-1908 viu uma mudança na direcção dos Serviços Florestais na Serra do Gerês.

Desde Julho, tendo saído dos Serviços Florestais o chefe Cerqueira Machado, até 25 de Novembro seguinte, esteve a superintendência do Gerês entregue ao silvicultor José Lopes Vieira (imagem em cima), dos serviços do Rio Liz, e daí por diante ao silvicultor Egberto Magalhães Mesquita (imagem em baixo), chefe da arborização das dunas.

O silvicultor Lopes Vieira fez apenas duas visitas ao Gerês, interessando-se, porém, muito pelos seus trabalhos. Os Serviços Florestais no Gerês tiraram muito partido dos conhecimentos de Lopes Vieira, que era tido como um técnico inteligente e sabedor. Infelizmente, a sua morte, nas condições inesperadas em que ocorreu, fez com que se quebrasse a cooperação recíproca que se esboçava para o futuro do Gerês.

Nas palavras de Tude de Sousa, "Tendo vindo ao Gerês, onde demorara uns dias, e retirando para Leiria, acompanhamo-lo até ao Porto, onde ambos tratamos de assuntos de serviço e um dia, ao procurá-lo, encontramo-lo morto dentro de casa, coberto com as roupas, como se naturalmente dormisse!"

Este ano viu importantes serviços de plantações e sementeiras a ocorrer na Serra do Gerês. As plantações efectuaram-se nas ravinas e pregas húmidas das encostas de nascente e poente da bacia do Gerês: na do nascente, quase tudo de plantação nova, e na de poente no preenchimento de falhas de anos anteriores, nas vertentes do Escuredo e Pereira, procurando-se em todos os casos a adaptação e escolha das essências locais.

Também se plantaram pinheiros silvestres nas Gramelas e em Albergaria, em continuação de outros iguais de anos anteriores.

As sementeiras fizeram-se em maios escala na bacia do Gerês, ficando ligada deste ano uma extensa faixa, desde a ravina do Rio da Figueira até à ravina da Quelha Verde, e do Curral do Vidoeiro até à ravina do Azeral.

Do Vidoeiro (curral) até ao Azeral serve de extrema à sementeira, pelo lado do nascente, a estrada florestal para a Pedra Bela, cuja construção fora principiada na segunda quinzena de Agosto. O corte da estrada neste ano económico foi até ao Azeral, numa extensão de 1.500 metros.

O Curral de Vidoeiro, já pouco utilizado pela vezeira do Vilar da Veiga, menos o poderia ser de futuro; no entanto, como a lei garantia aos povos o uso dos currais da serra, não podiam os Serviços Florestais tomá-lo em seu proveito sem a concordância da gente do Vilar. Para se chegar a isso, procurou-se e conseguiu-se um entendimento com os gerentes da vezeira que concordaram em que se transformasse o curral num pequeno parque, com a condição de que lhes fosse permitida a passagem, principalmente no Dia dos Covais, para ali fazerem a sua merenda ao regressarem do conserto dos caminhos e cabanas dos pastores, que antecede a subida dos gados para a serra.

Assim se combinou e assim se fez neste ano, transformando-se o curral num pequeno parque que está logo à derivação da estrada nacional do caminho para a Pedra Bela.

Outra sementeira fez-se em grande parte da encosta de Palheiros, que estava nua, entre uma antiga sementeira junto do Rio de Palheiros e as sementeiras que em anos anteriores se vinham a realizar da Portela do Homem, pelo Penedo Redondo e Vales, ficando assim ligada a encosta da Portela ao Rio de Palheiros por uma contínua e extensa faixa de pinhal.

Havendo na Assureira um pequeno terreno, pertencente a Vicente Paulino da Silveira, confinando com outros do Estado e que a este convinha adquirir, foi pelas Matas dada e troca superfície igual em Pontelhas, junto dos terrenos do mesmo Silveira.

O documento oficial da troca foi como se segue...

"Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil novecentos e sete, aos trinta dias do mês de Outubro e sede do serviço de arborização do Gerês compareceram perante mim, José Lopes Vieira, Silvicultor chefe do serviço de arborização do Gerês, por parte do Governo, como primeiro outorgante e autorizado para notariar este acto, como consta da ordem de serviço n.º 126 de seis de Setembro último da Direcção Geral de Agricultura, o sr. Vicente Paulino da Silveira, solteiro, maior, residente nas Caldas do Gerês, Hotel do Parque, freguesia do Vilar da Veiga, comarca de Vieira, como segundo outorgante e as testemunhas diante nomeadas, pessoas idóneas minhas conhecidas e as próprias, do que dou fé. Apresentado pelo segundo outorgante o documento n.º 76 de contribuição do registo, na importância de seiscentos e quarenta e dois reis, passado pela recebedoria de Terras de Bouro em cinco de Outubro corrente, foi dito por mim, como primeiro outorgante, que por despacho ministerial de cinco de Setembro de corrente ano estar autorizado a trocar com o segundo outorgante um terreno de mato no sítio de Pontelhas, limite de caldas do Gerês, com a superfície de um hectar e treze ares, confinando pelo norte com o segundo outorgante e pelo sul, poente e nascente com o perímetro do Gerês, que o dito terreno é alodial, livre de ónus ou pensão e assim o transmite ao segundo outorgante, em troca de um outro terreno, também alodial, denominado a Tomada e que o segundo outorgante possuí no sítio da Assureira, limite do Gerês, digo, Caldas do Gerês. O segundo outorgante apresentando certidão negativa do conservador privativo do registo predial da comarca de Vieira, declarou aceitar o presente contrato de troca, fazendo-a boa e de paz por si e seus herdeiros.

Mais se declarou que as respectivas posses se haviam por dadas e tomadas.

Foram testemunhas presentes, Manual Rodrigues Almas, casado e António Rodrigues das Almas, solteiro, ambos maiores, naturais de Braga e residentes nas Caldas do Gerês. Para poder constar lavrei este termo, e o li em voz alta perante todos que o assinaram comigo José Lopes Vieira, que o escrevi.

(aa.) Vicente Paulino da Silveira, Manuel Rodrigues Almas, António Rodrigues das Almas, José Lopes Vieira"

A 25 de Março de 1908 lançaram-se no Rio Gerês, abaixo e além do Torgo, cerca de 200 trutas irideus e sahchimus fontinalis, fornecidas pela Estação Aquícola do Ave, continuando-se assim a promover e zelar o povoamento das águas da serra.

No chalé da Repartição colocaram-se persianas nas janelas da face sul e fizeram-se divisões no forro junto ao telhado, em quatro compartimentos.

Tiveram este ano grande desenvolvimento os viveiros, sendo de 42.320 o número de várias plantas repicadas, além das numerosas espécies semeadas em canteiros, como pinus silvestris e laricio da Corsega, pseudo-tsuga douglasii (Colorado), sequoia gigantea e sempervirens, grevilia robusta, larix leptolepis, liriodendron tulipefera, diospiros lotus e virginiana, etc., além de mais de 50.000 glanes de quercus pedunculata da serra. Entre as repicagens contavam-se os exemplares nascidos e apresentados viáveis de uma colecção de quercus americanos semeados em Março de 1907, cujas glandes, vindas da América, se apresentaram bastante prejudicadas e pouco capazes de garantirem bom êxito.

São desta sementeira e repicagem os diversos carvalhos americanos e poucos mais que nos anos seguintes apareceram registados em plantações diversas...


A pastoreação na serra é livre para os povos limítrofes, salvo nos terrenos ocupados por sementeiras e plantações novas, onde a entrada dos gados é vedada até que assim seja conveniente.

Para se avaliar da importância pecuária da região confinante com a mata do Estado, chamo a atenção para o texto "Nota sobre as vezeiras em 1907" publicado neste blogue a 16 de Maio de 2024.

Neste ano foram semeados 110 hectares distribuídos pelo Forno Novo; Pisco; Pereira, Cascata e Palas, Estriz e Palheiros. 

As plantações realizadas foram as seguintes:

Pereira e Porcas

- Acácia Melanoxilon...........1845

- Castanea vulgaris...............340 

- Grevilea robusta.................2

- Eucalyptus globulus...........255

- Liriodrendon tulipifera.......2

- Morus diversas...................100

- Robinia pseudo-acácia.......120

- Ulmus americana nigra......55

- Larix europeia....................130

- Pinus strobus......................34 (TOTAL, 2883)

Encosta de Vidoeiro - Curral de Vidoeiro - Forno Novo

- Acácia Melanoxilon...........42

- Acer psuedo-platanus.........24

- Betula alba.........................132

- Betula lenta........................34

- Eucalyptus globulus...........22

- Fraxinus amaricana alba....34

- Morus alba.........................2

- Morus nigra........................9

- Morus diversas...................30

- Paulonia imperialis.............24

- Platanus orientalis...............57

- Populus canadiensis............90

- Populus eucalyptus suissos.95

- Robinia pseudo-acácia.......150

- Quercus coccinea...............90

- Quercus nigra.....................35

- Tilia argentea......................6

- Ulmus americana nigra......54

- Cedrus atlantica..................6

- Cedrus deodara...................54

- Cedrus libani.......................6

- Cryptometria japonica........4

- Cupressus glauca................69

- Larix europeia....................149

- Pinus longifolia..................43

- Pinus strobus......................54

- Pinus sylvestris...................773

- Pseudo-tsuga douglasii.......383

- Sequoia sempervirens.........44 (TOTAL, 2517)

Caminho da Pedra Bela

- Acer psuedo-platanus..........1

- Betula alba..........................6

- Betula lenta.........................3

- Brachychiton acerifolium...2

- Carya olivefolia..................5

- Casuarina temuissima.........5

- Eucalyptus colossea............17

- Fraxinus amaricana alba.....6

- Grevilia rocbusta................18

- Cedrus libani........................8

- Liridendrun tulipif...............21

- Morus alba...........................1

- Paulona imperialis...............1

- Platanus orientalis...............13

- Quercus coccinea................7

- Ulmus americana nigra.......13 (Total, 119)

Albergaria

- Pinus Sylvestris...................500

Gramelas

- Pinus Sylvestris...................11890

Pisco e Rio da Figueira

- Acácia bayleiana..................97

- Acácia melanoxilon.............600

- Acácia prominens................205

- Betula lenta.........................10

- Fraxinus alba.......................60

- Morus diversas....................80

- Robinia pseudo-acácia........150

- Quercus coccinea................10

- Ulmus americana nigra.......165

- Cedrus atlantica...................4

- Cedrus libani.......................4

- Pinus strobus.......................62

- Pinus sylvestriss..................150

- Cupressus glauca.................282

- Pseudo tsuga douglasii........688

- Sequoia sempervirens.........79 (Total, 2646)

Campo de Vidoeiro

- Grevilea robusta..................2

- Paulonia imperialis.............1

- Pinus pinaster......................3

- Pinus sylvestriss.................150 (Total, 66)

Escuredo

- Acer pseudo-platanus.........113

- Morus diversas...................45 (Total, 158)

Cascata das Caldas

- Morus diversas...................136

- Robinia pseudo-acácia........20

- Larix europeia.....................43 (Total, 201; TOTAL, 20980)

Texto adaptado de "Mata do Gerês - Subsídios para uma Monografia Florestal" (Tude Martins de Sousa, 1926)

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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