quinta-feira, 1 de setembro de 2016

241... Minas dos Carris, por entre a noite e o dia


Era tépida a brisa que lhes lambia a pele naquela noite de Verão. O dia estivera quente e os quatro companheiros esperavam que a noite lhes trouxesse o sossego à pele. Este veio numa mistura de lufadas de ar quente e por vezes fresco.

A noite envolvia-os à medida que as luzes do carro que os trouxera até ali se desvanecia da tangente da curva do caminho poeirento. Era então hora de começar a caminhar e os quatro companheiros ganhavam um quinto elemento que nos momentos de silêncio lhes preenchia os pensamentos por entre as finas teias de aranha que por vezes lhes cobriam o rosto.

Ansiavam pela Lua que eventualmente lhes traria algum luz ao caminho. Porém, chegados aos Abrigo de Penedém era apenas a luz das lanternas que iluminada o chão de erva seca pejada de estrume e o abrigo recém recuperado pelos braços da vezeira. A passagem foi ligeira até porque, em contra-luz com a ténue luminescência do céu violeta escuro, se erguiam imponentes os contornos da serra que os recebia no seu ventre.


Os caminhos que são conhecidos de dia, transformam-se em regos pardos pela noite escura. Porém, a claridade do granito das mariolas ajudam sempre na orientação, mesmo por entre as trevas que envolviam aqueles espaços. Ao longes, as luzes das aldeias criavam bolhas de um ténue vermelho na abobada celeste e os pontos vermelhos cintilantes assinalavam os topos de outras serras mais a Sul.

Caminhando por entre os Currais do Couce, estavam guardados pelo colosso granítico do Borrageiro. Em pouco tempo passava-se ao lado dos Currais dos Cocões do Coucelinho e enveredava-se pela subida do Quelhão. Foi por esta altura que o sexto elemento de juntou ao pequeno grupo. A Lua marcava a sua presença no céu iluminando os recantos com a sua luz ténue que fazia jogos de sombras, enganando os soslaios que por vezes se arremessavam a uma sombra mais travessa.




O Quelhão é quase como que uma passagem entre dois mundos, uma «longa» escadaria que nos leva às alturas Geresianas, entrando depois nos Currais de Lamas de Homem e chegando às Abrótegas, enveredando depois pelo velho caminho mineiro cheio de histórias e mágoas.

Passando o Curral de Cabanas Novas, o caminhar tornou-se uma experiência memorável à luz da Lua que iluminava o caminho que se estendia como uma passadeira por entre a negritude da serra. As ruínas estavam coroadas pelos milhões de estrelas que cintilavam naquele céu magnífico vencendo a luz da Lua. O silêncio era profundo, mas aqui e ali a brisa fazia-se notar com a sua baforada quente.

A sensação de caminhar pelas ruínas por entre as sombras que balançam na imaginação e as outras que se escondem quando para lá apontamos as lanternas, é já uma sensação conhecida de muitos anos. Certamente será por estarmos num espaço onde em tempos a vida dos homens floresceu. Um local de esperanças, medos, alegrias e receios, mas também de pesar. Ali, por entre as sombras e as ruínas, é quase este pesar que nos faz falar mais baixinho, como se tivéssemos o receio de despertar a atenção de algo que não queremos ou com o receio de acordar alguma família que dorme naquelas memórias que escorrem de cada parede.

Passando então em silêncio por entre as ruínas, dirigimo-nos para onde veríamos o espectáculo que a Natureza que iria ofertar dali a algumas horas. A caminhada não foram longa, mas o descanso era certamente merecido debaixo daquele céu magnífico e envoltos no calor do saco-cama que nos permitia aguardar com mais conforto a transformação que estava prestes a acontecer.

O horizonte escuro a Nascente ia-se transformando à medida que as estrelas, uma a uma, se iam apagando. A linha do horizonte tornava-se definida ao raiar da alva que por ali iam chegando. O céu tingia-se de azul e as cores quentes do nascer do Sol iam conquistando a paisagem aqui e ali traçadas pelo passar de um avião. O dia ia-se aproximando e quando o Sol se deixou ver lá longe para lá do Larouco, um vento varreu os granitos ainda tépidos do Gerês.




Durante vários minutos ali ficamos a olhar a transformação da paisagem. A ver a luz a invadir as corgas e a preencher os vales, banhando a Serra do Gerês.

Depois deste maravilhoso espectáculo, demos início à longa jornada de regresso. O ponto final seria Fafião e esperava-nos um dia quente. No nosso pensamento estava o Porto da Laje para um merecido descanso e mergulho para acalmar o calor da pele. Depois de abastecidos com a única fonte ainda a ter água nas Minas dos Carris, a Fonte do David, enveredamos a marcha passando pelo Salto do Lobo seguindo depois em direcção ao Curral de Cabana Nova. De seguida, iniciamos a descida por trilhos seculares até ao Curral Comprido e passando na base de Maceiras, começamos a acompanhar por algumas centenas de metros o leito seco do Ribeiro do Couce. Em pouco tempo chegávamos ao Curral do Couce e iniciávamos a subida até às Minas do Borrageiro, passando pelo antigo Altar de Sta. Bárbara e pela entrada da única galeria subterrânea daquele pequeno complexo mineiro já centenário.

Iniciamos então a longa descida que nos levaria ao Porto da Laje, passando ao lado do Penedo Redondo e entrando na estrada em terra batida que segue pelo longo vale e entrando na Corga Mão de Cavalo, seguindo a margem direita do Rio da Pigarreira até chegar a Porto da Laje. O merecido descanso e o retemperar de forças acabaria por acontecer no Curral da Touça, antes de iniciarmos o que seria a penosa caminhada por parte do Trilho da Vezeira de Fafião até esta aldeia sobre um calor escaldante.




































































































Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

1 comentário:

CHEIRO DA MONTANHA disse...

Obrigado, Rui Barbosa texto/descrição...ao ler caminhei convosco...ouvi o gemer da pedra solta debaixo das botas..Abraço