De memórias, caminhos velhos, paisagens de mistério, corgas profundas, paredes alcantiladas. Histórias de mitos, abrigos escondidos e outros nem tanto, pequenos regatos, mariolas antigas... o toque do vento, o suor na pele que arde com o Sol refulgente da manhã na esperança de prados argênteos e o vislumbre da sombra fugaz e ligeira que se esconde do olhar... E pronto, o Gerês é isto...
Manhã fresca e o vento balanceia os cedros que marcam a paisagem na Portela de Leonte. A caminhada tem de ser rápida, mas não tão apressada, pois a volta é pequena, mas o suficiente para algumas paragens... o fôlego e as vistas assim o exigem.
Passa-se o velho caminho que se embrenha na floresta com as marcas de outros tempos quando os homens chegaram e tomaram à força a serra. Essas memórias são agora histórias confusas e linhas de tinta nos livros, novos ou velhos. O rio corre sem se importar comigo e os raios de Sol atravessam as ramadas formando rendas com pontos de fuga. Tento capturar como um caçador de imagens, mas cedo me apercebo que a captura em vão... tal como acontece com os caçadores, pois a beleza vive-se naquele momento e não fixada num conjunto de 'uns e zeros'.
O percurso abandona a estrada e entra num estreito carreiro que me vai levar à ponte de madeira sobre o Maceira. Passo para a outra margem. Mais adiante, a Pala de Maceira surge como um monumento ao silêncio e à escuridão de outros tempos. O buraco é escuro, húmido e estreito, "eram tempos difíceis, sabe senhor!"
Para uns momentos, quero registar na memória o som dos pássaros e o jogo entre o vento e o rio. O curral está só, como tantas vezes está. O Sol, mesmo nas horas temperanas, está quente. O vale estreito prolonga-se mais adiante, terminando nos cumes rochosos e pontiagudos num jogo perspicaz do granito. Da fonte jorra uma água fresca que acalma a pele e sacia a sede.
Atravessa-se de novo o rio para a outra margem. Nesta altura é possível, pois o caudal é curto e as águas segue calmas por ali. O pequeno carreiro jaz escondido ali atrás da vegetação... '...da outra margem não o veria, senhor!" Mais adiante surge a Para do Canudo ou Pala da Sónia. Tal como em muitos locais serranos, o aproveitamento é engenhoso. A um bloco saliente juntam-se pedras ao alto e faz-se uma entrada. O abrigo pastoril do Gerês é fruto da necessidade do homem na sua milenar luta contra os elementos.
O carreiro estreito vai então serpentear encosta acima ora passando por pequenos bosques, ora tornando-se quase indistinguível por entre a urze e a carqueja. Em pouco tempo vislumbramos grande parte do vale, a Encosta de Maceira, Tábua, a Corneda, a Corga dos Cantaros, Carris de Maceira e Pé de Medela a rasgar os céus. Ali ao lado, Bemposta assinala o local de vigia das legiões que demandavam a região... há já dois mil anos atrás!
Chega-se ao Cabeço de Lavadouros e vê-se já o Vidoal que aos poucos vai ganhando cores de Verão... inexoravelmente, o Inverno vai chegar! A paisagem mostra-nos o Pé de Cabril como pano de fundo, mas estende-se para os píncaros da Serra Amarela e da Serra de Sta. Eufémia coberta com as neblinas que vêm do Rio Lima. A descida deve fazer-se com cuidado por entre a pedra seca ou coberta em alguns pontos pelo visco da humidade. Passamos então a pequena cascata que se despenha numa pequena lagoa e tomamos o carreiro que nos levará á fonte que mata a sede ao Vidoal. A descida será fácil e já muito conhecida, levando-nos à Chã do Carvalho ao lado da Corga do Mourô e terminamos na ruidosa Portela de Leonte...
Algumas imagens do dia...
Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados) cedidas por autor devidamente dientificado
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