terça-feira, 26 de janeiro de 2010

A Serra! (IV)

Esta é a quarta parte do artigo "A Serra!" que em Junho de 1935 os repórteres da defunda Latina escreveram após visitarem a Serra do Gerês.

Disponível no seu n.º 4 - Julho de 1935 (Vol. II), este artigo escrito por Camacho Pereira (Director da Revista Latina), descreve um passeio pela Serra do Gerês. O texto é aqui transcrito mantendo as suas características originais.

"(...)

Chegamos ao marco, 1433 metros, por volta da uma hora da tarde, vulgarmente os excurcionistas que se atrevem a subir cá cima e que nunca se arrependem de o ter feito, pois ficam bem compensados de algum cansaço que tenham sentido, endireitam a Leonte que atingem em duas horas de caminho e depois pela estrada fácilmente encontram os hoteis das termas.

Nós alteramos aqui o nosso itinerário e resolvemos estabelecer outro términus, o Peito da Escada e assim tomámos outro caminho seguindo pela Lomba de Pau. É nesta descida que se nos depara um dos mais formidáveis espectáculos da serra: em frente a monstruosa ravina do Vale do Conho e de Fechinhas, amplissimo panorama de granito! Pedras ao pé, pedras ao longe, enorme visão das épocas das convulsões geológicas!

Aqui, além, ao longo do caminho encontramos pequenas pirâmides de pedras soltas à beira do trilho.

- Para que servem?

- Isto são as Mariólas.

«Sabem os Senhores, quando neva, no Inverno, todos êstes caminhos desaparecem debaixo da neve e nós pomos os Mariólas para intrujarmos a neve e sabermos por onde vai o piso.»

Ao fundo da Lomba de Pau em frente ainda às Fechinhas, nova Chã com a sua cabana abrigo, e já à vista da Fontes das Alvas cujas rochas semelham uma fortaleza, tomamos outra refeição, e recomeçamos a caminhada com vista de atingir o alto do Cantarelo.

Escalamos montes, atravessamos ribeiros, recomeça a vegetação rasteira, que vai crescendo à medida que avançamos, dando-nos pelo peito nas últimas Chãs. Ao fundo de uma das numerosas descidas encontramos a Vezeira guardada naquêle dia por manuel Fento e Manuel d'Além, doi snomes curiosos, no seu dia de Vezeiros em 24 de Julho de 1933 no Prado da Messe, o maior de tôda a serra.

Vezeira - é um vocábulo local, originado pelos costumes e tradições que os povos gerezianos guardam como legislação própria e escrita e acatam de bom grado e motu-próprio. Todos os anos e assim que acabam as lides das leiras alcandoradas nos pendores da serrania, todos os visinhos juntam os seus gados e os levam para as Chãs de pastoreação do alto da serra onde passam todo o Verão, e cada visinho, à vez, tem de guardar o gado todo, durante um dia por cada cabeça que lá possua.

Todos os dias guardam dois e ao anoitecer chegam os que ficarão no dia seguinte de modo que de noite ficam sempre quatro vezeiros.

Vezeiros porque vão á vez. Vezeira porque é para onde vão os vezeiros.

(...)"

Fotografia: © Rui C. Barbosa (Original de Camacho Pereira)

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