As aldeias de montanha e de cariz agropastoril, devido ao seu isolamento e com um contacto muito tardio com a dita civilização, basta lembrar que a luz eléctrica só chegou a Cabril há cerca de 40 anos, muitas das estradas vieram mais tarde. Por isso, não é de estranhar que a maioria das aldeias ainda guardem lendas e tradições de outra hora e de outros tempos que eram transmitidas aos mais novos, normalmente aos serões nas rigorosas e gélidas noites de inverno, sempre ajudavam a "matar" o tempo e a tornar as noites longas e frias mais quentes.
Eram serões animados e muito participativos, junto a uma enorme lareira. Normalmente as cozinhas eram grandes, sendo o local central da casa, onde se juntava o agregado familiar e alguns vizinhos da aldeia. Era nessas alturas que se contavam histórias mirabolantes, histórias de locais encantados, do tempo dos Mouros, sítios de bruxas. A serra do Gerês é muito fértil em tradições orais e lendas, há sempre um local onde se diz que aparece algo, há lendas de locais que contém grandes tesouros enterrados ou então tesouros que contém um encantamento em que era necessário usar-se o sagrado e, ao mesmo tempo, tenebroso livro de S. Cipriano (aquelas casas que possuíam o livro guardavam-no como se de um tesouro se tratasse). O próprio livro refere locais encantados tanto na vizinha Galiza como em locais da serra do Gerês. Contam-se histórias de homens que com a ajuda do livro e normalmente acompanhados de um padre, tentaram desfazer alguns encantos, mas pelo medo ou por outro motivo qualquer, havia sempre algo que não corria bem, e os enormes tesouros lá ficavam à espera que apareça outro corajoso.
As lendas sempre fizeram parte dos povos e das aldeias do Barroso, muitas delas cingem-se a lugares individuais ou específicos, e é raro ver uma lenda a ligar dois locais tão separados e distantes um do outro, como acontece com o Buraco das Cervas que fica nos Cabeços, logo abaixo da Roca dos Teixos, bem perto da aldeia de Xertelo, e o Canto da Ola que alberga o Poço dos Mouros que era conhecido pelos pastores das cabras por Dornão, o que é lógico, pois segundo o professor Fernando Cosme e no seu livro "Pela serra do Jurês e ao longo da Jeira, história da toponímia" refere que Dorna terá como a palavra Ola, o significado de redemoinho num curso de água, escavação circular que esse redemoinho produz no leito rochoso.
Ora, o Poço dos Mouros não é nada mais do que isso, uma verdadeira maravilha da natureza, se bem que aterradora, mas, ao mesmo tempo, tal é a grandiosidade do buraco com cerca de 55 metros de altura, que era evitado a todo custo pelos pastores, não gostavam de lá passar, enquanto o Buraco das Cerves era segundo a tradição oral uma passagem do tempo antigo do tempo dos Mouros na linguagem do povo, que era uma passagem para o outro mundo, que iria sair ao Canto da Ola, daí o nome de Poço dos Mouros. É tradição também que na sua saída tinha duas enormes padieiras de pedra e um grande portão em madeira e que nos tempos antigos servia de passagem para fugir as guerras. Fala-se que várias pessoas tentaram fazer o caminho do Buraco das Cerves até ao Poço dos Mouros, mas que as luzes se apagavam repentinamente, que as lanternas deixavam de dar luz e que pelo meio do caminho havia várias hipóteses em forma de labirinto.Háa quem diga que também tem uma grande câmara em que entra luz natural e logo a seguir tem duas minas e, nessa altura tem de se optar bem para se poder chegar ao Canto da Ola, mas é preciso ter juízo...
Texto e fotografias © Ulisses Pereira (Todos os direitos reservados)
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