segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Trilhos seculares - Ao Pico da Nevosa


O ano quase, quase que começaria como havia terminado 2021, isto é, então faltava-me a subida ao Pico da Nevosa e naquela altura, mas saberia que lá regressaria passado alguns dias. Assim foi, na primeira visita ao ponto mais alto da Serra do Gerês e do Norte de Portugal. Em 2022 deverei lá voltar mais algumas vezes!

Este texto é em parte baseado e adaptado de um outro publicado a 19 de Dezembro de 2021.



A caminhada foi feita a partir da Corga da Abelheira, uma verdadeira porta de entrada para um Gerês imenso, quase selvagem e que nos transmite uma sensação de grandiosidade que a estas montanhas só lhe falta em dimensão. Os últimos quilómetros ou últimos metros que nos levam ao ponto mais elevado da Nevosa, enchem-nos de uma sensação de aventura e conquista que só aquele lugar nos dá na Serra do Gerês, mesmo sendo uma subida fácil. É talvez pelo facto de ser o ponto mais elevado da geresiana serra ou dar a sensação de ser uma fronteira entre dois mundos, mas o Pico da Nevosa traz a sensação de que, de facto, conquistamos algo, quanto mais não seja a imensa paisagem perante a qual nos tornamos tão pequenos.

Por esta altura do ano, e com os dias ainda curtos, o passo torna-se ligeiro, pois o Sol corre no céu e as sombras são ainda longas. O dia esteve quase a tornar-se num verdadeiro dia de Inverno, com as nuvens e o denso nevoeiro a cobrir os pontos mais elevados da região e a fazer-nos apressar no regresso.


O dia frio começou com a subida pela Corga da Abelheira, maravilhando-nos com o caos granítico da Teixeirinha até chegar a Entre Caminhos, uma verdadeira varanda natural para o Gerês selvagem e pouco caminhado. Daqui, o horizonte é limitado pelas serranias graníticas e nuas, a verdadeira essência da Serra do Gerês atravessado por pequenos ribeiros em profundas corgas numa paisagem cortada por vertentes alcantiladas, salpicada por prados verdejantes e atravessada por carreiros de história e memórias de tempos idos, onde a pastorícia, a carvoaria e a exploração mineira escreveram as linhas da história destes locais. 

A paisagem vê-se também polvilhada de grandes blocos graníticos em tempos arrastados pelas forças dos glaciares que moldaram aqueles vales. De facto, na Serra do Gerês podem-se encontrar formas de relevo e zonas sedimentares que são memória das acções da glaciação que afectaram aquelas montanhas há centenas de milhares de anos. No vale de Compadre, por onde acabaríamos de passar, tivemos a oportunidade de observar acumulações de blocos graníticos (moreias) criadas pelo movimento dos glaciares. Destas, destaca-se a moreia lateral de Compadre, a mais extensa do Norte de Portugal, com cerca de 1 km de extensão, e noutros sectores do vale, tais como a Ribeira da Biduiça e vertente ocidental dos Cornos de Candela, ocorrem sedimentos (denominados 'till subglaciário') que permitem estimar uma espessura de gelo de cerca de 150 metros, durante o máximo da glaciação. 


Deixando então para trás aquela magnífica varanda em Entre Caminhos, iniciamos uma curta descida para os currais de Biduiça (Biduiças) e seguindo a Norte, chegávamos ao Curral das Rocas de Matança situado na margem do Ribeiro da Biduiça. Aqui, enveredamos por um carreiro que nos ajuda pausadamente a vencer a encosta e que eventualmente nos levará às imediações dos Currais de Matança. Porém, em vez de descer ao vale e atravessar a Ribeira das Negras, flectimos à direita e seguimos na direcção do Marco K. Ao contrário da última vez que por lá passei, fiz questão de visitar este pequeno marco, um dos três marcos alfabéticos da Serra do Gerês. De seguida, prosseguimos a caminhar na vertente sobre o Ribeiro de Lamelas e chegando aos Currais das Negras. Daqui, avista-se já a parede da Represa dos Carris e algumas cicatrizes deixadas na paisagem pela mineração na concessão mineira da Corga das Negras I, com a sua escombreira e boca-mina.

Tomando um carreiro a Norte, seguimos em direcção à Garganta das Negras, seguindo o caminho em relativo bom estado até chegar à confluência das corgas que originam a Ribeira das Negras. Tal como aconteceu na última visita, seguimos as mariolas que nos levariam ao velho carreiro na face Oeste da Nevosa. Porém, antes tive o cuidado de verificar a chegada do velho carreiro vindo de Marabaixo, pois seria por aqui que faríamos o regresso.


Vencendo lajedos graníticos, chegávamos então ao velho caminho de acesso à base do Pico da Nevosa. Este carreiro inicia-se junto à linha de fronteira e percorre a face Poente do maciço da Nevosa durante algumas centenas de metros, flectindo a Norte por entre uma passagem entre o promontório granítico mais elevado (Pico da Nevosa) e um alto que só nos apercebemos dele quando ali chegamos (ou quando analisamos a orografia do terreno numa carta topográfica). Caminhando por algumas dezenas de metros em direcção a Norte, vamos atingir de novo os limites de fronteira até nos apercebemos da rampa de acesso aos pontos mais elevados daquele titã adormecido que nos permite um acesso relativamente fácil ao seu ponto mais elevado a 1.548 metros de altitude.

Por esta altura, estávamos já a caminhar num denso nevoeiro que mal nos permita ver o Pico da Nevosa a escassas dezenas de metros à nossa frente. Após permanecer alguns minutos no ponto mais elevado do Norte de Portugal na esperança que o nevoeiro desse tréguas e as nuvens corressem para outras paragens encetou-se a descida - e o início do regresso - baixando então para o Colo de Marabaixo.


A paisagem que o ponto mais alto da Serra do Gerês nos proporciona leva-nos a "serras tão distantes como a noroeste as serras do Suido, Paradanta e Faro de Avión na Galiza, a nordeste as serras de S. Mamede e de Manzaneda habitualmente nevadas no inverno, e a este a Peña Trevinca, Segundeira, Gamoneda que se erguem entre as províncias de Ourense e Zamora e se prolongam para sul nas serras de Montezinho, Coroa e Nogueira já em território português.

No Colo de Marabaixo, e escondido pela alta vegetação, conseguimos encontrar o carreiro que nos levou de volta aos Currais das Negras, passando pela escombreira da velha mina. Passados os Currais das Negras, e seguindo a vertente da margem esquerda da Ribeira das Negras, tomamos o velho carreiro em direcção ao Ribeiro de Lamelas, atravessando para a sua margem esquerda e seguindo até perto Valongo. A certo ponto, flectimos à direita, atravessando de novo o Ribeiro de Lamelas e dirigindo-nos para o Curral de Rochas de Matança, acompanhando a margem direita da agora Ribeira de Biduiça até chegarmos para uma merecida paragem no Curral de Biduiça.

O regresso seria feito descendo a Corga da Abelheira a partir de Entre Caminhos.

Ficam algumas fotografias do dia...





































Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

Sem comentários: