quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Serra do Gerês - Entre a Portela do Homem e o Curral de Lamas de Picão

 


O dia nasceu cinzento, mas prometia umas abertas antes do meio da manhã, o suficiente para me decidir a caminhar aos Prados da Messe via Costa de Sabrosa.

Carro estacionado na Portela de Leonte e enquanto faço os preparativos finais na mochila, um certo trânsito intensifica-se em direcção a Albergaria: carros da GNR, carros do ICNF e alguns carros civis, o suficiente para estimular o sobrolho. Adiante.

Caminho pela estrada privada de domínio do Estado e vou passando através das paisagens da Mata de Albergaria que se afunda no vale... o Curral de S. João do Campo, a Fonte de Leonte, velhos caminhos dos Serviços Florestais, a ponte sobre o Rio Maceira e o que resta da ponte velha tendo como fundo um vale coberto de nuvens, velhos carvalhos e outras árvores, a Pala da Barrosa e o Colado Seco, a Costa do Ranhado com a sua pala, a Chã de Cagademos e a Albergaria. Passado o Rio do Forno, dispo o casaco, pois o frio não era assim tanto e a subida certamente que iria fazer-me suar. Porém, neste momento, a chuva intensifica-se e noto que muito antes dos altos, a montanha esconde-se com uma mortalha plúmbea.



Decido que não faltarão outras oportunidades e desisto da ideia de chegar aos Prados da Messe. A caminhada transforma-se então numa demanda pela História daquelas paragens e por ali, não faltam elementos da História... é só preciso saber que estarão algures e procurar por eles.

Passando a ponte sobre o Rio Homem à vista da Cascata de S. Miguel, chego aos Currais de S. Miguel com as ruínas da sua velha ermida. Há uma história recente muito interessante sobre este lugar que será, em breve, motivo de publicação própria.

Chegado à Portela do Homem, enveredo pelo bosque fronteiriço. Procurava sinais de uma paisagem que foi motivo de um postal ilustrado nos finais do século XIX ou princípios do século XX. Nesta altura, a paisagem arbórea era muito diferente da que encontramos nos nossos dias e por vezes não é fácil, por entre o carvalhal, encontrar o enquadramento da velha fotografia. Irá merecer outra visita noutra ocasião menos húmida.




Enquanto procurava pela paisagem, acabaria por me aperceber o porquê da passagem das viaturas da GNR na Portela de Leonte, pois estava a decorrer um «controlo» de fronteira na Portela do Homem.

Continuei então o caminho, seguindo em direcção a terras galegas e chegando ao velho local do Curral de Lamas de Picão (ou "A Lama do Picón"). O Curral de Lamas de Picão era um curral de éguas e como tal sem abrigo pastoril (se bem que em determinado local parece ter existido algo do género e se bem que o Curral Onde Morreu Martinho, em terras galegas, mas usado por Vilarinho, tem abrigo pastoril), pois o pastoreio das éguas era feito ao feirio, isto é, "gado vacum que anda em liberdade na serra à procura de pastos," servindo também para designar "o gado cavalar em liberdade."

O Curral de Lamas de Picão era um curral de Vilarinho da Furna, tal como Jorge Dias indica na sua obra "Vilarinho da Furna - Uma Aldeia Comunitária" (1948, reedição 1981). Citando Jorge Dias (págs. 120 - 121), "Propriamente ao feirio só andam hoje, em Vilarinho da Furna, os cavalos e éguas garranas, que em 1942 eram aproximadamente 45, e pastam muitas vezes juntos com o gado cavalar espanhol, pois as áreas de pastos galegas e portuguesas são nesta região tradicionais, e independentes da fronteira política, (...)

Além disso, a afinidade étnica e linguística que existe entre os povos das duas províncias, embora pertencentes a nações diferentes, faz com que os habitantes se considerem bons vizinhos (em muitos casos são mesmo parentes) e, portanto, não há inconveniente em que os animais se misturem e pastem em comum. Os donos vão, de tempos a tempos, à serra ver onde andam os animais, e procuram separá-los novamente. Numa relação de currais (...) vê-se a quantidade enorme de currais que os portugueses de Vilarinho possuem em Espanha, o que com certeza remonta a época muito antiga, e que o uso obriga a respeitar."

Não muito longe da fronteira e passagem da Geira, o Curral de Lamas de Picão tem ainda os seus muros bem visíveis, sendo agora uma memória silenciosa dos tempos de Vilarinho da Furna.

Após alguns longos minutos no curral, iniciei então o regresso, seguindo pela Milha XXXIV e pela Geira, passando ao lado dos Currais de S. Miguel. Aqui, mais uma vez perscrutando por entre as ramas e através do rendilhado florestal, procurei por velhas memórias, que mais uma vez me escaparam. Será necessária uma melhor localização para descobrir as velhas alminhas que aparentemente por ali existiram. Passagem então pelas ruínas decrépitas das casas dos Guardas Fiscais e em pouco tempo chegava à (nova) Ponte de S. Miguel, seguindo para a Milha XXXIII, na Ponte Feia, onde parei para um café.

O restante caminho levou-me a passar na Ponte Feia, seguindo então para Albergaria e apontando então para a Portela de Leonte passando nos restos da velha trincheira.

Ficam algumas fotografias do dia...













Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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