quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Haverá responsabilidade do Estado nos recentes acidentes no PNPG?


Com as recentes ocorrências no Parque Nacional da Peneda-Gerês e em especial nas Minas dos Carris e no caminho de acesso a estas, é pertinente, à luz da história recente, questionar se não terá o Estado Português uma quota de responsabilidade nestes acontecimentos?

Terá o Estado ao longo dos últimos anos prevenido a ocorrência destes acidentes? Não é de questionar a atitude do PNPG perante os acontecimentos de 16 de Novembro de 2015 e 9 de Janeiro de 2016, quando durante o último ano se verificaram inúmeras ocorrências (mais de 11) noutros percursos e não foi tomada igual atitude por parte da Direcção do PNPG?

Teremos de recuar até ao final da década de 80 do século XX para encontrar a raiz da responsabilização do PNPG nos acontecimentos recentes.

A 28 de Abril de 1989, a Sociedade das Minas do Gerez havia já requerido ao Secretário de Estado da Industria e Energia o abandono irrevogável da concessão 2234 ‘Salto do Lobo’ pelo facto de a mina não ser económica e nem fundamentadamente o poder ser num prazo razoável. Este pedido dá entrada na DGGM a 9 de Agosto.

A 1 de Setembro o Director de Serviços da Administração Industrial, José Goinhas, solicita (Ofício n.º 003493/140, de 1 de Setembro de 1989) à Direcção Regional do Porto da DGGM, o parecer relativo aos quatro pedidos de abandono referentes asa concessões 2234 ‘Salto do Lobo’, 2806 ‘Corga das Negras n.º 1’, 2807 ‘Castanheiro’ e 3120 ‘Lamalonga n.º 1’, cujo abandono havia sido solicitado a 7 de Agosto. Este processo vai-se arrastar por muitos meses e só a 11 de Março de 1992 é emitida pela DGGM uma informação (Informação n.º 59/MS/140/92 da Direcção-Geral de Geologia e Minas, de 11 de Maio de 1992) na qual é proposta a extinção de várias concessões mineiras por acordo comum e ao abrigo do art.º 33 do Decreto-Lei n.º 88/90, de 16 de Março. Nesta informação é referida que os respectivos concessionários requereram o abandono das concessões, sendo também revogados os correspondentes alvarás. No total são listadas 152 concessões mineiras nas quais estão incluídas as concessões da Sociedade das Minas do Gerez, Lda. e a concessão 949 ‘Borrageiros’ da PROMINAS – Geologia e Minas, Lda.

A 2 de Julho é enviado à Sociedade das Minas do Gerez um ofício (Ofício n.º 04142/140 da Direcção-Geral de Geologia e Minas, de 9 de Setembro de 1992) a informar que a 28 de Maio desse ano havia sido emitido um despacho pelo Secretário de Estado da Industria no qual eram revogados os alvarás das duas concessões mineiras.

Porém, e apesar da revogação dos alvarás, a empresa continuava responsável pela execução dos trabalhos necessários para garantir a segurança da zona e para garantir a protecção ambiental. Isto surge em contradição com o que havia sido anteriormente indicado pela então Vice-presidente do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza. A 9 de Outubro de 1989, a então Vice-presidente deste Serviço, Maria de Fátima Vitorino, afecto à então Secretaria de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais do Ministério do Planeamento e da Administração Interna, enviou a Circular 08985 dirigida ao Director de Serviços Regional do Porto da Direcção-Geral de Geologia e Minas, onde referia que "...não sendo conveniente a actuação no perímetro do Parque Nacional da Peneda-Gerês de entidades estranhas a estes Serviços, comunicamos (...) que os trabalhos de segurança eventualmente necessários nos termos da legislação Mineira, serão da responsabilidade do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza." Desde então, nada foi feito no complexo mineiro dos Carris.

É óbvia a total desresponsabilização por parte do então SNPRCN (parente afastado do actual ICNF), e por consequência do PNPG, em relação a questões de segurança na área das Minas dos Carris e da Mina do Borrageiro. Com o passar dos anos e devido ao abandono extremo das instalações e áreas mineiras, a situação estrutural das instalações, galerias e poços mineiros foi-se degradando substancialmente.

O PNPG, para além de permitir o abandono total do caminho de acesso, dos anexos e das instalações mineiras e de não ter tirado partido daquelas instalações, não foi capaz até aos nossos dias de proceder à colocação de avisos de perigo ou à realização de trabalhos de prevenção de segurança daquelas instalações. De facto, a única frágil «barreira» de segurança existente nas Minas dos Carris é uma rede ali colocada em 2011 pelas gentes serranas para garantir a segurança de pessoas e animais. Um dos resultados desta actuação foi a morte em 1991 de duas pessoas na represa dos Carris.

Texto adaptado de "Minas dos Carris - Histórias Mineiras na Serra do Gerês", Rui C. Barbosa - Dezembro de 2013

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

1 comentário:

NobreLuso disse...

Texto escrito por quem sabe e conhece o local.
E que deveria ter poderes para nandar prender os criminosos irresponsáveis que não protegeram uma área perigosa, devido à incúria e estupidez de quem abandonou as minas sem levar em linha de conta os perigos que lá deixaram!
E por isso não se pode, agora, desfrutar totalmente do PNG?...