De facto, o ano económico de 1910-1911 foi marcante na presença dos Serviços Florestais na Serra do Gerês, consolidando os trabalhos aí realizando e preparando o caminho para acções futuras. Neste ano tentou-se, mais uma vez, resolver a questão que se encontrava pendente com os povos de Vilarinho da Furna.
Após ter sido adquirido o campo das Palas, os Serviços Florestais já haviam adquirido o denominado "Campo de Paços", na encosta da Assureira, no ano económico anterior. Também conhecido como "Fonte do Sapo", o terreno havia sido adquirido em nome pessoal tendo como destino à Mata, para assim não se perder uma oportunidade que então surgiu e a qual não se quis perder.
Meses depois, como apenas havia um documento particular da compra e para evitar dúvidas futuras, fez-se registar o terreno na Conservatória da Comarca em nome dos compradores, pois fora adquirido em nome de pessoas singulares, mas ficando sempre na posse do Estado, a quem de facto pertencia.
Segue a transcrição do documento de registo na Conservatória:
"Manuel Joaquim Gonçalves, bacharel formado em direito pela Universidade de Coimbra, conservador privado do registo predial na comarca de Vieira, etc.
Certifico que a requerimento de Tude Martins de Sousa, casado, regente silvícola da serra do Gerês, freguesia de Vilar da Veiga, desta comarca se lançaram nos respectivos livros de registo os extractos seguintes: Inscrição. No livro F. 3.º a folhas 50 - Número da ordem de apresentação um. Número 2028. Fica inscripto a favor de Tude Martins de Sousa, casado, regente silvícola, da Serra do Gerês, freguesia de Vilar da Veiga, desta comarca a transmissão do prédio descrito sob o número 17.060 a folhas 109 verso do livro B. 41 por o haber comprado pela quantia de 40$000 reis a Sebastião José de Miranda e mulher Maria Vieira da Silva, moradores nas Caldas do Gerês, freguesia de Vilar da Veiga desta comarca. Escripto particular de 7 de Fevereiro de 1910, que fica arquivado no maço número um deste ano, sendo restituído o conhecimento da contribuição de registo 156, passado na repartição de fazenda do concelho de Terras de Bouro, no dia 27 de Janeiro do dito ano, Índice pessoal primeiro da letra T. a folhas 11 verso. O conservador privativo Manuel Joaquim Gonçalves. Descripção. Número 17.060. Prédio rústico «um terreno denominado Quinta por baixo da Fonte do Sapo, e por cima da estrada real», com suas pertenças e servidões, de natureza alodial, sítios nos limites de Paços, Caldas do Gerês, freguesia do Vilar da Veiga, que confronta do nascente, sul e poente e norte com a mata florestal. Valor venal 40$000 reis. E por ser verdade mando passar o presente certificado depois de conferido com o original e revisto por mim o assino - Conservatória da comarca de Vieira, 2 de Julho de 1910. O ajudante da Conservatória, - (a.) Alfredo Artur Correia de Vasconcelos."
Em seguimento das orientações dadas sobre a melhoria da pecuária regional, a 11 de Março de 1911 dava entrada nos Serviços Florestais do Gerês, o cavalo Quanah, reprodutor Luso-Árabe, vindo da Coudelaria Nacional, o qual, findas as épocas de cobrição, continuaria no Gerês para os serviços de fiscalização e polícia da mata.
Continuando ainda de pé as questões da delimitação da mata com os povos de Vilarinho e S. João do Campo, os Serviços Florestais procuraram em dada altura fazer com esses povos um acordo sobre uma demarcação definitiva, para o que se realizaram várias reuniões com o abade de S. João do Campo, que, além de pároco da freguesia, era também natural de Vilarinho da Furna, mostrando-se sempre inclinado a procurar com os Serviços Florestais uma solução conciliadora para a questão pendente.
Assim, esta situação foi comunicada para os serviços superiores, o que deu lugar a que a Direcção Geral da Agricultura expedisse a seguinte ordem de serviços com o n.º 640, de 6 de Junho de 1911:
"Parecendo estar agora os povos de Vilarinho inclinados a resolverem, de acordo com os empregados florestais, a antiga questão de limites dos terrenos que pertencem à Mata Nacional do Gerês e ao referidos povos, determinou S. Ex.ª o Ministro, por despacho de 3 do corrente, que o inspector dos Serviços Florestais e V. S.ª reduzam a auto a delimitação que convencionarem com os referidos povos e que mais equitativa julgarem, procurando no entanto atender a que os povos não fiquem descontentes, ainda que, se tanto for preciso, haja prejuízo para o Estado de algumas dezenas de hectares de terreno e ficando esse auto dependente da aprovação superior, para ambas as partes. - Lisboa, 6 de Junho de 1911 - (a.) Joaquim Rasteiro."
Tendo tomado conhecimento desta ordem, foi então combinado com o abade do Campo uma reunião na Bouça da Mó, a que compareceriam delegados da gente de Vilarinho da Furna e S. João do Campo.
Porém, os planos seriam gorados! Infelizmente, a época agitada de anunciadas incursões monárquicas por aquela parte da fronteira de Espanha, determinou o Governo a mandar para o Gerês vários contingentes de tropas, a cuja chegada e alojamento os Serviços Florestais tiveram de assistir. As primeiras forças chegaram precisamente no dia combinado para a reunião na Bouça da Mó, que assim ficou adiada sine die.
O tempo passaria e a oportunidade de resolver a questão também, não se fazendo o acordo previsto.
Texto adaptado de "Mata do Gerês - Subsídios para uma Monografia Florestal" (Tude Martins de Sousa, 1926)
Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
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