segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Serra de Soajo ou Serra da Peneda? (Parte 3)

 


A terceira de cinco partes de um estudo do Paulo Costa que pretende esclarecer-nos um pouco acerca de um interessante tema que envolve a Serra de Soajo e a Serra da Peneda.

Serra do Soajo ou Serra da Peneda? (Parte 1)

Serra do Soajo ou Serra da Peneda? (Parte2)

Fica a terceira parte do texto do Paulo Costa...


G.1.1. Antecedentes do Primeiro mapa de Portugal

Face ao que acima se mencionou, terá algum interesse que se realize uma nova, ainda que sucinta, deambulação pelos referidos Códice de Hamburgo, e pelo Numeramento de 1527-1532.

a) O Numeramento de 1527-1532

Começando pelo Numeramento, ele constituirá a fonte mais antiga a nível nacional para aferir eventuais nomenclaturas.

A realização deste trabalho foi ordenada pelo Rei D. João III e, em virtude dessas instruções, um escrivão percorria, pessoalmente, as cidades, vilas e concelhos da nação e ouvia, sob juramento, dois homens-bons de cada lugar principal, os quais numeravam os chefes de família. Para o efeito deviam socorrer-se também dos livros de sisas (impostos). Por fim lavravam um auto e o “Numeramento” correspondia à soma desses autos.

No Numeramento incluiu-se no concelho do Soajo duas freguesias, constando, para além da do Soajo, a da Gavieira (não percebo porquê excluiu-se a de Ermelo), sendo que a primeira referência explícita a esta última, que conhecemos, encontra-se no Tombo da freguesia de Castro Laboreiro de 1565. Soajo era também designada no Numeramento como uma “terra de montaria”.

Muito embora nos propicie dados muitos interessantes a nível geográfico, para a questão que aqui me trouxe os resultados daqueles levantamentos revelam-se, pelo menos aparentemente, inúteis, não existindo neles qualquer referência às serranias em questão, não se justificando, por isso, que nele me detenha. Posto isto, passarei a analisar, também ao de leve, o “Códice de Hamburgo”.

b) O Códice de Hamburgo

Apesar da utilidade desta obra para a questão que aqui me prende seja idêntica à da anterior, sempre se acrescentará algo mais para referir, por exemplo, que há quem se questione se não terá sido este Códice, verdadeiramente, o primeiro dos mapas de Portugal.

A propósito dessa possibilidade encontramos um trabalho muito interessante, da Professora Maria Fernanda Alegria, com o título: “O Códice de Hamburgo desvenda o primeiro mapa de Portugal?” - http://www.scielo.mec.pt/pdf/fin/n92/n92a08.pdf

Esta autora começa por chamar a terreiro a investigadora já acima citada, a Profª Suzanne Daveau, (a mesma autora da: “A Rede Hidrográfica no Mapa de Portugal de Fernando Álvaro Seco”) (1560), explicando que: “Foi publicado no final de 2010 um importante livro de Suzanne Daveau com o título Um Antigo Mapa de Portugal (c. 1525). Reconstituição a partir do Códice de Hamburgo.”

Maria Fernanda Alegria, Professora e Investigadora do Centro de estudos Geográficos, assinala desde logo que: “A autora [Suzanne Daveau”] mostra neste livro que existiu um mapa de Portugal, que antecede em cerca de 35 anos o espécime cartográfico que era até agora considerado o mais antigo de Portugal – o mapa de Fernando Álvaro Seco, de 1561. Embora o mapa propriamente dito não tenha sido encontrado, foi possível, com um paciente e cuidadoso trabalho, reconstituir as suas características.”

Mais à frente diz esta Investigadora: “A autora [Suzanne Daveau] chega assim, “por eliminação de partes” (p. 146), à hipótese de ter sido D. Francisco de Melo (1490-1536) o promotor da oferta do mapa a D. Afonso e, provavelmente, o autor do códice”.

Para se perceber mais do que possa estar em causa, necessário e útil será a leitura da obra de Suzanne Daveau, com o título: “Um antigo mapa coreográfico de Portugal (c. 1525) – Reconstituição a partir do Códice de Hamburgo”.

De todo o modo, Júlio Teixeira Kruger, Professor universitário da Universidade de Coimbra, não seu trabalho “Na génese das racionalidades modernas: Em torno de alberti e do humanismo.”, discorda de parte da teoria da Professora Suzanne Daveau.

Seja como for, melhor será não entrar aqui em demasiadas divagações e incursões, porque “pano para mangas” já se vê que é coisa que abunda pelos reinos da cartografia.

É que, de todo o modo, ainda que o Códice de Hamburgo possa ser considerado como o primeiro mapa de Portugal, não se descortina que no mesmo, e até prova em contrário, figure quer a Serra do Soajo, quer a da Peneda, o que também se explicará pelo facto de este Códice revelar-se mais focado na referenciação das localidades. 


G.2. O mapa de Portugal de Pedro Teixeira Albernaz (1595-1662) – com edições de 1662 e 1705.


I - Este mapa corresponderá, com alguma probabilidade, ao que será o segundo mapa de Portugal.

A análise dos estudos relativos a este mapa não se apresenta fácil, na medida em que por vezes não se compreende a que edição em concreto os autores se pretendem referir.

Entre outras abordagens, na já mencionada obra intitulada “Portugalliae Daescriptio”, da autoria de Professora Maria Helena Dias, publicada pelo Instituto Geográfico do Exército (2006), faz-se referência ao que é por vezes considerado como sendo este segundo Mapa de Portugal. 

Esse mapa, que surgiu sob o título de “Descripción del Reyno de Portugal y de los Reynos de Castilla», delineado por Pedro Teixeira Albernaz, terá sido impresso em Madrid, por uma primeira vez, em 1662, isto é, já após o falecimento do seu autor, e viria a destronar o mapa de Álvaro Seco e as suas múltiplas versões que circulavam nos atlas europeus desde o último quartel do século anterior. Ali refere-se: “Seja como for, este mapa, à semelhança do de Seco, perdurou outro século como a imagem do país”. 

Na citada obra da Profª Helena Dias menciona-se (pagina 8): “Pode reparar-se no pormenor da linha da costa deste mapa, muito recortada […] e na figuração, ainda completamente falsa, do relevo português. Ao contrário do que acontece no mapa de Álvaro Seco em que só a serra de Montejunto foi representada [isto não será propriamente verdade, porque, pelos menos em algumas das suas edições, também estão figuradas ali outras serras, como por exemplo e desde logo, a “Serra do Soajo” (Soaio), bem como a “Serra de Coira” e a “Serra da Strica”], aqui os pequenos montes em perspetiva, todos levantados a partir de um mesmo plano, enchem generosamente o espaço entre os numerosos cursos de água.”

II – Relativamente ao mapa correspondente à versão de 1705, consultável no site da Biblioteca Nacional Digital, volta a surgir a “Serra do Soajo” (Soaio), bem como a Vila de Soajo. Curiosamente, no entanto, o Soajo parece estar ali representado a poente de Arcos de Valdevez.

Também na zona aqui em causa figura uma tal de “Portela Serra”, menção que traz à memória a «Sera (serra) de Soaio Portela d Olela Peneda» que surgia na predita versão “melhorada” do mapa de Álvaro Seco, e situada, sensivelmente, na mesma zona.

Será, igualmente, um significativo erro representar ali o Soajo e a “Serra do Soajo” bem mais a Poente do que o que se encontram na realidade.

Uma outra curiosidade ali detectada é que Castro Laboreiro é representado, também incorretamente, a uma significativa distância de Soajo.

A “Serra do Gerês”, aparentemente, não surge referenciada neste mapa, muito embora o respetivo relevo, pela localização, pareça estar ali representado.

III – Existe, no entanto, existe uma outra versão (ou até versões) deste mapa, que será a primeira, do predito ano de 1662, e à qual se refere o Professor Luís Miguel Alves de Bessa Moreira, na sua obra: «Cartografia, Geografia e Poder: o processo de construção da imagem cartográfica de Portugal, na segunda metade do século XVIII». 

Nessa publicação, num quadro lá existente, descreve-se que Pedro Teixeira Albernaz terá referenciado no seu mapa as serras de “Soaio”, “Pineda” e “Dogires” (esta será a do Gerês).

Lêem-se depois ali alguns apontamentos interessantes acerca desta situação, como seja: “O levantamento para a composição deste mapa de Portugal terá decorrido entre as décadas de 1620 e 1630, ainda que, de acordo com algumas fontes, Pedro Teixeira tenha percorrido as fronteiras de Portugal, da França e da Catalunha, logo após o início da rebelião nestas duas nações, o que a ser verdade lhe terá permitido obter mais informações importantes que, eventualmente, terão sido acrescentadas ao mapa manuscrito original. Na opinião de João Bautista de Castro, em 1749, o mapa era “… o mais correcto, que tenho visto quanto à expressão dos nomes das terras”. Existem poucos exemplares deste mapa nos principais arquivos nacionais. Na Bibliothèque Nationale de France existem dois, correspondendo a duas versões diferentes, tendo um deles sido reproduzido e analisado no volume IV dos Portugaliae Monumenta Cartographica pois, na época, era o único exemplar conhecido.” .

Esta versão de 1662 (ou uma das suas versões), está disponível também no site do Arquivo Militar da Suécia, na qual referencia-se, efetivamente, a par da “Serra de Soaio”, a “Serra Pineda”. 

IV - Já relativamente à versão de 1705, ela corresponde a um mapa descoberto há poucos anos em Itália, adquirido entretanto pela Fundação Calouste Gulbenkian e posteriormente doado à Biblioteca Nacional. Ele está disponível para consulta no site da Biblioteca Nacional e terá sido publicado em 1640, ou seja, 22 anos antes do mapa do seu irmão. 

Em relação a questões de orografia não se deteta que esta versão nomeie qualquer serra na zona aqui em causa. Vêm-se, curiosamente, lá referenciadas as localidades de “Portelinha” e de “Alcobaça” (situadas na zona de Lamas de Mouro/Castro Laboreiro).

Nesta edição de 1705 a menção à “Serra de Soaio” e à tal de “Portela Serra” não dá azo a discussões. Também pacífico, aparentemente, é que nele não surge qualquer referência à “Serra da Peneda” (nem à do Gerês). Aparece, sim, a menção a uma “Portela”, junto ao Rio Lima, mas já em território espanhol. 

Este mapa é bem mais pormenorizado do que aquele de 1705, o que não deixa de ser estranho, porque seria expectável que este último apresentasse um maior rigor do que aquele que o precedera em cerca de 40 anos. Ele pode ser localizado e interpretado através do link https://www.4gatos.es/MemoriaAusente/mapas/229_Portugal_UK_Texeira.htm  

Verdade seja dita que, pelo menos, numa das versões desse mapa de 1662 não parece encontrar-se a “Serra de Pineda”. Lê-se, isso sim, “Portela” e, logo ao lado, a nascente, a menção “Serra”. 

Esta situação traz, aliás, à memória quer a versão deste mapa do ano de 1705 (a consultar no link https://purl.pt/16992/2/), que nomeia essa (enigmática) “Portela Serra”, quer aquela minha alusão à versão “melhorada” do mapa de Álvaro Seco, a mencionada «Sera (serra) de Soaio Portela d Olela Peneda». 

Também não é menos verdade que, conforme se pode verificar pela análise do mapa, que a nascente da palavra “Serra”, surge, espaçada, a palavra “Pineda”, pelo que poderá a junção de palavras não ser a de “Portela Serra”, mas antes de “Serra Pineda”, ficando, aquela “Portela” como uma designação isolada das demais. 

No entanto, a grafia das palavras “Serra” e “Pineda” surgem ali perfeitamente diferenciadas, ao passo que a grafia das palavras “Portela” e Serra” é a mesma, situação que é, aliás, extensível às demais serras que o mapa representa.

V - Como já aqui referi, mais importante, e dando total crédito à posição do Prof. Luís Moreira, certo é que pelo menos numa das edições (ou versões) do mapa de 1662, publicada pela Biblioteca Real da Academia Espanhola, bem como pela Biblioteca Geral Digital da Universidade de Coimbra, na qual o mapa de Pedro Teixeira Albernaz surge “deitado” (com Oeste para cima - tal como sucedia com o mapa de Álvaro Seco), surge, numa leitura muito objectiva, representada a “Serra de Pineda”. 

VI - Por último, deixando por agora de lado a análise das múltiplas versões do mapa de Pedro Teixeira Albernaz, uma situação interessante a propósito deste mapa é que as conclusões mais recentes apontam no sentido de ele não corresponder ao segundo mapa de Portugal. Efectivamente, existem fortes razões para crer que o irmão de Pedro Teixeira Albernaz, de seu nome completo, João Teixeira Albernaz, terá sido o autor desse segundo mapa.


G.3. O mapa (Carta) de Michele Lescolles - 1661

(Primeiro mapa regional de Entre Douro e Minho)


I - Um ano antes da publicação do mapa de Portugal de Pedro Teixeira Albernaz, ou seja, em 1661, surgira um outro mapa dando uma particular importância à zona aqui em causa, mais concretamente a “Carta Geográfica [da] Provínçia de Entre Douro e Minho de 1661” de Michel Lescolles.

Lê-se no trabalho realizado pelo Professor Luís Moreira, Assistente convidado no Departamento de Geografia da Universidade do Minho, que: “Ao longo da Guerra da Restauração foram vários os engenheiros militares estrangeiros que prestaram serviço em Portugal, chegando alguns a desempenhar a função de Enfermeiro-mor do Reino. Numa época em que a guerra era conduzida por militares profissionais e mercenários, alguns destes técnicos, mais tarde, também se colocaram ao serviço de Espanha.

Entre os vários engenheiros franceses ao serviço de Portugal destacamos o nome e a obra de Michel de Lescolles, na Província de Entre Douro e Minho.”

[…] O mapa não apresenta legenda, encontrando-se orientado com o Este no topo e compreende o território entre a Ria de Vigo, a Norte, o rio Douro como limite Sul, o Oceano Atlântico a Oeste e a raia terrestre com a Galiza, desde S. Gregório à Portela do Homem, assim como parte do território de Trás os Montes, como limites a Este.”

A propósito dos relevos que surgem neste mapa, diz-nos o autor: “Um dos fenómenos naturais figurados pelo autor é o relevo, representado por uma sucessão de pequenos “montes triangulares”, aparentemente sem qualquer proporcionalidade em relação à sua altitude. Deve-se referir, a este propósito, que somente a partir da segunda metade do século XVIII se procedeu a medições, mais ou menos rigorosas da forma e altitude das montanhas e, mesmo assim, no nosso país, essas preocupações foram mais tardias.

O autor identifica apenas alguns acidentes orográficos, talvez por ele considerados principais, inscrevendo o seu nome, aparentemente sem qualquer intenção de o associar a uma das elevações representadas. Entre os diversos topónimos assinalados no Alto Minho foram identificadas as Serras de Somavila?; Gavieira ou Gavião [ver infra pág. 49] ?, estas no limite Este e a Serra de Boalhosa. A Sul do rio Lima, o autor identificou as serras de Mouso ou Mouro?, Amarella, Xeres (Gerês) e Falperra (entre Braga e Guimarães). Também identificou o oiteiro Major (Outeiro Maior) no Alto Minho, representado por um símbolo de maior dimensão que os demais.”.

II - A distribuição do relevo não se apresenta uniforme neste mapa. Assim, o Alto Minho surge, claramente, como a área mais montanhosa, contrastando, desse modo, com as áreas a sul do vale do rio Lima. 

Também não é ali acentuado o carácter montanhoso do interior da província, ainda que a delimitação entre o Minho e Trás-os-Montes tivesse sido ali marcada por uma “cadeia montanhosa.” 

III - Acrescenta ainda o mesmo autor que: “Neste período circulavam entre nós inúmeros exemplares baseados no mapa de Portugal de Álvaro Seco (1560), publicados pelos mais importantes editores/gravadores norte europeus, ou os mapas baseados nos contributos mais recentes de Sanson D’Abbeville (1654), ou de Pedro Teixeira de Albernaz (1662), mas onde a Província de Entre Douro e Minho surgia integrada no conjunto de Portugal ou na sua metade setentrional.” 

Outro parágrafo interessante desta obra do Professor Luís Moreira, é aquele em que menciona: “Pese embora o contributo de Michelle Lescolles foi necessário esperar quase 70 anos, até 1730, para que surgisse o primeiro mapa impresso da Província de Entre Douro e Minho, gravado por Grandpré em Lisboa.”

A propósito deste último mapa, refere o autor: “ambos figuram a “serra do Gavião” junto da fronteira com Espanha, entre Castro Laboreiro e o rio Lima, assim como a serra da Boalhosa.”

IV - Uma situação que tenho por deveras relevante no que respeita ao mapa/carta de Michele Lescolles, que é, objectivamente, o primeiro mapa detalhado sobre a zona específica de Entre o Rio Minho e o Rio Douro, é que ao contrário do que, aparentemente, os autores consideram, nele é representada a “Serra da Peneda”. 

Efectivamente, descobre-se ali que para além das serras que o distinto Professor assinala como constando do mapa, outras lá se encontram e, para o que ao caso interessa, está lá representada, de forma inequívoca, a “Serra da Peneda”.

Aliás, nesta Carta surge, igualmente, a referência ao Santuário de Nossa Senhora da Peneda (ali surge como N.S. da Peneda) e, logo ao lado, a dita referência à “Serra da S. Peneda”. 

Não se compreende bem se ali está escrito – apenas – “Serra da Peneda”, ou “Serra da S. da Peneda”, mas a verdade é que parece estar lá um “S” que, no entanto, de alguma maneira se confunde com o desenho.

Para quem quiser localizar tais referências no mapa de Lescolles, deverá encontrar, logo a norte, o nome “Lamas de Mouro” e, ligeiramente mais acima, a referência ao Castelo de Castro Leboreiro (ou será Laboreiro?!), que, por sua vez, surge mesmo por cima da que parece ser a “Serra da Gavieira”.

De todo o modo, aqui segue a reprodução do mapa, na zona aqui em estudo:

 


V - Também de realçar é que não surge neste mapa qualquer menção à existência da “Serra do Soajo”. A localidade do Soajo está lá assinalada e logo ao lado (a Norte, pois o mapa tem a “norte” a Este) consta a menção a Oiteiro (Outeiro) Maior, que surge ali figurada como uma grande elevação. Todavia, não se menciona ali que se trate, por exemplo, da “Serra de Oiteiro Maior”, antes se ficando com a sensação que se pretenderia referenciar a existência da Montanha, ou Monte de Outeiro Maior.

Diga-se que neste mapa surgem também já Arcos de Valdevez (e a Giela), bem como Cabreiro e Sistelo.

VI - Ou seja, forçoso será concluir que a figuração e referenciação da “Serra da Peneda” não surgiram, como é por vezes defendido, apenas com a realização dos trabalhos efetuados por Gerardo Augusto Pery, no ano de 1875, sobre os quais discorrerei um pouco mais adiante.

Assim, essa referenciação terá surgido, de acordo com o Professor Luís Moreira e com o mencionado mapa existente na Biblioteca Nacional Espanhola (a que venho de aludir) e que é também disponibilizado pela Biblioteca Digital da Universidade de Coimbra, num primeiro momento, com o mapa de Pedro Teixeira Albernaz. Todavia, ainda que assim não fosse, certo é que ela aparece, desta feita sem margem para controvérsias, neste mapa de 1661.

VII - Recorda-se que por esta época já existia de há muito a Ermida da Srª da Peneda, mas não a atual basílica, e que essa situação de “religiosidade” poderá ter de algum modo influenciado tal referenciação, sobretudo por se tratar de uma época muito afectada por epidemias. Ora, como é norma, esse tipo de fenómenos “sanitários” despoletam sentimentos de maiores aflições, dando origem a um acrescer dos fervores religiosos, que são depois acompanhados de um incremento de visitação aos lugares de maior simbologia religiosa.


H – Outros mapas


Procurarei agora aqui sintetizar a maioria dos mapas de Portugal, ou da região aqui em estudo, e a visão que os mesmos nos aportam acerca da mesma, frisando-se, pontualmente, algumas outras curiosidades neles encontradas. Haverá mapas que não se mencionarão pelo simples facto de que não contêm informações com interesse para a presente discussão.

Para o efeito de encontrar esses mapas, socorri-me não só do amigo facebookiano já acima identificado, como também de alguns sites dedicados a tal tipo de publicações, como sejam, nuclearmente, o site da “Biblioteca Nacional Digital” e o “Gallica”.

1 - 1550-1560 – Juan Schorquens – “Description del Reino de Portugal”: Assinala, apenas, no que possa interessar ao caso, as localidades de “Soajo” e de “Castro Laboreiro”.

2 - 1592 – Abraham Ortelius – Sensivelmente na zona em questão surgem assinalados os Mons Medullius e apenas esses. A propósito destes Mons Medullius, um autor espanhol refere que se situarão junto ao Rio Minho. Provavelmente dirão respeito à zona montanhosa de “Las Medulas”, não muito longe de Ponferrada, onde os Romanos que então ocupavam a Península exploraram ouro de forma exaustiva.

3 - 1641 – Melchior Tavernier – Representa a localidade de Soajo (Soaio), situando-a, bizarramente, a sul do Rio Lima, situação que irá perdurar em diversas ocasiões em mapas futuros.

4 - 1642 – Cristophe Tassin – Este mapa tem a particularidade de representar o mapa “ao contrário”, ou seja, com o sul na parte superior do mapa. Surge a localidade de “Soaio”, também aqui a sul do rio Lima. Por sua vez, surge uma “Peneda” logo a sudoeste de Montalegre, num local que vai aparecer em diversos mapas futuros. Acabei por concluir, graças a boas dicas do amigo Manuel Afonso, que deveria tratar-se de uma aldeia (na verdade são três, muito próximas umas das outras, a de “Cima”, a do “Meio” e a de “Baixo”) com esse nome, situada nas faldas da Serra do Facho/Cerdeira, na freguesia de Covêlo do Gerês (Montalegre).

5 - 1654 (também c/edição em 1695) - Nicolas Sanson d'Abbeville – Parte Septentrional do Reyno de Portugal: Representa a “Serra de Soiao”, muito embora coloque a serra, tal como a localidade, a sul do Rio Lima. Surge também a “Serra de Strica”, figurada sensivelmente na zona de Castro Laboreiro. 

6 – 1668 – Philippe Briet – Curiosamente, o mapa deste autor apenas refere, a norte do rio Lima, dois nomes, sendo eles os de “Valença” e o de “Soaio”. No que se refere a Valença a menção está feita a uma localidade, ao passo que a realizada em relação a “Soaio” aparenta pretender assinalar uma serra ou uma zona de montanha, pois que está colocada sobre uma parte desenhada do mapa representando, precisamente, uma zona montanhosa.

7 - 1670 – Frederick de Wit – Mais um de muitos outros exemplos, em que surge Soiao (localidade), a sul do rio Lima.

 8 - 1692 – Giacomo Cantelli (Italiano) – Representa a “Serra de Soraio”, desta feita a Norte do rio Lima. Também a Norte do rio Lima surge a “Serra de Couraio” (Coura). Está também representada a localidade de “Ferreal”, actual “Ferral” e que penso que deverá corresponder à localidade que em muitos mapas surge muitas vezes com o nome “Flaerval” e, erradamente, colocada na zona da localidade da Vila de Soajo. Todavia, existe também a hipótese de se tratar da localidade de Ermelo (o que me foi pertinentemente indicado pe,lo Artª Fernando Barros Cerqueira).

9 - 17… - Carel Allard – Surge a “Sierra de Soaio”, bem como a localidade de Soaio, embora representadas a sul do Rio Lima. É também figurada, a norte de Castro Laboreiro, a “Sierra de Strica”. Possui a curiosidade de apresentar o Rio Homem a “nascer” perto do Castelo da Nóbrega (freguesia de Sampriz, Ponte da Barca). 

10 - 1700 – Charles Inselin e Le Pére Placide – Surge Soaia (Soajo), uma vez mais a sul do Rio Lima. Também a Ponte da Barca, bem como surge ali a referência à localidade de Arcos (aparentemente pela primeira vez). 

11 - 1700 (tb. 1740) – Jacques Nicolas Bellin – Surge ali a menção a “Sonia” (penso que, pela localização, será “Soaia”/Soajo), a norte do Rio Lima. Num olhar de relance foi curioso também ali descortinar a “Montagne d Estrela”.

12 - 1700 – 1709 – Jean-Baptiste Nolin: Figura lá o “M. de Soraio” e a norte do Rio Lima. A única localidade de nome “Peneda” continua a surgir a sudoeste de Montalegre.

13 - 1703 - 1704 – Jean Besson - Royaume de Portugal et partie d'Espagne: Este mapa representa a que será a “Serra do Soraio”, e a norte do Rio Lima. Aparentemente é a única serrania assinalada em todo o território norte. 

14 - 1704 (também com edições de 1708 e 1735) Gaspard Baillieu: Embora um pouco deslocada para Poente, representa a “Serra de Soaio”. A “Serra do Gerês” (Gires) surge representada, embora deslocada, desta feita para nascente, surgindo a norte de Montalegre.

15 - 1704 – Gerhard Valk: Representa a “Serra do Soajo”, a sul do Rio Lima (sensivelmente onde fica a Serra Amarela) e, por sua vez, a localidade de Soajo surge a Norte do Lima. A “Serra da Strica” volta a aparecer, e uma vez mais na zona de Castro Laboreiro.

16 - 1705 – Nicolas de Fer e Pedro Teixeira Albernaz: No mapa conjunto destes autores surge a “Serra do Soaio” (bem como a localidade de Soaio/Soajo). Imediatamente a nascente surge a já mencionada “Portela Serra”, no local que corresponderá, sensivelmente, à “Serra Amarela”. Representa a Ponte da Barca, mas não a localidade de Arcos de Valdevez.

17 - 1711 – Cóvens & C. Mortier - Surgem a “Serra de Coira”, a sul da Ponte da Barca (talvez no local daquela que é a “Serra da Nora”), bem como a “Serra do Soajo”. Contudo, tal como sucedeu recorrentemente, ela surge representada a sul do Rio Lima, numa zona que corresponderá, genericamente à “Serra do Gerês”. A localidade de Soaio também surge a sul do rio Lima e logo a Sul desta localidade, aparece o “Penedo dos Bebados”, nome muito patusco que surge em diversos mapas desta época. Tratar-se-á, muito provavelmente, de um local situado em área bem mais distante, na zona de Soutelinho da Raia (Chaves).

18 - 1736 – Johann Baptist Homann: Figura lá o M. do Soraio (pretenderia mencionar Monte do Soajo). 

19 - 1750 – Laurent - “Província de Entre Douro e Minho”: Surge neste mapa a referência à “Serra de Gavião” (ver pag. 41), representada logo a poente de Entrimo e abaixo do Castelo de Castro Laboreiro, fazendo recordar a alusão à “Serra da Gaviarra” ou da “Gaveira” já preexistente. Também surgem duas localidades logo acima de Soazo (Soajo), com nomes curiosos, nomeadamente a já mencionada “Flervael”, bem como “Souto Mayor”. Esta Flervael vai surgindo repetidamente em mapas futuros e a sua existência, apesar das hipóteses de trabalho acima referidas, apresenta-se-me como muito enigmática. Em relação a “Souto Mayor” não se encontra uma explicação aparente de que localidade se trata, ou se pudesse tratar. O “Forte da Estrica” também lá está. Surge também a “Serra do Gerês”, em cuja área figura “Vilarinho de Furne” e “Portella do Home”. Na área em questão também aparece, curiosamente, a (Branda da) “Bossa dos Homes”.

20 - 1751 – Gilles Robert de Vaugondy: No seu mapa setentrional do país surge a localidade de Soaio (a norte do Rio Lima) e a Serra do Soraio (Soajo), ocupando ali parte muito significativa de toda a zona montanhosa a norte do Rio Lima. 

21 – 1758 - Gonçalo Luís da Silva Brandão, no mapa do álbum cartográfico intitulado «Topografia da Província de Entre Douro e Minho», que inclui 24 desenhos das praças, fortes e vários troços da raia e do litoral da província, oferecido pelo autor, enquanto "discípulo" de engenharia na Província do Minho, ao então Conde de Oeiras, Sebastião José de Carvalho e Melo, surge a menção, na zona em apreço, uma nova referência à “Serra do Gavião”.

22 - 1769 – João Silvério Carpinetti – A localidade de Soajo (Soazo), surge – bem - a norte do Rio Lima. Imediatamente a norte de Soajo surgem as já referidas e surpreendentes “Flaerval” e “Souto Mayor”. A nível de montanhas apenas parece figurar a “Serra do Geres”, em cujas imediações surge, novamente, “Vilarinho de Furne” e “Portella de homem”.

23 – 175.. - 1777 – José Monteiro de Carvalho “Carta Geographica da Provincia de Entre Douro Minho e Tras os Montes”. Trata-se de um mapa muito interessante, sobretudo a nível da sua diferenciada representação em relação ao “normal” até então, bem como pela sua pormenorização. No local de estudo surge representada a “Serra do Gavião”. Também lá está a localidade de Soajo (Peneda continua, como quase sempre, omissa). Também é figurada a “Serra do Girez”, em cuja área é representada a já desaparecida “Vilar de Furnes” (que surge aqui com um nome distinto do usual até então).

24 - 1778 (com edição também em 1782) – Tomás Lopez de Vargas Machuca e o seu “Mapa Geral do Reino de Portugal”: Considero este mapa importante uma vez que descreve várias serras e com um assinalável pormenor. Nele detetam-se as serras de “Arga” (creio que pela 1ª vez), “Serra da Estrica” (também o “Forte da Estrica”), que abrangerá – também - a zona a nascente de Sistelo, e a “Serra de Soazo”, que faz uma diagonal longa entre a zona de Giela (logo a nascente de Arcos de Valdevez) e Castro Laboreiro. A localidade de Soazo também lá está, bem como as já mencionadas “Flaerval” e “Souto Mayor”, muito embora estas tenham trocado de posição (desta vez esta última a norte da primeira). Na zona da “Serra do Gerês” surge, uma vez mais, “Vilarinho de Furne”. 

25 - 1780 (com edições em 1762 e 1802) – Giovanni Antonio Rizzi Zannoni: Este mapa traz como novidade representar uma tal de “Serra do Gamao” (será Gamão), sensivelmente no local correspondente àquele aqui em causa, sendo que esta adentra-se em território de nuestros hermanos. À parte essa serra apenas se deteta por ali a “Serra do Geres”. “Flervael” volta a surgir “no sítio do costume” e no lugar anteriormente ocupado por “Souto Mayor” surge agora, desta feita correctamente, a localidade de “Paradela”.

26 - 1788 – Gaspard André e Rigobert Bonne – Apenas menciono aqui este mapa pelo facto de representar a já mencionada localidade de “Soutomayor”, mas desta feita em território Galego, mais concretamente entre Redondela e Compostela. Talvez se trate, por isso, de mais um exemplo de incorreta localização e do copy past já em voga nos tempos antigos (agora corrigida). Também reparo que a localidade de “Castro Laboreiro” é sempre representada nos mapas, quiçá pela sua importância estratégica e pelo seu castelo, e ademais por se tratar de um concelho muito antigo.

27 - 1793/4 – Custódio José Gomes Vilas Boas - “Mapa da Província de Entre Douro e Minho” – este mapa é também muito relevante para efeitos deste estudo. 

Isto não só porque se trata de um mapa regional, mas também porque assume uma forma de apresentação do relevo original. 

Aprende-se com o já citado Professor Luís Miguel Moreira, da Universidade do Minho, no seu trabalho «Desenhar a Linha: a fronteira luso-galega do Alto Minho na cartografia militar portuguesa dos séculos XVII-XIX», que Custódio Vilas Boas foi um Engenheiro militar, originário de Barcelos, que veio a falecer em Braga (assassinado sob a acusação de “jacobismo” e traição). Este mapa serviu de base do projeto de reforma das comarcas realizada no período de 1790-1792

Nele figuram várias serras na zona aqui em causa, nomeadamente: “Serra de Faro”, “Serra da Bulhoza”, “Serra de Sopo”, “Serra da Tabruje” (será Labruge), “Serra D’Anta”, “Serra da Cumieira”, “Serra D’Amarella” “Serra do Gerez”, “Serra da Nóbrega”, “Serra do Berrelhe”, “Serra de Rebordões” e “Serra D’Oural”.

A sul do rio Lima e, estranhamente, é assinalado o concelho do Soajo coo ocupando espaço de ambos os lados do mesmo rio. 

Mais importante ao que ao caso interessa, é que por ali apenas surge a referência à “Serra da Peneda”, o que se verifica pela primeira vez, pela menos de forma inequívoca, desde o mapa de Lescolles (1661) englobando esta serra o “Outeiro Maior” (recorda-se, no entanto, que o mapa de Pedro Teixeira Albernaz, numa das versões de 1662, também conterá essa referência). 

Também lá está assinalada a localidade de “N. S. da Peneda”, situação quase “virgem” até então. Em relação a este mapa também é muito relevante a já mencionada referência à “Serra da Amarela”.

Uma outra curiosidade é a de que a zona do vale situada entre a povoação da Várzea e a de Olellas recebe o nome de “Portela da Pereira”.

28 - 18.. – Alfred Germond de Lavigne: Curiosamente este mapa apenas assinala a existência da “Serra do Larouco”, colocando-a, sensivelmente, no local que corresponde à “Serra Amarela” e “Serra do Gerês”, deslocando Montalegre para Oeste, assinalando, ainda, a “Serra da Cabreira”.

29 - 1800 - «Cartas chorographicas, cuidadosamente executadas por pessoal technico sob a direcção do capitão de engenheiros do exército hespanhol D. Benito Chias y Carbó; J[oa]q[ui]n Ribera Dº» (reprodução do título da obra). 

Este será, sem grandes margens para dúvidas, o mapa mais pormenorizado produzido até este final do século XVIII. Surge-nos com um visual de modernidade. Nele estão assinalados diversas serras e montes, bem como vários cumes dessas serras e montes. Passo a destacar as seguintes situações: Em primeiro lugar, não posso deixar de sublinhar que ao invés do mais habitual no decorrer dos dois séculos anteriores, surge apenas referida a “Serra da Peneda”, omitindo-se, em absoluto, a existência da “Serra do Soajo”. 

Assinala o M(onte) Pedrada como o ponto culminante da dita “Serra da Peneda”, com 1415 mts, omitindo, curiosamente, a menção do cume “Peneda/Alto do Pedrinho”, mas referenciando, no entanto, a sua - suposta - altitude (1373 mts). 

Figura-se ali o “M. Água Santa” (cume existente a Nascente da localidade da “Peneda”), o “Monte Gestoso” (ponto mais alto do planalto de Castro Laboreiro - Giestoso), o “Monte Louriça”, situando-o - mal - na serra do Gerês (na verdade ele vem a ser o ponto mais alto da “Serra Amarela”).

30 - 1804 – Wiliam Faden: Representa a “Serra de Soazo” (a da Peneda não). Desta feita a já referida “Serra de Gamon” surge junto à fronteira, mas do lado galego. A “serra do Gerez” é representada adentrando-se, muito vasta e erradamente, em território galego.

31 - 1804 (também existe uma edição de 1797) – C. Mahert: Representa a “Sierra Soazo”, encostada à margem norte do rio Lima. Também surge a “Sierra do Gerez”, bem como a “Estrica”, mas desta feita apenas enquanto lugar de uma fortificação e, ainda, “Flervael” que volta a surgir imediatamente a sul de Paradela (Soajo), mais ou menos no local onde se encontra o lugar de “Cunhas”, ou, quiçá, de “Ermelo”.

32 - 18-- Philad Dobson – Representa a “Serra da Estrica” e o Forte da Estrica. A Sul desta surge, embora se leia mal, a Serra do Soazo (Soajo). Também lá está a “Serra do Gerês”. Surge ali, igualmente, a localidade de Soazo e, logo acima, assinala-se a existência da enigmática “Flervael”.

33 - 1809 – Thomas Jefferys, Friedrich Wilhelm Streit, Tomás Lopez de Vargas Machuca, Laborde e William Faden, “Carta dos Reinos de Espanha e de Portugal” – Representa a “Serra da Estrica” e a “Serra do Soajo”, bem como a “Serra de Gamão” (na zona de Castro Laboreiro).

34 - 1809 (também com uma edição em 1813) – John Cary – Representa a “Serra da Estrica” no local habitualmente ocupado pela “Serra do Soajo”. Também surge neste mapa a “Serra de Catarina”, figurada desde o norte da cidade do Porto até á fronteira na zona de Montalegre. A “Serra da Santa Catarina”, na atualidade, abarca, por exemplo, a montanha da “Penha”, a qual tem a seus pés, a Poente, a cidade de Guimarães.

35 - 1810 (com intervenção do autor em mapas posteriores, 1822 e 1831) – Pierre Lapie (na qualidade de cartógrafo e a colaboração dos demais mencionados no mapa de 1822) – Representa na zona em questão a “Serra de Penegache”, bem como na área do Gerês a “Serra de S. Catalina” (veja-se infra o apontamento ao mapa de 1822).

36 - 1811 – Tomaz Lopez (Também colaborador noutros mapas) – Surge uma representação da “Sierra Soazo”, bem como a localidade de Soajo (Soazo). “Flaerval” está no “sítio do costume”. Sierra do Gerez também lá está e, na sua área, “Villarinho de Furne”. 

37 - 1813 – Samuel & Georges Neele – Representa a “Serra da Estrica” no local habitualmente ocupado pela “Serra do Soajo”. Também representa a “Serra do Gerês”. Também nele surge a “Serra de Catarina”, figurada novamente desde o norte da cidade do Porto, até á fronteira na zona de Montalegre. 

38 - 1816 – C. Smith – Surge a Estrica (parece querer referir-se ali a uma Serra) e o F(orte). Estrica. Parece-me que este “F.” pretenderá significar “Forte”. Na verdade terá existido em tempos um Forte nesse lugar da Estrica. Por sua vez, na zona sensivelmente correspondente á localidade de Soajo surge a misteriosa “Flervael”.

39 - 1822 – Lapie, Pierre [1777-1850]; Lopez de Vargas Machuca, Tomás [1730-1802]; Picquet, Charles [1771-1827]; Tofiño de San Miguel, Vincente [1732-1795] - Na área que ao caso interessa aparece surge a acima mencionada “Serra de Penagache”. A “Serra de Penagache”, ou quiçá o Monte de Penagache, existe na atualidade, e o seu ponto mais alto está assinalado com uma cruz, situando-se alguns quilómetros a Norte do “Alto de Anamam” (também conhecido por Anumão, Numão, Anemão). Na zona onde deveria figurar a “Serra do Gerês” surge, estrambolicamente, a já referida “Serra de S. Catalina” (Catarina);

Num mapa anterior, de 1820, já o aqui mencionado Charles Picquet elaborara um mapa com um teor muito semelhante a este de 1822.

40 - 1823 – Xavier Girard – Representa a “Sierra Penagache”, que estaria de algum modo na moda por esta época (tal como a “Serra de Catarina”), ocupando toda a metade leste do Alto Minho. È a única serra representada mais a norte neste mapa. Também existe uma edição deste mapa de 1841.

41 - 1823 – Alexis Donnet – Curiosamente, este cartógrafo apresentaria um outro mapa no ano seguinte (ver abaixo), nele incluindo a “Serra de Soaza”. Também existem edições deste mapa de 1840 e 1843. Nesta edição o cartógrafo representa a “Serra de Penagache”, abrangendo, sensivelmente, a zona de Castro Laboreiro e adentrando-se depois em território galego. Também representa a “Serra de Gerêz”.

42 - 1823 - Guilleminot, Armand-Charles – Mapa interessante, com bons pormenores. Nele surgem as “Serra de Estrica”, “Serra Soazo” e o “Monte Penagache”. A “Serra da Estrica” parece abranger ali a área de “Corno de Bico” e deter-se no Rio Vez. A “Serra do Soajo” é figurada no sítio “normal” e a de “Penegache” na zona de Castro Laboreiro, mas já em terras galegas. A “Serra de Gerez” também lá está.

43 - 1824 – Alexis Donnet e a sua «Carta civil e militar de Portugal e de Hespanha enriquecida com os planos particulares de 34 cidades e portos principaes. Trata-se de um mapa interessante, com bons pormenores, onde figuram a “Serra de Soaza” e a nascente desta a já conhecida “Serra da Estrica”, que desta vez parece ter por fronteira o Rio Vez e o Forte da Estrica na sua confrontação nascente. A enigmática “Flervael” surge, sensivelmente, no local que deveria estar ocupado pela localidade de Soajo (que, aliás,  não é representada no mapa).

44 - 1829 – Sidney Hall (?): Neste mapa surge a “Serra de Penagache”, abrangendo nele a área em questão e adentrando-se em Espanha. Também lá está a “Estrica” mas como mera localidade. A “Serra do Gerez” também surge representada.

45 - 1831 – De Lapie, Lopez, Lemotte, Antillon: Este mapa tem a particularidade de representar a “Serra da Estrica”, situando-a desde o Norte de Viana do Castelo, até à zona a Norte de Arcos de Valdevez. Também surge o F. da Estrica. É nele figurado o “Monte da Gaviarra”, aqui assinalado com - uns incríveis - 2.627 mts. À parte de tais elevações, apenas surge a “Serra do Gerês”. Uma vez mais na área da localidade de “Soajo”, surge a misteriosa “Flervael”.

46 - 1836 – Henry Schenk Tanner: Este mapa também nos traz algumas curiosidades. Assim surge nele a “Serra da Estrica”, desta feita logo a norte de Viana do Castelo (Monte de Santa Luzia), “dirigindo-se” depois para Norte até alcançar a zona Sul da localidade da galega de Tuy. Está lá também o “M. Catarina”, figurado logo a nascente da cidade do Porto e “chegando” às cercanias de Chaves. A cidade de Braga aparece ali como “Briga”. No meio de tão poucas figurações surge, ainda assim, o “Forte da Estrica”. 

47 - 1838 – Jean Baptiste Poirson: Apenas trago aqui este mapa para demonstrar, uma vez mais, os erros crassos que alguns mapas evidenciavam (com algumas honrosas exceções) ainda em meados do século XIX. Assim este, por exemplo, coloca – também ele - a localidade de “Soajo” a Sul do Rio Lima, o que aconteceu recorrentemente, bem como se figurou nele a enormidade de colocar a localidade de “Vila Verde” a sueste de Braga, a meio caminho para Amarante!

48 - 1840 – James Wyld (existe, aparentemente, um outro James Wyld, com um mapa de 1842): Consiste no baptizado «General map illustrative of the operations in Portugal, and the adjoining frontier of Spain». Trata-se de um mapa do tempo das Guerras Napoleónicas em que os Ingleses andaram por cá a “deitar uma mãozinha” (acabaram por ser as duas!). Mostra-nos a localidade de “Nossa Senhora da Peneda”, situação quase singular até esta data. Não surge a localidade de “Soajo”. Uma curiosidade também relevante é que no mapa de 1840 surge um “Onteiro Maior”, ou seja “Outeiro Maior” figurado entre a dita “Nossa Senhora da Peneda” e “Sistelo”. Relativamente a serranias, especificamente, apenas representa a “Serra do Geres”.

49 - 1841 - Pierre Antoine Tardieu – (também 1842) - Representa a “Serra de Estrica”, que se detém no Rio Vez. A “Serra de Soazo” está lá, surgindo por cima da misteriosa “Flervael” (que ocupa, sensivelmente, o local da Vila de Soajo). “Monte Penagache” é representado no sítio do “costume”. A representação toponímica deste mapa é de todo semelhante à do mapa de Guilleminot, Armand-Charles (ver acima mapa 42). Aliás, nota-se uma distinção entre a Escola – digamos – francesa e as demais escolas de outros países, ocorrendo muito uma repetição representativa de uns para os outros dentro da mesma “Escola”.

50 - 1842 – James Wild e o seu «Mapa coreográfico do Reino de Portugal»: Está lá representada a “Serra do Soajo”, bem como a “Serra da Estrica” (que se deterá, a nascente, pela zona de Sistelo). Junto à raia de Castro Laboreiro figura-se a “Serra de Gaman” (já acontecera a sua representação anteriormente com outros mapas realizados por autores ingleses). O “Gerês” aparece em território Espanhol, a norte de Montalegre.

51 - 1844 – Alexander Keith Johnston: Representa a “Serra de Estrica”, que, novamente, parece deter-se a nascente no vale do rio Vez. No local que corresponderá, sensivelmente, à localidade de Soajo aparece a predita “Flervael”. A “Serra do Gerez” está lá.

52 - 1845 - Leutemann, Adolf; Leutemann, Heinrich‏ - Neste mapa surge a “Serra de Suazo”, com a particularidade, já anteriormente vista num ou noutro mapa, de ela adentrar-se até depois de Orense (Galiza). Está lá também a “Serra do Gerez”, mas deslocada para norte de Montalegre.

53 - 1847 - Dufour, Auguste-Henri – Este mapa possui a singularidade de figurar a “Serra de Leboreiro”, colocando-a, sensivelmente, na zona que corresponderá à “Serra de Soajo”. Imediatamente a leste da “Serra de Leboreiro” surge a “Serra de Penama” e estas duas aparecem logo a norte da “Serra de Penagache”. Ou seja, uma trapalhada!

54 - 1850 – Emiliano Augusto De Bettencourt – Este autor elaborou o chamado “Extracto das cartas parietaes de Portugal aprovadas pelo Ministério do Reino, para uso das escolas de instrucção primaria e adoptadas nos principaes lyceus do reino, para os exames da chorographia do paiz”. 

Este mapa tem a particularidade, assinalável, de ser então destinado ao estudo liceal. Aparentemente terá sido o primeiro mapa destinado a esse exclusivo fim. Tem uma representação gráfica relativamente simples, mas de todo o modo constam lá a “Serra do Suajo” e, ainda que menos relevante relativamente ao que aqui me traz, a “Serra do Gerês” e a “Serra da Cabreira”.

55 - 1853 – Elliot Wm, Capitain: «Carta Corográfica de Portugal». Representa a “Serra do Soajo” a ocupar todo o espaço serrano situado entre Viana do Castelo e Melgaço (norte do Rio Lima). Também lá estão a “Serra do Gerês” e a “Serra Catharina”, esta última ocupando uma zona significativa, que surge a nascente de Guimarães (Penha) e “vai” até perto de Chaves. 

56 - 1854 - Agostinho José Lopes Dinne: «Carta geral dos triangulos fundamentaes do reino de Portugal». 

Este mapa assume grande relevância uma vez que nele surge, pela primeira vez, a referenciação de um cume com o nome “Peneda”, este coincidente com aquele que era até então o “Alto do Pedrinho”. Aliás, refiro que ainda na actualidade as gentes locais denominam o local em questão como “Pedrinho”, “Alto do Pedrinho”, ou “Castelo do Pedrinho”.

Foi este o primeiro mapa a representar, na sua totalidade, os ditos “Triângulos”, ou marcos/vértices geodésicos de 1ª ordem. Este mapa contempla informação da triangulação de 1ª ordem e das quadrículas, numeradas a vermelho, das 37 folhas, da Carta Corográfica 1:100 000, levantada entre 1853 e 1892 e publicada de 1856 a 1904. 

Este mapa é também ele muito importante por outro tipo de razões, as quais serão aprofundadas no capítulo seguinte. Outros trabalhos precederam este 1º mapa, como seja aquele produzido por Paulo José Ciera, matemático e astrónomo português, de ascendência italiana, que deu início à triangulação geral de Portugal e que ficaram incompletos por vários motivos, nomeadamente pela demissão do Ministro (D. Rodrigo de Sousa Coutinho) que impulsionou esses trabalhos e a subsequente falta de financiamento. 

Pedro e Filipe Folque (pai e filho), nomes de relevo para a história da polémica aqui em estudo, retomaram esses trabalhos em 1835. No ano de 1802 havia sido entretanto erigido o 1º vértice vértice geodésido em Portugal, correspondente ao da “Melriça”, situado no centro geográfico de Portugal, que veio a ser reconstruído em 1852 pelo referido Filipe Folque. 

Neste mapa surgem, como o nome indica, o conjunto dos marcos de 1ª grandeza que existiam e existem no nosso país. Entre eles figura o cume, aqui marco geodésido de 1ª grandeza, de nome “Peneda”, que aparece a triangular com o “Larouco”, o Oural”, a “Cabreira”, “S. Paio” e, na Galiza, com o “S. Nomedio”.

Chama-se a atenção para o facto de este mapa mencionar, singularmente, o cume “Peneda” e não uma “Serra da Peneda”.

57 - 1856 - Colton, Joseph Hutchius: No mapa deste autor é figurada a “Serra da Estrica”, desta feita “atravessando”, aparentemente, o Rio Vez para nascente. Referencia também o “Monte da Gaviarra”, na zona correspondente ao actual “Outeiro Maior” e, consequentemente, ao “Alto da Pedrada”. Mais a nascente/norte, na zona do que serão, genericamente, os “Montes de Laboreiro”, surge a já mencionada “Serra de Penagache”. Soajo não surge no mapa e, no seu lugar volta a referenciar-se, em letras “garrafais”, o nome “Flervael”.

58 - 1860 - António Correia Barreto, César Augusto da Costa, Filipe de Sousa Folque, António José Pery, Gerardo Augusto Pery; Joaquim José dos Santos – “Carta Geographica de Portugal”:

Este mapa referencia o Santuário de “Nossa Senhora da Peneda”, desta feita enquanto localidade, situação ainda rara até sobrevir este mapa. Também lá está assinalado, quiçá por uma segunda ocasião, o cume com o nome “Peneda” (com 1379 mts) e não, também neste caso, uma “Serra da Peneda”. É ainda de realçar que surge no local onde se encontra o “Alto da Pedrada”, uma elevação com 2600 e qualquer coisa metros (percebe-se mal). “Suazo” está lá e no local correcto, a norte do Rio Lima. Refiro, também, porque é um tema que me suscita algum interesse particular, que no mapa está, também, “Vilarinho da Furna”.

Acima coloquei a negrito os nomes do co-autor do mapa, Filipe de Sousa Folque, bem como o de Gerardo Pery, uma vez que, como procurarei depois explicar, eles terão tido um papel importante na questão dos “nomes”. 

59 - 1861 - Depósito dos Trabalhos Geodésicos, de Francisco de Paula Rebelo e Nicolau Trant: Este mapa tem desde logo a característica de ser de índole regional e, por tal facto, revelar um maior nível de pormenorização. Destaca-se nele a referência à “Serra da Peneda” e ao Santuário de Nossa Senhora da Peneda. Figura, igualmente, o “Outeiro Maior”. Surgem também a “Serra de Arga” (talvez pela 2ª vez – cfr. mapa 24), a “Serra da Padella”, “Serra de Corno do Bico” (talvez também pela 1ª vez), “Serra d’Amarella” e, como quase sempre, a “Serra do Gerez”. Menciona, ainda, “Vilharinho da Furna”.

De todo o modo, este mapa, de acordo com o Professor Luís Moreira, corresponde a uma cópia impressa de um mapa de Custódio Vilas Boas (originalmente editado em 1813, mas que será de 1793/94) e, tal como sucede com todos os mapas de Vilas Boas, apenas se refere a “Serra da Peneda”.

60 - 1861 – Don Francisco Coello – Trata-se de um mapa com um pormenor muito assinalável a nível orográfico. Representa na zona o “Monte Gavieira”, com 1403 mts. A norte do Rio Lima apenas assinala mais um cume (sem nome) na zona de Castro Laboreiro (1238 mts). A sul do vale do Lima representa a “Serra do Gerez” (1298 mts), a “Serra da Cabreira” (1078 mts), e “Santa Catharina” (não se consegue ler a altitude). Assinala também o que para o cartógrafo seria o ponto mais alto da zona norte, o “Pico de Larouco”, com 1548 mts.

Este cartógrafo tem um outro mapa de 1864, no qual embora utilize outra técnica de representação cartográfica, em nada difere no que respeita à orografia e representação das montanhas. Também representa o – quase – mítico e místico “Couto Misto” (perto de Tourém, concelho de Montalegre).

(Continua)

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