Acto Primeiro
A dureza da noite fez-se sentir pelo frio que ia sentindo nos pés e chamar dormir àqueles longos minutos, seria no máximo um eufemismo. No único abrigo disponível nos Carris, estávamos atentos à passagem do vento, por vezes forte, e à ruidosa ondulação do plástico que evitava uma parte da corrente de ar que ia teimosamente entrando pela porta vinda de Oeste. É nestas alturas, em que a mente é enganada pelas sombras que vão passando reflectidas no branco pálido da neve, que nos pomos a pensar na dureza daqueles dias idos em que a Terra era esventrada na frenética busca pelo volfrâmio.
Nos momentos de curto silêncio e naquela altura em que lentamente vamos escorregando para um mundo mais calmo, a música dos Carris ia-se fazendo ouvir com o vento a brincar nos orifícios de um qualquer tubo hasteado e encimando a porta da velha pequena cantina, última morada naquele sítio do último guarda das Minas dos Carris. Hoje abandonada a casa nada testemunha a quem passa. É uma triste ruína aparentemente sem história, mas local de muitos serões onde se discutiram inúmeros problemas de todo o género. Enfim, vãs memórias que não são as minhas...
De repente, ficava mais claro lá fora e os sessenta minutos de uma hora passaram se me aperceber disso. Os pés continuavam gelados e o saco-cama com que me abrigava já parecia feito de um fino tecido permeável a quase tudo, menos ao meu calor. Não seria possível testemunhar o regresso do Sol, pois Carris permanecia envolto numa espessa névoa, neblina e num pesado nevoeiro que nos fazia lembrar mais uma vez do que seriam dias e dias passados assim.
O cenário era o ideal para uma verdadeira orgia fotográfica e o resultado disso vem já a seguir...
Fotografias © Rui C. Barbosa
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