terça-feira, 28 de novembro de 2023

Trilhos seculares - Carris de Maceira e Lomba de Pau

 


A caminhada foi-se fazendo aos sons do Outono que se agarra aos seus últimos dias, numa metamorfose invernal que eventualmente chegará.

Com a dança das nuvens e o ir e voltar das névoas, a paisagem ora se mostrava, ora se escondia. Os tons de cinza num dia soturno faziam com que o verde que resiste surgisse num pálido mostrar do que já foi em dias idos de Primavera e Verão. Estes são os dias do recolhimento e dos serões à lareira, escutando a chuva a embater nas vidraças e o vento que assobia pela chaminé.

Os dias escurecem cedo e por alguma razão, o meu relógio interno acorda-me cedo. Lá fora é ainda sempre escuro e o silêncio preenche a aldeia. São os dias do recolhimento, dos serões à lareira e do ambiente quente das casas, mas há sempre quem queira desafiar este conforto...


Mais uma vez, das centenas já este ano, botas calçadas e mochila pronta. A caminhada seria curta, por isso o manjar era coisa pouca, sem esquecer o costumeiro café que se faz na montanha.

A «viagem» para a Portela de Leonte fez-se pela Estrada Panorâmica das Voltas de São Bento. A Estrada da Geira está, como hei-de dizer, miserável, sendo poucos os pedaços sem gigantes crateras que põem à prova a suspensão dos mais incautos. Quando chegar o Verão quem de direito irá reparar a estrada, os que por cá ficam que se lixem... na verdadeira acepção da palavra porque já não há paciência para politiquices.

Carro parado na Portela de Leonte e começa a jornada, seguindo pela «estrada privada do Estado sob gestão do ICNF» até atingir a ponte sobre o Rio Maceira, virando à direita e entrando no Vale do Rio Maceira. Este troço de carreiro dá-me sempre a sensação de estar a entrar numa parte selvagem da Serra do Gerês, apesar de tão próxima da estrada. Equipado para o frio, pois a chuva ainda se mantinha longe, paro na ponte da madeira que atravessa para a margem direita do Maceira e decido tirar o casaco. Bem mais confortável fiquei, sem a sensação de um escaldão nas costas.



A passagem pelo Curral de Maceira, guardado pelas altas paredes do vale que se afunila a Nascente, mostra-me a subida para as Tábuas. É uma subida que se faz a passo lento com várias paragens para apreciar o deambular das nuvens malucos que correm vale fora e vale acima. O vale, este, fica cada vez mais fundo à medida que se sobre e a paisagem se alarga para o Pé de Cabril que luta por se manter à tona do mar de nuvens que o abraça. Em breve, estou na chã que antecede a subida para Carris de Maceira e o olhar alarga-se para os tons escuros da Mata de Albergaria. O manto de Outono vai desaparecendo aos poucos, dando lugar às árvores despidas e adormecidas para o Inverno.

Subo então para o curral a pouca distância, seguindo na vertente da Corga de Cagademos voltada às Fragas da Corneda e ao longe vislumbro o primeiro rebanho de cabras-montesas do dia. Atentas à minha breve passagem, mantêm-se seguras à distância com o macho dominante nas suas cores de Inverno fitando os meus passos. Estes, levaram-me então ao Curral de Carris de Maceira com o topo do Pé de Medela a espreitar para lá das faldas da serra que ali se encrespa num nervoso granítico miudinho.


Ao longo da caminhada, a chuva havia-se mantido afastada. As nuvens, no seu ir e voltar, iam tornando o ambiente mais ou menos húmido, mas a certa altura - quando o nevoeiro encobriu por completo a paisagem e os vales se transformaram em paredes impenetráveis - lá começou a cair. O abrigo relativo de Carris de Maceira foi de curta duração, pois com a chuva viria também um vento frio.

O segundo rebanho de cabras-montesas escondia-se pelas fragas quando comecei a acelerar o passo para chegar ao abrigo da Lomba de Pau, percorrendo a Corga dos Cântaros e ladeando o cabeço do mesmo nome até atingir o Vale da Lomba de Pau. A chegada ao Curral da Lomba de Pau foi já em chuva abundante e o abrigo deu-me a sensação de uma mansão na qual saboreei um magnífico café feito na hora. Pequenos prazeres.

Enquanto saboreava o café, a chuva acabaria por acalmar, fazendo-se sentir por breves aguaceiros que traziam - de quando em vez - umas gotas mais grossas que se faziam escutar de forma grave no impermeável.

O regresso ao ponto de partida fez-se seguindo para a Chã das Gralheiras e Lamas de Borrageiro, descendo depois para a Chã da Fonte e Preza, e continuando para o Vidoal e Chã do Carvalho, percorrendo a magnífica calçada da Encosta do Murjal e o carreiro até à Portela de Leonte.

Ficam algumas fotografias do dia, enquanto a chuva foi deixando...














Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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