Minas dos Carris, 14 de Agosto de 2015
Por vezes é-me difícil encontrar um tema ou os detalhes para compor estes textos. Se eu fosse o leitor, acho que depressa me cansaria de ler tantas vezes sobre os mesmos lugares. Já pensei sobre isto mesmo, mas chego à conclusão que, por muitas vezes que se visite um lugar e se escreva sobre este mesmo lugar, esta visita e este texto serão únicos, pois são engalanados com as emoções e sentimentos daqueles momentos.
O dia previa-se muito mais ameno do que os dias anteriores onde o calor deste Verão secou os rios e ribeiros, e deu uma tonalidade mais amarelada a várias partes da serra. Felizmente, o verde dos bosques e florestas vai resistindo avivado pelo orvalho de noites mais frias. Este dia surgiu com o nevoeiro a topejar os píncaros serranos e por aí dava para adivinhar uma caminhada mais suave até às Minas dos Carris percorrendo o Vale do Homem.
Não foram muitas as vezes que vi a Fonte da Abelheirinha a agoniar de tão pouca água ou mesmo o leito do Rio Homem estranhamento seco em alguns troços. Afastando-nos do seu leito, o vale adquiria um estranho silêncio, daqueles profundos onde a nossa respiração por vezes se torna um grito a ecoar pelas paredes íngremes das corgas que se altivam em direcção aos céus. Quando nos aproximávamos do rio, era com alguma timidez que o Homem se fazia escutar. Pode parecer estranho em pleno Agosto termos paisagens de Outono ou Inverno, mas aquelas paisagens pareciam de certa forma já um prenuncio da grande mudança que se avizinha.
Já sabemos por onde passamos na direcção do topo da serra... a água da Pala surge após a Abelheirinha como uma oportunidade de olhar para trás e nos maravilharmos com o vale que dali a pouco se vai abrir nas nossas costas. Lá ao fundo (e desta vez coberta de nuvens) a Serra Amarela perfila-se com saudade e os seus eternos mistérios, guardando os segredos da aldeia mártir. Mais adiante vamos passar pelo Ribeiro do Cagarouço, seco seguindo na direcção do Homem. O Cagarouço provem de uma fortaleza bem guardada pela serra e da qual não vemos o seu fim. O verdadeiro mar de pedras em que se transformou o caminho mineiro, vai-nos agora levar à Curva do Febra e depois ao anfiteatro natural antes do Modorno. As paredes alcantiladas que se elevam perante nós, abrigam a Água da Lage do Sino, nesta altura sem água. Chegados então ao Modorno é altura do usual descanso e de nos maravilharmos com a beleza deste Vale do Alto Homem. Nos tempos do volfrâmio, onde por entre a dureza dos dias e a rudeza dos homens surgiriam certamente exclamações atónitas perante tais paisagens, estas seriam aquele momento de retemperar as forças para nova jornada.
O Modorno parece que marca a metade da distância em muitas caminhadas em direcção às Minas dos Carris e esta metade que falta vai-nos fazer enveredar mais para dentro e mais para cima na serra, pois o que antes estava em cima está agora em baixo e o que estava longe está um pouco mais perto.
O Teixo foi zona de carvoaria e os vestígios encontram-se por lá, perdidos e abandonados da memória da serra. O seu pequeno curral e o seu forno passam sempre despercebidos a quem caminha pelo estradão mineiro que agora nos leva a passar as Águas Chocas e mais adiante as Abrótegas. Aqui, não muito longe do sítio onde o Homem começa a correr para o Rio Cávado, a água é estagnada fruto dos dias secos. Deixando as Abrótegas para trás com as suas memórias de expedições e minas, seguimos para a Corga da Carvoeirinha que finalmente nos faz chegar às silenciosas ruínas das Minas dos Carris.
Para lá de um pequeno descanso, a passagem pelas ruínas foi rápida. Gosto de as visitar no silêncio da serra ou na contemplação do seu isolamento. Desta vez, e como havia mais gente por lá, o ruído da multidão fez-me não parar por ali muito tempo. Segui então na direcção da Lamalonga, pois queria percorrer a sua aridez e embrenhar-me no sue silêncio. Nestes dias, a Lamalonga será a sensação mais próxima que podemos ter de caminhar num deserto ermo, numa época onde os homens deixaram a Terra e esta vive a calmaria dos seus dias sem infortúnio. Este foi um dos locais mais afectados e alterados pela prospecção mineira, pois grande parte da sua área foi invadida por uma longa escombreira que guarda agora as entranhas da Terra expostas ao azul dos céus. À medida que nos vamos afastando da Corga da Lamalonga, no topo da qual reside a lavaria nova das minas, esta vai-se transformando num castelo que à distância se confunde com a paisagem.
Chegando à Sesta de Lamalonga virei à esquerda, pois a ideia era a de atingir os currais no Couce e a partir daqui chegar às Abrótegas. O carreiro está (ainda) relativamente bem marcado com as velhas mariolas que nos levam a percorrer paisagens sem nome até atingir o Curral das Cadeiras. Daqui, vamos chegar ao bordo esquerdo do Couce e neste topo já contemplamos o colosso do Borrageiro e os inúmeros currais que pontilham a paisagem. Muitos destes currais são conhecidos de quem por ali vai caminhando, porém, existem outros que apesar de ficarem perto, estão escondidos e muitas vezes nos passam despercebidos. Aquele é certamente um lugar cheio de histórias para contar e o registo de todos aqueles currais, fornos e eiras, será um trabalho a se fazer num futuro próximo.
Caminhando já na sensação do regresso, passei ao largo dos Cocões do Coucelinho, o imenso circo glaciar que marca a paisagem e que no seu ventre esconde um belo curral. O percurso, por vezes escondido entre a urze e a carqueja, leva-nos agora em direcção à passagem do Quelhão, qual porta que separa dois mundos! A subida faz-se a passo certo, mas custoso. Para lá do Quelhão surge-nos os Currais das Lamas de Homem e mais adiante assinala-se a Ponte das Abrótegas. A parte final do percurso faz-se descendo o Vale do Alto Homem por onde já havíamos passado uma horas antes!
Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
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