quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

191... De Penedem aos Carris, até Xertelo (I)

Carris, 26 de Dezembro de 2012

Dia de Inverno soalheiro com algumas nuvens para nos fazer sempre recordar a altura do ano em que nos encontramos. Depois de percorrer o cada vez mais terrível estradão da EDP até ao abrigo de Penedem, iniciamos a nossa jornada estabelecendo o objectivo de atingirmos as Minas dos Carris através da Lamalonga. Para tal, usamos os velhos carreiros de montanha... trilhos perdidos e apagados pelo tempo, tal como muitas das memórias que fizeram a história daqueles lugares solitários.

A Lagoa encontrava-se com uma fina camada de gelo que certamente não resistiria ao Sol que em algumas alturas do dia se mostraria quente por entre as nuvens que passeavam apressadas pelo céu azul invernal. Aquela altitude por vezes soprava um vento frio que nos adormecia as mãos, mas mais eram as vezes em que a vontade de despir o polar surgia do que aquelas em que tínhamos de esconder os dedos dador do frio.

Deixando Penedem para trás, baixamos aos Currais do Couce. Estes currais representam um belo aproveitamento dos espaços de montanha que em tempos eram usados para o cultivo do centeio e para a pastagem e guardas dos gados transumantes. Em algumas zonas são visíveis os pequenos muros em pequenos e área elevadas que assinalam a presença de eiras nas quais de procedia à tradição do centeio.

Os velhos carreiros vão sendo assinalados por pequenas mariolas que nos ajudam a orientar e a dar razão ao provérbio que diz que estas são úteis quando sabemos para onde vamos. Nesta altura, e por causa das recentes chuvas intensas, os cursos de água estão vivos e transformam-se em obstáculos a terem de ser ultrapassados. Foi o que aconteceu à passagem do Ribeiro do Couce! Não é que a sua transposição seja difícil e até proporciona um momento extra de aventura, porém todo o cuidado é pouco se não se quer caminhar o resto do dia com as botas molhadas.

À medida que o promontório granítico do Borrageiro, com as suas já seculares minas, ficava cada vez mais abaixo na linho do horizonte, íamos penetrando cada vez mais na serra. O desejo de se vislumbrar algum animal era grande, mas somente os seus vestígios iam aparecendo. Grande pegadas aqui, outras mais pequenas ali, alguns dejectos... mas infelizmente, nenhum avistamento do senhor das serranias. No entanto, uma outra surpresa nos esperava mais adiante.

Com o passar dos anos e com a mudança de hábitos e de economia das gentes serranas, os velhos trilhos vão-se tornando cada vez menos utilizados. Em muitos sítios só a presença de uma mariola nos indica por entre a vegetação, o rasto que nos leva ao destino. Em grande parte deste percurso até à Lamalonga assim foi e, de facto, só ao fundo do Barroco de Trás da Pala avistamos uma grande quantidade de mariolas que inequivocamente nos levaram em direcção aos Carris.

A visão da Lamalonga com os seus grandes currais é algo que dificilmente consigo descrever por palavras. Portugal é sem dúvida um país que consegue ter paisagens que rivalizam na sua emoção com outras paisagens por esse mundo fora. É certo que muitas vezes não conseguimos atribuir um termo de comparação com outras paisagens únicas pelo facto de acharmos que essas paisagens são únicas. O largo vale de Lamalonga é sem dúvida um dos locais mais belos de toda a Serra do Gerês, mas indissociável do restante entorno paisagísticos que por estas paragens adquire termos que talvez somente o melhor dos poetas possa descrever.

O nosso caminho levou-nos a entrar na Lamalonga já a meio da sua grande extensão e após passar dois currais, entramos na grande escombreira da Mina dos Carris, sem dúvida o elementos que nesta parte define toda a paisagem próxima da Lamalonga. Ao longe, já no topo da Corga de Lamalonga, a estrutura acastelada da lavaria, faz-nos lembrar histórias e contos fantásticos que nos transportam a outros tempos. Nesta altura tivemos de atravessar as águas que mais tarde irão formar o Rio Cabril e caminhando sobre o cascalho que em tempos foi extraído das entranhas do Salto do Lobo, tomamos o carreiro que nos iria levar a subir até à lavaria e entrar no velho complexo mineiro.

A grande surpresa do dia estava à nossa espera um pouco depois da entrada da velha mina. Um grande rebanho de cabras selvagens pastava calmamente e podemos observá-las durante longos minutos até que se decidiram afastar em direcção ao Penedo da Saudade atravessando depois por entre as ruínas das casas mineiras dos Carris.

(continua)
















 


















Fotografias: © Rui C. Barbosa

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