terça-feira, 23 de maio de 2023

Serra do Gerês - Um passeio botânico pelo Vale do Homem

 


Aproveitando as manhãs frescas destes últimos dias de Maio, fiz uma pequena incursão no Vale do Alto Homem em busca da planta rainha do Parque Nacional da Peneda-Gerês. Esta, acabaria por aparecer após poucos quilómetros, solitária por entre a paisagem de granito e os sons do rio.

O percurso pelo Vale do Alto Homem inicia-se a uma altitude de 720 metros e rapidamente nos apercebemos que não será um caminho fácil para os mais desprevenidos. A sua dificuldade vai aumentando ao longo do percurso não tanto pela inclinação, mas mais pelo estado do próprio caminho. Em quase 9,8 km de extensão, este é na sua maioria composto por pedra solta que dificulta a progressão. São escassas as extensões em que o terreno é suave.

Na quase totalidade o percurso é acompanhado pelo Rio Homem e o seu rumor por entre as rochas acompanha-nos quase sempre.

Convém salientar que este percurso está inserido num vale de extrema importância para o Parque Nacional da Peneda-Gerês que está integrado numa das duas áreas de protecção total existentes naquela área protegida, logo convém solicitar uma autorização ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.


Tuberária - Tuberaria globulariifolia (Lam.) Willk.

Ao longo do caminho vamos observando um ou outro pequeno muro, um ou outro alinhamento de pedras que nos podem sugerir a existência de uma rude estrada serrana. O primeiro sinal sólido da existência de algo mais complexo na serra, surge-nos junto da zona que dá pelo nome de ‘Água da Pala’. Aqui, e já coberta pela vegetação, observamos à nossa esquerda uma área delimitada por um pequeno e baixo muro. Em tempos terá servido de curral para abrigo dos rebanhos. Do lado direito podemos observar, também por entre a vegetação, uma pequena construção com tijolos de cimento que nos dá a ideia de ser uma pequena guarita, mas que já foi referenciada como um pequeno abrigo dos cantoneiros que mantinham o estradão em estado de circulação. Esta zona antecede uma ponte de pedra. Toda este lugar é extremamente peculiar e bucólico.

Na Água da Pala iniciava-se um trilho de pé posto que atravessava o Rio Homem e subia ao longo do rio pela sua margem direita no sopé da Encosta do Sol até atingir o topo do Cabeço do Modorno, algumas centenas de metros após atravessar novamente o Homem sensivelmente à cota de 1050 metros de altitude. Não havendo registos cartográficos deste trilho em direcção a Carris, documentos fotográficos atestam a sua continuação para as zonas mais elevadas da serra. Quem observa a Encosta do Sol a partir da Água da Pala, terá a sensação de ainda poder vislumbrar o traçado deste pequeno trilho que, sem dúvida, nos proporcionaria uma visão distinta do vale. Porém, e após várias tentativas de observar no terreno a sua progressão, cheguei à conclusão de que este trilho já desapareceu e será extremamente difícil tentar seguir o seu antigo percurso, senão mesmo impossível.



Lírio-do Gerês - Iris boissieri Henriq.

Após passar a Água da Pala, o caminho entra numa zona mais plana. Até aqui, e olhando para a nossa direita, temos a oportunidade de observar os picos escarpados que delimitam os Prados Caveiros. Esta fase mais plana do trilho segue pela Ponte do Cagarouço sobre a Ribeira do Cagarouço, um pequeno afluente do Rio Homem que parece surgir das escarpas da Ravina do Cabeço da Porca. É nesta fase que o caminho se volta a inclinar ligeiramente e ouvimos o rugido do jovem rio a poucos metros de distância. Por entre a vegetação é por vezes fácil ter um olhar sobre lagoas que no Verão são sempre uma forma de retemperar forças.

O percurso ultrapassa a cota dos 1.000 metros de altitude, a pouca distância de entrarmos numa fase do caminho onde vamos superar vários metros de altitude em pouca distância, ultrapassando assim um bom declive. Em Carvalhas Vrinhas, o percurso flecte para a direita no que são conhecidas como as ‘Curvas do Febra’ e em pouca distância subimos 30 metros em altitude antes de flectir para a nossa esquerda. Poucos metros mais adiante, somos ladeados, à direita, por uma parede sólida de granito e, à esquerda, por uma queda de 50 metros que termina no Rio Homem. O declive aqui é acentuado e notório, mas o esforço para chegar à meia distância merece a pena.

Somos chegados a meio do caminho e o descanso na Ponte do Modorno é merecido. A água da ribeira é sempre fresca e corrente, mesmo no Verão. Ao entrar neste pequeno vale temos a visão de uma pequena queda de água por debaixo da ponte e são poucos os que resistem a uma fotografia. Situados na ponte em direcção ao final do vale, por onde vemos o Rio Homem, temos à nossa direita o imponente Cabeço do Modorno, uma escarpa granítica que atinge os 1.317 metros de altitude. Conheci todas as pontes até ao Modorno já em cimento, mas o meu fascínio por estes espaços começou a ser despertado pelas velhas pontes de madeira que antigamente permitiam a passagem célere e um tanto ou quanto aventureira.

Neste dia, parei por aqui. Contemplei o silêncio e o deambular de um jovem macho de cabra-selvagem que sem dificuldade trepava os alcantilados graníticos que se precipitam sobre o vale. Após um pequeno descanso, encetei o regresso pelo trajecto que havia percorrido.

Por entre a explosão de cores primaveris que ocorre nas montanhas do Parque Nacional, contamos os dias à medida que as diversas plantas vão surgindo e logo depois tornando-se efémeras. Sabemos que os dias passam quando os narcisos surgem no início da Primavera e depois pintam a paisagem dos prados de amarelo, dando depois lugar às abrótegas e a uma miríade de plantas. Corremos inevitavelmente para o Verão quando nos dias mais quentes de Maio as abrótegas definham e por entre a penedia, nos solos ásperos de granito, vão surgindo aqui e ali, as cores fortes do majestoso Lírio-do-Gerês que nos brinda com a sua beleza e vaidade por entre todas as flores. Em poucos dias, estes irão desaparecer e o Verão chega com o seu calor abrasador, torrando a paisagem e secando as fontes.

E o tempo repete-se...

Ficam algumas fotografias do dia...

















Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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