Aproveitando as manhãs frescas destes últimos dias de Maio, fiz uma pequena incursão no Vale do Alto Homem em busca da planta rainha do Parque Nacional da Peneda-Gerês. Esta, acabaria por aparecer após poucos quilómetros, solitária por entre a paisagem de granito e os sons do rio.
O percurso pelo Vale do Alto Homem inicia-se a uma altitude de 720 metros e rapidamente nos apercebemos que não será um caminho fácil para os mais desprevenidos. A sua dificuldade vai aumentando ao longo do percurso não tanto pela inclinação, mas mais pelo estado do próprio caminho. Em quase 9,8 km de extensão, este é na sua maioria composto por pedra solta que dificulta a progressão. São escassas as extensões em que o terreno é suave.
Na quase totalidade o percurso é acompanhado pelo Rio Homem e o seu rumor por entre as rochas acompanha-nos quase sempre.
Convém salientar que este percurso está inserido num vale de extrema importância para o Parque Nacional da Peneda-Gerês que está integrado numa das duas áreas de protecção total existentes naquela área protegida, logo convém solicitar uma autorização ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.
Ao longo do caminho vamos observando um ou outro pequeno muro, um ou outro alinhamento de pedras que nos podem sugerir a existência de uma rude estrada serrana. O primeiro sinal sólido da existência de algo mais complexo na serra, surge-nos junto da zona que dá pelo nome de ‘Água da Pala’. Aqui, e já coberta pela vegetação, observamos à nossa esquerda uma área delimitada por um pequeno e baixo muro. Em tempos terá servido de curral para abrigo dos rebanhos. Do lado direito podemos observar, também por entre a vegetação, uma pequena construção com tijolos de cimento que nos dá a ideia de ser uma pequena guarita, mas que já foi referenciada como um pequeno abrigo dos cantoneiros que mantinham o estradão em estado de circulação. Esta zona antecede uma ponte de pedra. Toda este lugar é extremamente peculiar e bucólico.
Na Água da Pala iniciava-se um trilho de pé posto que atravessava o Rio Homem e subia ao longo do rio pela sua margem direita no sopé da Encosta do Sol até atingir o topo do Cabeço do Modorno, algumas centenas de metros após atravessar novamente o Homem sensivelmente à cota de 1050 metros de altitude. Não havendo registos cartográficos deste trilho em direcção a Carris, documentos fotográficos atestam a sua continuação para as zonas mais elevadas da serra. Quem observa a Encosta do Sol a partir da Água da Pala, terá a sensação de ainda poder vislumbrar o traçado deste pequeno trilho que, sem dúvida, nos proporcionaria uma visão distinta do vale. Porém, e após várias tentativas de observar no terreno a sua progressão, cheguei à conclusão de que este trilho já desapareceu e será extremamente difícil tentar seguir o seu antigo percurso, senão mesmo impossível.
Após passar a Água da Pala, o caminho entra numa zona mais plana. Até aqui, e olhando para a nossa direita, temos a oportunidade de observar os picos escarpados que delimitam os Prados Caveiros. Esta fase mais plana do trilho segue pela Ponte do Cagarouço sobre a Ribeira do Cagarouço, um pequeno afluente do Rio Homem que parece surgir das escarpas da Ravina do Cabeço da Porca. É nesta fase que o caminho se volta a inclinar ligeiramente e ouvimos o rugido do jovem rio a poucos metros de distância. Por entre a vegetação é por vezes fácil ter um olhar sobre lagoas que no Verão são sempre uma forma de retemperar forças.
O percurso ultrapassa a cota dos 1.000 metros de altitude, a pouca distância de entrarmos numa fase do caminho onde vamos superar vários metros de altitude em pouca distância, ultrapassando assim um bom declive. Em Carvalhas Vrinhas, o percurso flecte para a direita no que são conhecidas como as ‘Curvas do Febra’ e em pouca distância subimos 30 metros em altitude antes de flectir para a nossa esquerda. Poucos metros mais adiante, somos ladeados, à direita, por uma parede sólida de granito e, à esquerda, por uma queda de 50 metros que termina no Rio Homem. O declive aqui é acentuado e notório, mas o esforço para chegar à meia distância merece a pena.
Somos chegados a meio do caminho e o descanso na Ponte do Modorno é merecido. A água da ribeira é sempre fresca e corrente, mesmo no Verão. Ao entrar neste pequeno vale temos a visão de uma pequena queda de água por debaixo da ponte e são poucos os que resistem a uma fotografia. Situados na ponte em direcção ao final do vale, por onde vemos o Rio Homem, temos à nossa direita o imponente Cabeço do Modorno, uma escarpa granítica que atinge os 1.317 metros de altitude. Conheci todas as pontes até ao Modorno já em cimento, mas o meu fascínio por estes espaços começou a ser despertado pelas velhas pontes de madeira que antigamente permitiam a passagem célere e um tanto ou quanto aventureira.
Neste dia, parei por aqui. Contemplei o silêncio e o deambular de um jovem macho de cabra-selvagem que sem dificuldade trepava os alcantilados graníticos que se precipitam sobre o vale. Após um pequeno descanso, encetei o regresso pelo trajecto que havia percorrido.
Por entre a explosão de cores primaveris que ocorre nas montanhas do Parque Nacional, contamos os dias à medida que as diversas plantas vão surgindo e logo depois tornando-se efémeras. Sabemos que os dias passam quando os narcisos surgem no início da Primavera e depois pintam a paisagem dos prados de amarelo, dando depois lugar às abrótegas e a uma miríade de plantas. Corremos inevitavelmente para o Verão quando nos dias mais quentes de Maio as abrótegas definham e por entre a penedia, nos solos ásperos de granito, vão surgindo aqui e ali, as cores fortes do majestoso Lírio-do-Gerês que nos brinda com a sua beleza e vaidade por entre todas as flores. Em poucos dias, estes irão desaparecer e o Verão chega com o seu calor abrasador, torrando a paisagem e secando as fontes.
E o tempo repete-se...
Ficam algumas fotografias do dia...
Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
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