quinta-feira, 23 de março de 2017

Trilhos seculares - Borrageiros e Coucelinho, uma volta pelo Gerês glaciar


Este foi um fantástico dia de caminhada que acordou fresco, mas teve temperaturas amenas quase a lembrar um Verão antecipado em plena Primavera e com os olhos postos nos dias do defunto Inverno que iriam reinar mais tarde.

(Na descrição a seguir irei utilizar referências toponímicas que têm origem nos povos de Cabril juntamente com referências provenientes das Cartas Militares sem fazer distinção entre as duas)

A caminhada começou um pouco acima do Vale de Lagoa já com as vistas postas no colosso de Borrageiros e com um amplo horizonte para a Serra do Gerês dominada pelo Iteiro d'Ovos, Porta Ruivas e Rocalva. Porém, a jornada não iria enveredar nesse direcção e cedo se tomou um carreiro em direcção à centenária Mina de Borrageiros. O percurso leva-nos a passar por pequenas sestas (Sesta de Borrageiros?) antes de chegarmos às ruinas abandonadas que em tempos serviram de abrigo aos mineiros que exploraram o volfrâmio nas rudezas graníticas daquelas paragens.

As cicatrizes que marcam a paisagem tornam-se imensas quando chegamos junto delas e o silêncio parece ampliar a sua condição de testemunho de um passado feito de esforço, suor e dor. A exploração do volfrâmio naqueles ermos Geresianos nunca foi fácil e a mina tem muitas histórias de uma convivência difícil com os povos serranos. Abandonada na década de 50 do século XX, é um testemunho da difícil vivência de outros dias.



Após uma visita ao que resta dos edifícios abandonados de Borrageiros, seguimos em direcção aos Cocões do Coucelinho, verdadeiro testemunho histórico das glaciações na Serra do Gerês.  No Quaternário, mais precisamente no Plistocénico (há cerca de 1.8 Ma a 10 000 anos), ocorreram importantes variações climáticas à escala do globo que se caracterizaram pela alternância de períodos glaciários (muito frios) e interglaciários, com glaciações a atingirem, inclusivamente, as latitudes médias. Embora sejam poucas as formas claramente glaciárias, nas serras da Peneda e do Gerês foram identificados vestígios dessas glaciações, dos quais merecem especial destaque os do Alto Vale do Vez e zona de Cocões de Concelinho - Lagoa do Marinho (vales com perfil em U; moreias; circos glaciários; superfícies de granito polidas, estriadas e com sulcos; depósitos glaciários).

Depósitos fluviais, torrenciais e glaciários constituem as formações geológicas mais recentes na área do Parque e encontram-se presentes em diversos pontos, sendo de destacar os de origem glaciar na Ribeira de Couce, Lagoa do Marinho e no Alto Vale do rio Vez.

Os Cocões do Coucelinho abrigam um um curral (Curral do Colástica (Coucões do Coucelinho)) juntamente com outras áreas muradas (sestas). Característica do local, é a presença de diversas moreias glaciares que povoam a paisagem de forma caoticamente ordenada. Foi numa destas moreias que a Sílvia Carvalho acabaria por descobrir o 'Coelho dos Cocões do Coucelinho'. Esta descoberta é o resultado de uma pareidolia. Ora, entende-se a pareidolia como um fenómeno psicológico que envolve um estímulo vago e aleatório, geralmente uma imagem ou som, que é percebido como algo distinto e com significado. Assim, é bastante comum as pessoas verem imagens que parecem ter significado nas nuvens, montanhas, solos rochosos, florestas, líquidos e outros tantos objectos e lugares.

De certa forma, e admitindo que a figura rochosa não teve, de facto, origem humana, foi isto que aconteceu à Sílvia Carvalho ao «descobrir» a figura de um coelho numa rocha existente junto do Curral dos Cocões do Coucelinho, na Serra do Gerês. As fotografias mostram de facto a figura bem distinta desse animal e até hoje nunca me havia dado conta da sua existência.

Deixando os Cocões do Coucelinho para trás, seguimos em direcção ao Vale do Couço, passando pelo Curral do Carreira (Couço) e seguindo depois em direcção às ruínas da Casa do Padre. Daqui, seguimos para o Curral do Bitcho e acabaríamos a primeira parte da jornada no Abrigo de Lagoa.

A segunda parte da jornada levaría-nos a visitar o Lago Marinho e iniciar o percurso que nos faria passar pelos Currais de Virtelo até um interessante abrigo que irei identificar mais tarde.

O álbum de fotografias do dias está aqui.

Algumas fotos do dia...



































































Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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