Carris, 16 de Fevereiro de 2010
A meteorologia prometia chuva, as televisões prometiam chuva, a Internet chuva prometia, felizmente a chuva não apareceu. No entanto fomos brindados com mais um presente da montanha, ou dois.
O dia nasceu nublado em Braga e realmente pairava a ameaça da chuva. Pouco depois do despertar estava já na Portela do Homem pronto para um regresso às Minas dos Carris. Já lá não ia desde o dia 2 de Janeiro e a ressaca batia já forte. O frio apertava pela manhã e a caminhada começou mais tarde do que é normal, mas ligeiros chegamos ao Modorno depois de nos maravilharmos com as cascatas de gelo que adornavam as paredes do Vale do Alto Homem. Há coisas que nem as mais belas palavras ou os melhores poemas conseguem descrever, momentos que só se vivem ali naqueles segundos por entre um olhar.
O gelado Ribeiro do Cagarouço lutava por aparecer por debaixo do gelo enquanto a temperatura ia baixando e o horizonte cinzento para lá do Modorno se ia aproximando. Fazendo companhia ao gelo foram aparecendo os primeiros sinais da neve sem dúvida caída no Domingo ou mesmo há poucas horas. Passado o Teixo a nossa preocupação estava na passagem das Águas Chocas pois é o local onde o gelo dificulta a progressão em tempos frios. Felizmente, não estava tão mau como prevíamos e a passagem foi relativamente fácil.
Nesta altura já a neve formava um tapete que facilitava o caminhar e a chegada às Abrótegas foi a entrada num cenário de neve, gelo e frio. Decidimos que a parte final do percurso seria feita pelo Salto do Lobo entrando assim pelo topo da Corga da Lamalonga. Finalmente, chegávamos ao mundo do silêncio... as Minas dos Carris.
Depois das fotografias a vários edifícios chegou a hora do repasto e de trocar de roupa. A nossa primeira surpresa iria surgir pouco depois quando fomos brindados pela visita de um pequeno roedor que espantado pela movimentação dos dois gigantes veio espreitar o que se passava pela vizinhança. Acabou por levar alguns pedaços de queijo e pão, o que deverá ser suficiente para a sobrevivência de alguns dias naquele mundo gelado. Depois de terminado o chá quente, veio a visita à represa.
Por esta altura o termómetro marcava 0,8ºC e não corria vento algum. Carris era um local de paz, silêncio e contemplação transcendental... pelo menos até onde o nevoeiro deixava contemplar!
Aquele foi o momento de tentar perceber a vida nas Minas dos Carris na década de 50 do Século XX. Para nós, para mim ali naquele momento, estava a certeza de que dali a algumas horas estaria no conforto do lar após uma caminhada. Tentar entender o que seria a vida dos habitantes de Carris, o que na realidade me levou a lá ir neste dia, era um exercício difícil. Difícil porque não tinha presente a ideia de que o meu único conforto seria uma camarata talvez húmida compartilhada com umas dezenas de homens sabendo que para a próxima refeição teria de deixar o conforto relativo do dormitório e caminhar por entre a neve e o gelo, talvez através do vento cortante, para entrar numa cantina onde uma refeição tépida me esperaria. Isto, dia após dia por entre um Inverno rigoroso no topo serrano. Não consigo imaginar qual seria a sensação de viver assim, saber que teria de entrar naquela mina escura, trabalhar pesado horas a fio e depois voltar para o conforto da camarata, cansado, exausto... ter de sair para o frio, por entre a neve e o gelo para a próxima refeição. Naquele momento, ali, só... por entre o silêncio e o nevoeiro...
Dirigimo-nos então para a represa e por entre uma e outra fotografia, um e outro plano, começou a nevar. Ao princípio somente uns ténues flocos de neve que de repente se transformaram num surpreendente nevão como há muito não via. Não havendo vento, o cenário era perfeito. São raros estes momentos em que tudo se parece conjugar para nos proporcionar algo de único e inesquecível. Teria de ser neste dia, naquela hora naquele momento... naquele lugar. Não são momentos para quem quer, são momentos para quem merece...
A represa dos Carris estava completamente gelada e certamente que daria para caminhar nas suas margens, mas o seguro morreu de velho e basta bater com o bastão no gelo para o comprovar... "dá para caminhar, sim".
E foi chegada a hora de regressar. Com a neve a cair intensamente não podíamos sair dos Carris assim, sem olhar para trás. Foi a ânsia de olhar para todos os cenários, tudo ver e abarcar. Por momentos, o desejo de ali ficar... perpetuar o momento. Quase desejar ter uma tenda e ficar ali a noite, sabendo que lá fora a neve caía. Suportar o frio que parecia já não se fazer sentir... perpetuar o momento. Foi então chegada a hora de regressar e pelo caminho encontrar um cenário bem diferente já com menos neve. O resto da descida já todos nós a conhecemos...
Ficam algumas fotografias...
Fotografias: © Rui C. Barbosa / José Moreira
1 comentário:
hehehe... tive para ir ai no dia 15... alias passei pelo geres mas nao deu para subir nao tive tempo...
Nunca fui as minas mas quero ver se vou
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