domingo, 8 de dezembro de 2024

Os trabalhos dos Serviços Florestais na Serra do Gerês em 1911-1912

 


Os trabalhos dos Serviços Florestais na Serra do Gerês em 1911 - 1912 ficaram marcados pela construção de uma obra que seria importante não só para os seus trabalhos de reflorestação, mas também para os residentes locais.

A fotografia em cima mostra a vacaria que seria destruída por um incêndio em Agosto de 1919.

O ponto de passagem do Rio Gerês na Assureira era já um dos mais frequentados pelos lavradores do Vilar da Veiga e da estância termal que possuíam campos agrícolas na margem direita, sendo igualmente de grande importância para a Mata do Gerês, que daquele lado possuía todo o resto da encosta povoado de pinhal e outras árvores.

Tornava-se assim necessária a construção de uma ponte que garantisse a ligação entre as duas margens quando o Inverno não permitisse fazê-lo, tal como acontecia de forma frequente, beneficiando assim as populações, ao mesmo tempo que a Mata, o que levou a Repartição Florestal do Gerês a insistir junto das instâncias superiores para se tal obra se fizesse.

Após solicitação por parte do Silvicultor Chefe, João Maria Cerqueira Machado, surgiu a autorização para a concretização de um projecto por este idealizado, dando-se começo aos trabalhos no rio em Setembro de 1911, ao mesmo tempo que se preparavam as coisas para se fazer um ramal de ligação da estrada de Braga ao Gerês com a ponte em construção.

Em resultado deste projecto, os Serviços Florestais procederam à compra de oliveiras a diversas pessoas e à expropriação de uma faixa de terreno pertencente a José Fento, para o qual se lavrou o texto a seguir:

"Termo de transacção amigável entre o Estado, representado pelo Regente Silvícola Tude Martins de Sousa, como delegado do Silvicultor Chefa da Repartição da Arborização das serras, autorizada pelo despacho de Ex.mo Ministro do Fomento, de 11 de Abril, que aprovou os projectos da Ponte sobre o Rio Gerês, na Assureira, e do caminho de ligação da mesma Ponte com a estrada Nacional de Braga, e José Fento.

Aos 10 dias do mês de Maio de 1912, na Secretaria dos Serviços Florestais do Gerês, achando-se presentes por um lado o Regente Silvícola Tude Martins de Sousa, representando o Estado, e por outro José Fento, solteiro de Vilar da Veiga, como proprietário de terrenos cortados pelo caminho florestal de ligação da Ponte sobre o rio, na Assureira, com a estrada de Braga, e as testemunhas adiante nomeadas, perante estas, foi pelos respectivos outorgantes declarado o seguinte: - 1.º que José Fento é senhor e possuidor de uma faixa de terreno de seiscentos e vinte e dois metros e noventa e seis decímetros quadrados, cortada para a construção do caminho florestal da Ponteb à estrada nacional de Braga, na Assureira, em propriedades suas que ali possuí, entre os perfis n.º 0 a 10 do projecto aprovado por despacho do Ex.mo Ministro do Fomento, de 11 de Abril passado; - 2.º que nos termos do art. 42.º, do decreto de 24 de Dezembro de 1901, que organizou os Serviços Florestais, a Direcção Geral da Agricultura resolveu expropriar o referido terreno, pela quantia de 30$000 reais, recebendo ainda o mesmo José Fento todo o terreno contíguo ao seu prédio e que fica à esquerda do caminho agora aberto, vindo da Ponte para a estrada, menos o terreno agora ocupado por oliveiras, junto da derivação da estrada de Braga, servindo por isso o dito caminho de extrema de demarcação com o referido prédio; - 3.º que o Estado não plantará árvores na parte marginal do caminho ocupado pelas rampas dos aterros, para lhe não ensombrar o seu terreno; - 4.º que este contrato só se tornará definitivo depois de aprovação superior, devendo nessa ocasião o interessado receber a dita quantia e tornar efectiva a posse do terreno que lhe é dado em troca, do que passará para todos os efeitos a devida quitação; - 5.º que José Fento, aceitando a referida expropriação se compromete a fazer boa esta transacção por sua pessoa e bens havidos e por haver, de forma em tempo algum possa ser exigida ao Estado qualquer outra quantia ou indemnização com o fundamento ou pretexto da presente expropriação; - 6.º não leva selo, por não ser devido em vista da isenção estabelecida na verba número 127 da Tabela Geral do Imposto de Selo em vigor.

(aa.) Tude Martins de Sousa. - José Fento. - Testemunhas: Álvaro José Ribeiro. - Serafim dos Anjos e Silva."

Não ficou concluída a ponte neste ano económico, pouco restando, porém, por acabar; pena foi que obra tão importante e de tão grande utilidade viesse a ter o triste fim que teve, pois foi arrastada pelo rio numa grande cheia, na madrugada do dia 1 de Outubro de 1912.

O pegão do centro, não tendo a base profunda e firme que precisava, foi escavado e arrancado pela corrente, que com ele levou o tabuleiro e as fortes vigas de ferro em que assentava.

Em Fevereiro de 1912 houve por todo o país fortes temporais, que em diversas partes causaram estragos consideráveis. Tendo sido ordenado que se informasse sobre os efeitos destas tempestades do Gerês, foi enviado para as instâncias superiores a tal respeito as notas seguintes:

"Olhando o longo período de chuvas do Inverno corrente, tem de assinalar-se como de mais intenso e persistente o mês de Fevereiro, em que as suas consequências de desastres e prejuízos de várias ordens se multiplicaram fartamente.

Apesar disso, o Gerês, agora, como em Dezembro de 1909, não tem a lamentar nenhum acidente, por menos que seja, nem na montanha, nem nos vales, sentindo-se apenas dos graves atrasos a que as chuvas obrigam nos trabalhos dos campos que é mistér ir realizando, inconveniente este que tem sido também na mata do Estado o que mais se tem produzido, por não permitir realizar convenientemente e com regularidade os trabalhos de plantações, sementeiras e viveiros, os mais importantes da época.

As ravinas, muito arborizadas, e as encostas, vestidas também em grande parte por arvoredo espontâneo ou pelos trabalhos de arborização do Estado, não permitem já hoje, quer na bacia do Homem, quer na do rio Gerês, o arrastamento brusco de terras e d epedras, pelo que o escoamento das águas se faz com certa regularidade.

Nem no perímetro do Estado, nem das suas vizinhanças, me conste que se tivesse produzido algum desastre e mesmo na estrada do Gerês até Braga não se deu, ao contrário do que aconteceu em 1909, nenhum desabamento, obstruindo o caminho com terras, calhaus e árvores.

Parece que este ano os grandes temporais se produziram mais no Sul do que no Norte, pois que, se em 1909 foi o Douro que mais se desmandou, no Inverno corrente foi o Tejo quem maior contingente deu para os desastres.

Comparando as observações meteorológicas do Posto do Gerês, de Dezembro de 1909 e Fevereiro de 1912, vemos que naquele ano se chegaram a registar 50-59 e 64 milímetros de chuva nos dias 17-19 e 20, ao passo que o máximo do mês de Fevereiro passado foi de 44 milímetros, número igual ao do dia 23 de Dezembro de 1909, o dos grandes desastres no Porto.

Apesar disto, a média diária de Fevereiro de 1912, de 17,2 mm para um total de chuva de 500,3 mm é mais elevada do que a diária de 1909, que foi de 14,6 mm para um total de 455 mm, o que mostra que cá no Norte se devem interpretar aqueles números, filiando as inundações de 1909 na maneira brutal como a chuva se precipitou durante 3 ou 4 dias apenas, ao passo que este ano, em Fevereiro, chovendo mais, a chuva foi mais dividida por maior número de dias.

Relativamente ao volume máximo que as águas atingiram nos rios Gerês e Homem, medidas as alturas dos mesmos pontos onde foram tomadas em 1909, foi respectivamente, de 1,40 m, e 2,70 m, tendo sido naquele ano de 1,85 m e 4 m, como se pode ver na notícia que então organizei e foi remetida pelo Ex-mo Silvicultor Chefe à Ex.ma Direcção Geral em Fevereiro de 1910.

(...)"

Este ano viu a realização de limpezas em povoamento de arvoredo espontâneo e em pinhais que as necessitavam (Escuredo, Leonte, Albergaria, Cagademos e Palheiros). Pela 2.ª Secção continou-se a abertura do caminho do Curral de Vidoeiro à Pedra Bela; deu-se começo à construção de uma ponte sobre o rio na Assureira; concluiu-se a construção da vacaria e da montureira e construiram-se quatro pequenas pocilgas.

Foi para a segunda prestação anual dos campos de Vidoeiro e Palas, expropriadas no ano anterior, e expropriaram-se oito oliveiras e duas pequenas faixas de terreno para se melhorar o caminho de derivação da estrada nacional de Braga à ponte da Assureira.

Neste ano tiveram lugar várias sementeiras no perímetro florestal do Gerês. Na encosta Nascente, por baixo da Pedra Bela até à extrema Sul de Porcas, realizou-se uma sementeira numa área de 46,50 hectares, realizando-se outra de 6,50 hectares em Secelo, a Norte do Rio da Figueira, fazendo-se ainda uma pequena ressementeira em falhas na Galeana.

Com a primeira fechou-se a grande faixa até meia encosta, começada a povoar em 1907-1908, partindo do Rio da Figueira para o Sul. Neste período, semeara-se da Figueira até à ravina do Pisco, e do Curral de Vidoeiro até ao Azeral; em 1908-1909 continuara-se do Azeral até Fecha Ferreiros; em 1910-1911 continuou-se em 36,50 hectares esta sementeira e em 1911-1912, ligando com a anterior, fez-se a sementeira até à extrema.

Tenco começado em Agosto de 1907 a construção do caminho florestal do Curral de Vidoeiro à Pedra Bela, as sementeiras foram sempre acompanhando aquele trabalho e realizando-se sempre por baixo do ito caminho, que desta maneira se ia utilizando para facilitar os serviços e ficaria no futuro como uma grande linha de divisão de povoamentos, como arrife de defesa contra incêndios e como meio de acesso fácil a toda a encosta.

Em Secelo semearam-se 200 kg de penisco, sem 100 kg en continuação da plantação do ano anterior, como afirmação de direitos para ocupar terrenos que um particular pretendia usurpar, e outros 100 kg numa faixa, acompanhando exteriormente a dita plantação, pelo lado do Nascente, onde ficará aberta uma passagem para as cabras, para assim, sacrificando um pouco os pinheiros, se defenderem melhor as árvores da plantação anterior e a deste mesmo ano.

Em relação aos viveiros florestais existentes, cuidou-se deles por forma a que, tendo fornecido 57.062 plantas para a serra, existiam neles no fim do ano económico 63.891 árvores de diversas idades, além de muitas sementeiras para futuro. Forneceram-se ainda 10.000 Quercus pedunculata para a Serra da Estrela, e 2.250 plantas para a Mata do Bom Jesus, de Braga, e 1.500 para a Câmara Municipal de Montalegre.

Na encosta de Secelo faz-se, como experiência, uma pequena sementeira directa de 2,5 kg de Pinus sylvestris e 5 kg de Pinus laricio da Córsega.

A plantação do Escuredo foi feita na sravinas; a de Fecha Ferreiros na encosta da margem esquerda; as acácias dos campos de Vidoeiro no aterro da estrada, a partir da margem direita da Quelha Verde e as restantes quase todas nos terrenos da margem esquerda e pouca na direita. A plantação de Secelo foi no terreno ao Norte do Rio da Figueira.

As árvores plantadas nos campos de Vidoeiro eram já destinadasa a um pequeno parque, que se traçou ligeiramente para que de futuro se melhorar e em que as ruas dividam o terreno em talhões diversos.

Em 14 de Março de 1912 deixou de superintender nos serviços do Gerês o silvicultor João Maria Cerqueira Machado, passando a chefia da arborização das serras ao silvicultor Luís Maria de Melo e Sabbo.

Em Novembro de 1911 foi plantado no jardim da Repartição, ao fundo, no canto à direita quando se sobre, junto da rampa do caminho velho, um abies excelsa e no terreno perto da fossa, sob os carvalhos, algumas fagus sylvatica.


Plantações

Escuredo

- Acer pseudo-platanus..............652

Encosta da Pereira

- Eucalyptus amigdalina............4

- Eucalyptus colossea................5

- Eucalyptus coriacea................3

- Eucalyptus gigantea................6

- Eucalyptus globulus................103

- Eucalyptus marginata..............5

- Eucalyptus rostrata..................4

- Pinus laricio Corsica...............2650

- Pinus sylvestris........................40 (TOTAL 2820)

Fecha Ferreiros

- Acacia melanoxilon.................5760

Campos do Vidoeiro (Quelha Verde)

- Acacia melanoxilon.................800

- Fagus sylvatica........................1600

- Fraxinus americana alba..........205

- Abies excelsa............................588

- Taxodium distichum.................157 (TOTAL 3430)

Secelo

- Acer pseudo-platanus...............100

- Fraxinus americana alba...........50

- Quercus pedunculata.................850

- Cedris atlantica argentea...........1750

- Cedrus Libani............................950

- Fagus sylvatica.........................1830

- Pinus laricio Corsica................40500 (TOTAL 44200 - TOTAL de PLANTAÇÔES 57062)

Texto adaptado de "Mata do Gerês - Subsídios para uma Monografia Florestal" (Tude Martins de Sousa, 1926)

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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