terça-feira, 2 de julho de 2024

Trilhos seculares - De Pala Freita aos Bicos Altos, Amarela e Borrageiro, uma jornada pela Serra do Gerês

 


Regresso ao Curral dos Bicos Altos e ao Curral da Amarela num esplendoroso dia de Verão e dias após ter caminhado por parte dos carreiros da Vezeira de Fafião. A passagem entre a Amarela e o Estreito, fez-me relembrar a imensidão das paisagens percorridas.

Comecei o dia de caminhada no cruzamento de Pala Freita junto do Miradouro das Rocas e segui pela estrada florestal, passando a Ponto do Arado e seguindo para o estacionamento do Arado (Barracão) que estava ainda deserto. A alma apontava na direcção da Malhadoura e Curral dos Portos, passando a seguir pela refrescante tranquilidade da Tribela e descendo para a Ponte de Servas.






Entrando-se nos domínios de Fafião, subia-se então para Pinhô com o seu característico forno pastoril e tomava-se o carreiro que levaria às bordas de Pousada em direcção aos magnânimos Bicos Altos. Paisagem de criação épica como somente a Natureza no seu caos a poderia criar num cenário quase entrópico, mas que se vai modificando com o passar das épocas geológicas. São fragas vertiginosas, rochedos alcantilados, prados verdejantes e ondulantes na mercê da brisa que tacteando as ondulações do granito. É um silêncio que se espalha e entranha na alma, uma soberba tranquilidade.

Depois da beber a refrescante água que brota da fonte junto da cabana de Bicos Altos, o caminho leva a alturas mais agrestes. Virando a volta da serrania, como que se entra num domínio mitológico, e o Gerês alonga-se por quase todo o horizonte!






Em tempos escrevi que "... ninguém diga conhecer a Serra do Gerês sem antes visitar os domínios de Fafião. Ali, onde o Gerês flecte os seus músculos, onde a serra arranha os céus, as sombras pedem licença para se retirar e o Sol tem orgulho em iluminar e aquecer aquelas paragens. Os domínios da vezeira de Fafião apresentam-nos das paisagens mais deslumbrantes de todo o Parque Nacional, e da Serra do Gerês em particular, rivalizando com outras que são, por excelência, verdadeiros ex-líbris para quem as visita com regularidade." Não tiro uma palavra ao que então escrevi e só lhe posso juntar adjectivos de admiração e estarrecimento!

O objectivo desta jornada passava por reconhecer umas mariolas perdidas pelas penedias que havia seguido há já demasiados anos para contar. Sabia que as iria encontrar depois do Curral da Amarela já a caminho do Estreito e ali voltava para tentar saber a onde me teria levado naqueles anos há muitos escondidos nos velhos calendários.






O Curral da Amarela é a antecâmara de acesso à Sesta da Amarela. Verdadeira varanda sobranceira à vastidão sobre o Porto da Laje e o Curral da Touça, a Sesta da Amarela é um verdadeiro altar de consagração da Serra do Gerês aos deuses de outrora, os que trazem o verdadeiro significado à existência. Ali, vemos a Natureza no seu esplendor; o nosso olhar está absorvido numa sempre presente contemplação que não é transcendental, mas que nos transcende na sua grandeza. Dali vê-se o resto mundo!

Chegado ao Curral da Amarela, tive a felicidade de ali encontrar dois vezeireiros de Fafião que guardavam as dezenas de cabeças de gado que ali se alimentavam. Oportunidade perfeita para diluir as dúvidas sobre o tal carreiro de procurava reencontrar... "Oh amigo! Por ali já não passo há mais de 30 anos... as mariolas talvez ainda lá estejam, mas o caminho já se foi há muito!..." Despedindo-me dos homens, prossegui então o meu caminho e a verdade é que, ao passar no local onde poderia ter visto as tais mariolas, elas já lá não estavam ou então estavam escondidas por truques de luz e sombras.






As grandes extensões de granito antecipam a chegada ao Estreito caminhando por um carreiro marcado por tímidas mariolas que se vão perdendo na imensidão da memória. Do Estreito sigo então para o Curral de Vidoeirinho para abastecer de água, mas a fonte estava fraca. Encontraria água na FOnte do Curral de Rocalva onde descansaria antes da caminhada até ao Borrageiro passando pela Chã de Roca Negra.

O Borrageiro seria o ponto do repasto, saudando-me com a grandeza de um horizonte longínquo que se alargava para lá das serranias da Peneda e chegava à silhueta do deus Larouco. Com uma agradável brisa, foi o local ideal para o descanso naquele dia.

A parte final da jornada levar-me-ia à Fonte da Borrageirinha, seguindo-se a descida para o Colo da Preza através do Enfragadouro e posterior passagem pelo Curral do Junco. Depois, segui para o Camalhão através da Garganta da Preza e passava o Rio do Camalhão para caminhar ao longo da Encosta da Boca do Suero, seguindo para o Curral da Lomba do Vidoeiro e Curral da Carvalha das Éguas. Os últimos quilómetros foram feitos pelo traçado da Grande Rota da Peneda-Gerês, regressando ao cruzamento de Pala Freita já em pleno burburinho estival...








Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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