sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Portaria 1245/2009

Uma leitura mais atenta da já famosa Portaria 1245/2009 que regulamenta as taxas a cobrar pelo Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB), I.P., revela todo o seu esplendor e a forma como foi pensada, e como querem que seja executada.

Esta é uma portaria que 'corta a direito' aplicando-se a "...todas as pessoas públicas ou privadas, singulares ou colectivas, independentemente da forma jurídica que revistam, que solicitem ao ICNB, I.P., a prática dos actos e serviços constantes da tabela..." que lhe é anexa.

Assim, um instituto público financiado pelo Estado, isto é, pelos impostos que todos nós pagamos, irá cobrar os seus actos e serviços que por inerência da sua actividade deve levar a cabo.

Para muitos que possam achar as ridículas reivindicações daquelas pessoas que todas as semanas percorrem as nossas montanhas, e em especial aquelas que se encontram dentro das áreas protegidas, peço que façam um pequeno exercício. Imagine-se um pai de família que decide ir passar um fim-de-semana ao Parque Nacional da Peneda-Gerês. Assim sendo, e por ser um cidadão exemplar e achar que deve solicitar ao ICNB, I.P., a respectiva autorização para percorrer aquele espaço público classificado, envia o respectivo pedido de autorização. Note-se que esta pessoa é por si só um caso muito raro, pois teve o cuidado de pedir a autorização.

Antes de avançar neste exercício, deixam-me citar um parágrafo importante desta portaria. O Ponto 1 do Artigo 6º referente ao pagamento das taxas refere que: "As taxas devidas pelos actos e serviços prestados pelo ICNB, I.P., são pagas no momento da apresentação do pedido." Quem teve este ideia deve ser brilhante, pois a pré-cobrança por si só não garante a autorização. Por não referir nada a este respeito, a não autorização implica a perda automática da taxa pois esta serve para cobrar o serviço e não para obter a autorização.

Assim, o nosso pai de família vai pagar o serviço no qual será analisado o seu pedido. Por sua infelicidade, o pai de família pediu uma autorização para percorrer o Vale do Alto Homem até às Minas dos Carris, coisa que toda a gente faz. Porém, e ao abrigo do actual Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Peneda-Gerês, o estradão que liga a ponte sobre o Rio Homem em S. Miguel e as Minas dos Carris, atravessa uma parte da denominada Zona de Protecção Total (ZPT) e como tal não pode ser autorizado o passeio que o pai de família gostava de fazer. Não referi, mas este pai havia pago 200,00€ para que o seu pedido fosse analisado para poder ter a autorização para o seu passeio. Cá entre nós, espero que o pai de família tenha desistido de fazer um passeio por uma zona não sinalizada, pois teria de pagar mais 200,00€ por nova análise.

Por outro lado, nesta altura estou a olhar só para o meu umbigo. Por momentos vou tentar colocar-me na pele de alguém que mora dentro de uma área protegida... mais uma vez dentro do PNPG. Penso que devem saber que a apanha de ramos, pinhas e árvores caídas não é permitida por poder influenciar negativamente o desenvolvimento do meio local. No entanto em minha cada ainda tenho um fogão a lenha. Olhando pela janela de minha casa venho uma encosta na qual florescem muitas árvores (pinheiros, sobreiros, etc.). No solo existem muitas ramadas caídas, além de pinhas e outros produtos. Porém, antes de sair e decidir apanhar esta vegetação caída decido pedir ao ICNB, I.P., a autorização para que possa então proceder à recolha dessa vegetação caída. Notem que as declarações, pareceres, informações (!!!) e autorizações para "...qualquer forma de exploração de recursos naturais ou da floresta, agricultura, pecuária, aquicultura, piscicultura, pesca ou de instalação de explorações ou de viveiros agro-pecuários, silvopastoris, aquicultura ou piscicultura..." é taxada com um valor entre os 1.000€ e os 5.000€. Convém pensar bem antes de ir ás pinhas!!!

São dois dos vários exemplos que se podem dar para exemplificar a profunda injustiça desta portaria que é injusta em primeiro lugar com as populações das áreas protegidas e em segundo lugar com as pessoas que tiram partido dessas áreas protegidas e quando relacionadas com actividades de lazer sem fins lucrativos.

Não é compreensível o timming desta portaria para a discussão do POPNPG e numa fase em que o futuro do nosso único parque nacional está em discussão pública.

Também não é compreensível como se pode taxar serviços que são da competência do ICNB, I.P.. Uma explicação pode estar no seguinte exemplo: actualmente a frota de viaturas do PNPG está na sua maioria parada porque não existem verbas para se proceder a uma simples mudança de óleo, colocação de novos calços de travões ou para fazer uma simples revisão automóvel. O PNPG não tem dinheiro para fazer estas coisas tão simples e o mesmo deve ocorrer com a gestão das restantes áreas protegidas nacionais, compreendendo-se assim a necessidade desta portaria e de arranjar dinheiro a qualquer... preço.

Fazendo eco do que já foi referido noutros blogues e em outros sítios da Internet, acho que é chegada a hora de todos nos juntarmos. Faço desde já um apelo para uma presença em massa na discussão pública do POPNPG que terá lugar no dia 18 de Novembro nas Caldas do Gerês para sabermos que futuro espera o parque nacional e para depois tomarmos uma posição e decidirmos as acções a tomar para que esta portaria seja alterada ou simplesmente revogada.

Fotografia © Rui C. Barbosa

3 comentários:

Zé Moreira disse...

Lá estarei! Só espero (tenho receios, como sabes!)que sejamos muitos. A quantidade intimida os políticos!!! porque, sensibilidade, aqui não há...
Negócio? Isso sim!
Um abraço

Jorge Nogueira disse...

Olá Rui,

Esta é uma medida que me preocupa e deixa apreensivo.

200€, para o ordenado médio dos Portugueses, é um autêntico roubo! O vencimento do Sr Director e de que legisla já é pago com os nossos impostos.
Pagar por um parecer??? Com estas medidas estão a empurrar-nos para onde? Vizinha Espanha e França??? Serão eles a ganhar com estas fracas medidas portuguesas.
Concordo em absoluto com o Rui quando no Barroso Digital apela a uma manifestação.
Abraço

RotasdoBarroso disse...

Eu também vou estar presente .. Quero ver como correm as coisas ai. Já que se forem apertados como o foram em Montalegre..
Poderemos de ter alguma hipótese de ver essa portaria revogada.

Apelo a todos para comparecerem nas caldas do Geres dia 18 pelas 18horas..
Ate Quarta-feira dia 18.
Cumprimentos
Miguel Moura