quinta-feira, 27 de julho de 2023

Trilho lá fora - Picos de Europa (Depois do Jou Sin Tierre, o regresso a Sotres)

 


E chegava a noite para ser passada no refúgio. À medida que o dia definhava e a paisagem se transformava com os tons do Sol pôr, o cansaço ia-se instalando e o corpo desejava a tranquilidade do sossego e do silêncio retemperador da montanha.

O refúgio estaria, aparentemente esgotado, porém, na camarata apenas três pessoas descansavam. Com a luz a tornar-se mais ténue e as sombras a esbaterem-se num negro profundo pelos recantos mais escondidos do quarto e da montanha, as luzes e os sons iam-se apagando, e lentamente mergulhava num limbo entre a realidade que me rodeava e um sono hipnótico... até que aquela figura entrou no quarto!

Meio estremunhado, senti-o a preparar o saco-cama e logo a seguir ter-se-á feito uma réstia de silêncio... o último que escutaria até aos primeiros raios de Sol. Não consigo compreender como alguém, que há partida tem consciência que poderá ser um incómodo para os outros, nunca toma medidas sérias para evitar ou diminuir a sua apneia barulhenta. Foi uma noite em claro com breves passagens por uma dormência embalada pelo vento que a certa altura fintava as frinchas da janela. Estas situações e acima de tudo a falta de descanso, levam-me a um estado de cansaço e irritação extremo, por entre insultos e protestos que tinham efeitos por alguns segundos apenas. Evitando uma guerra Ibérica, tive a sorte de os meus bastões de caminhada e as botas estarem arrumadas no cacifo, ou a coisa teria um rumo mais «violento». Nesta situação, nem uns bons tampões para os ouvidos me teriam valido!


As horas decorreram e chegara a hora do despertar para uma jornada que seria dura. Sabia que seria difícil, pois eu era o rosto e a figura de uma noite mal passada. Para este dia tínhamos previsto cruzar ao largo o Jou Sin Tierre e chegar a Cabaña Verónica subindo os Urrielles, pois os cabos que permitiam a subida para Horcados Rojos já há muito haviam sido removidos.

A caminhada não passou da imensidão e do deserto de Jou Sin Tierre, pois um cansaço extremo que me faziam não ter o discernimento suficiente para avaliar em segurança qualquer situação que pudesse surgir, levaram-me a tomar a decisão de voltar para trás e iniciar o longo regresso a Sotres passando pela Terenosa.

A montanha estará lá para uma próxima tentativa.












Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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