domingo, 11 de abril de 2010

Discursos (II)

Discurso do Secretário de Estado da Agricultura Eng. Vasco Leónidas, a quando da inauguração do Parque Nacional da Peneda-Gerês a 11 de Outubro de 1970. Mais um texto que merece uma leitura atenta...

"A inauguração a que V. Ex.ª, Sr. Presidente, acaba de proceder reveste-se da maior importância nacional e inscreve-se nos anseios manifestados em todo o Mundo por governantes, cientistas e técnicos, no sentido de se dar a maior atenção à Protecção da Natureza e dos seus recursos.

Na realidade, Sr. Presidente, a alteração do ambiente natural tem-se ultimamente processado de modo a chamar a atenção para os males que o próprio processo técnico, no decorrer das gerações, acumulou ao desenvolver-se sem respeito pela natureza, e sem atender a todos os factores, que, numa região ou país, e mesmo por todo o globo, têm de ser olhados em conjunto.

Existindo, hoje, um melhor conhecimento da interdependência de todos os elementos naturais e humanos, quer sejam estes de ordem económica, social ou cultural, não é possível, sem grave erro, pensar no desenvolvimento duma dada região, sem atentar em todos esses factores.

O crescimento industrial ou agrícola, o aumento do turismo, o progresso social e cultural, têm de ser submetidos a um planeamento que vise o ordenamento e o desenvolvimento harmónico de todas estas actividades.

A presença do venerando Chefe do Estado nesta inauguração - presença honrosa que do coração agradecemos - demonstra, mais uma vez, quanto interesse lhe merecem as grandes iniciativas nacionais e os graves problemas que afectam a própria humanidade.

O Parque Nacional da Peneda-Gerês constitui, sem dúvida, uma realização que há-de marcar uma época, revestindo-se da maior importância nacional e internacional.

Ela insere-se, ainda, na linha segura da Conservação da natureza e dos seus recursos, constitui uma fonte de atractivos turísticos e uma reserva de beleza, de tranquilidade e de paz.

Na realidade, a conservação da Natureza e dos seus recursos surge como uma necessidade vinculada à ecologia e ás ciências naturais, mas também ligada à sociologia, à economia, ao urbanismo, etc.

Ela já não interessa só, como há algumas dezenas de anos, um grupo restrito de homens, que então foram olhando como fantasistas e contemplativos, porque os supunham divorciados das realidades humanas, e de certo modo inimigos do progresso. Estes homens de boa vontade foram na verdade pioneiros de um movimento de esclarecimento e procura de solução para as ameaças que o homem tem feito desencadear sobre si mesmo e sobre a Natureza.

Este movimento dirige-se, por isso, fundamentalmente, ao homem, para que ele possa viver num ambiente são e propício ao seu bem-estar física e mental.

Quando se interessa por determinada espécie vegetal ou animal em perigo de extinção, quando pretende que uma associação de plantas ou comunidade de seres vivos não seja alterada, quando combate para que a beleza da paisagem não seja desfigurada, quando se opõe ao desenvolvimento anárquico de construções e outras obras, quando pretende eliminar ou pelo menos diminuir a maléfica poluição do ar, da água e do solo, o fulcro da sua acção é ainda o homem.

Se podemos dizer que a opinião pública é hoje mais favorável aos princípios da Conservação da Natureza, teremos de reconhecer haver necessidade de uma acção persistente neste sentido. Devemos, de facto, lutar contra a deformação profissional de muitos técnicos, que frequentemente vêm apenas os aspectos parcelares das actividades a que estão ligados, opor o interesse geral aos interesses económicos particulares, que muitas vezes olham só aos próprios lucros imediatos, efectuar os estudos ecológicos e económicos necessários ao bom conhecimento destes problemas e ainda promulgar legislação adequada zelando interessadamente pela sua execução.

Foi neste sentido que a Assembleia Nacional aprovou legislação que lhe havia sido submetida pelo Governo, sobre a Protecção da Natureza e dos seus recursos, relativa aos parques nacionais e outros tipos de reserva.

Em execução desse diploma, encontramo-nos hoje, volvidos poucos meses, a proceder à inauguração do primeiro Parque Nacional do Portugal Europeu.

Grande número de países do mundo têm vindo a colocar sob especial protecção as zonas que ainda não sofreram grandes alterações provocadas pelo homem, e onde é possível encontrar vestígios da vegetação natural e da fauna primitiva, em condições de razoável equilíbrio, de modo a salvá-los da extinção a que estariam condenados. Aí se procura manter, para efeitos de estudo e investigação, as comunidades de seres vivos num ambiente natural. São reservas, quer integrais, quer botânicas ou zoológicas, e onde em geral a entrada só é permitida aos cientistas encarregados de estudar a sua evolução e zelar pela sua manutenção.

As zonas mais vastas, que normalmente englobam várias reservas, e onde, como regra, não é permitida a agricultura, a exploração florestal ou mineira, ou as grandes obras de engenharia civil que possam alterar o meio, constituem os Parques Nacionais.

Nestas extensas áreas a população pode encontrar o refúgio do bulício da vida moderna, no contacto com a Natureza.

Existem no mundo cerca de 1200 parques deste tipo. Alguns localizam-se nas nossas províncias africanas e gozam de reputação mundial.

Inicia-se agora a primeira fase de execução deste Parque Nacional, que abrangendo vasta zona serrana, repleta de grande beleza paisagística, possui núcleos de vegetação e espécies animais do mais elevado interesse.

Este Parque Nacional reveste-se de grande importância como elemento de valorização turística e destina-se a ter missão primordial nos destinos da conservação de recursos naturais, ao preservar a beleza da paisagem e o equilíbrio da vida animal e vegetal.

Ele constitui um primeiro passo na execução da Lei n.º 9/70, a que se seguirão outros relacionados com a criação de reservas de vários tipos para preservar, enquanto é tempo, aquelas zonas onde a acção inconsiderada do homem não conseguiu ainda destruir os valores inestimáveis da Natureza.

Seja-nos, por isso, permitido formular o voto final de que este Parque constitua uma escola e um símbolo onde se aprenda, na contemplação das suas belezas, quanto respeito deve merecer a preservação dos recursos naturais de transcendente significado para o futuro do homem e da própria civilização."

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