Esta teria sido mais uma caminhada às Minas dos Carris como tantas outras nos meses e anos anteriores, mas este dia guardava uma surpresa por entre as ruínas do velho complexo mineiro.
A subida fez-se ao longo do Vale do Alto Homem. O dia frio e com algumas nuvens, trazia o receio de alguma chuva que acabaria por não se concretizar. No entanto, o cenário era quase de Inverno e a desejar a neve, e aqui e ali o gelo ia-se formando (ou derretendo), anunciando que os meses mais frios ainda estavam para chegar.
Como é «normal», ao longo do caminho, um avistamento ou outro das cabras selvagens ia dando a nota certa ao dia. Chegado ao princípio da Corga da Carvoeirinha, decidi abandonar o caminho mineiro e rumar directo ao Marco F que domina o pequeno vale e nos dá uma boa perspectiva para parte da Lamalonga. Navegando por entre os homens de granito, o olhar ia sempre perscrutando o chão em busca de memórias esquecidas ou abandonadas, porém, por estes dias, é já difícil encontrar seja o que for que nos diga algo daqueles tempos passados.
A chegada ao marco triangulado faz-se sempre problemas e é sempre satisfatório ver paisagens conhecidas com outras perspectivas. Daqui, e após contemplar por alguns minutos os jogos de luz que se formavam por entre as sombras que passeavam pelas encostas das montanhas, rumei então para as ruínas. Passando por velhos abrigos utilizados pelos primeiros mineiros, contrabandistas ou carvoeiros, ia-me aproximando do belo cenário que estava perante mim; as ruínas enquadravam o Pico da Nevosa sobre o qual passeavam escuras nuvens carregadas de tons plumbeos. Ali, uma máquina fotográfica faria as delícias dos fotógrafos de montanha num crescendo de excitação de disparos fotográficos.
Deixando para trás os pequenos abrigos, ainda mais ou menos compostos, e à medida que as ruínas ganhavam volume, a atenção do olhar foi captada por um rebanho de cabras-montesas que se alimentava tranquila e despreocupadamente nas imediações. Por outro lado, um intenso grasnar de um bando de corvos componha um cenário de montanha perfeito. Fiquei ali, parado por longos minutos, a tirar o máximo partido daqueles momentos únicas e raros. As cabras - pequenas crias, fêmeas e grandes machos - deambulavam calmamente numa visão que me levava por entre as ruínas ou equilibradas e sentadas no Penedo da Saudade. Os corvos ora saltitavam na erva, ora esvoaçavam ruidosamente, assustando as cabras que fugiam em breves correrias rápidas.
Aproximava-me lentamente, tentando evitar a todo o custo fazer qualquer ruído que lhes fosse estranho, e por entre tentativas mais ou menos bem sucedidas, cheguei a uns escassos 10 ou 15 metros de um rebanho que se alimentavam junto das ruínas da velha oficina. De novo, e tentando não fazer movimentos bruscos ou ruídos, ali fiquei, sereno, mas já sendo notado. O grupo acabaria por se deslocar, parte para um lado, parte para a segurança das penedias por detrás da velha cozinha, proporcionando a oportunidade para uns bons enquadramentos.
Satisfeito com as fotografias, segui então para a zona do Posto Meteorológico e ali parei, finalmente, retemperando forças e apreciando a magnificência da montanha que se elevava perante mim.
Após o merecido descanso, rumei na direcção de um pequeno «curral» acima da camarata geral, seguindo depois para o Bairro e passando por velhos edifícios que já não visitava há algum tempo. Foi então que surgiu a visão de dezenas e dezenas de animais, uma enorme concentração de cabras-montesas que ocupavam as ruas desertas do complexo mineiro e pastagem pelo Curral dos Carris. Toda aquela zona estava repleta de animais num verdadeiro espectáculo de vida selvagem do nosso Parque Nacional. Já terei visto milhares e milhares de cabras-montesas em inúmeros cenários e já tive a oportunidade de observar grandes rebanhos em movimento, mas jamais havia presenciado um tão elevado número de animais numa área tão pequena. Admito que o seu número ultrapassava a centena e meia de indivíduos, entre novos e velhos, machos, fêmeas e crias, machos jovens e machos velhos, num cenário único em Portugal e que assim deve ser mantido longe da ganância voraz dos caçadores.
Mais uma vez, ali fiquei, imóvel e silencioso, com os animais a escassos metros de mim, numa profunda contemplação daqueles momentos e absorvendo todos os movimentos, sons e relações que iam decorrendo naquele lugar.
Após mais uma verdadeira orgia de momentos fotográficos, iniciei o regresso com a certeza de ter sido contemplado com momentos únicos nas minhas inúmeras visitas às Minas dos Carris.
Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
Sem comentários:
Enviar um comentário