Num concelho onde por razões fúteis se abatem árvores protegidas, fica aqui este texto de António Cunha sobre a situação actual do Parque Nacional da Peneda-Gerês. O texto original é apresentado aqui.
Este verão assistiu-se a um aumento significativo de visitantes do PNPG, em particular na área do concelho de Terras de Bouro, o que é, obviamente, positivo para a economia local, mas que traz consigo um conjunto de problemas inerentes ao aumento da pressão humana em áreas protegidas. Importa, pois, que mais que um debate sobre os problemas, haja uma ação efetiva com implementação de medidas concretas, de modo a minimizá-los em próximos anos. Os principais problemas, há muito identificados, são, essencialmente: O trânsito; o estacionamento caótico; o lixo; o desrespeito pelas regras de segurança e pelo dever de proteger, cuidar e preservar a natureza. A estes, acresce um outro com enorme gravidade: Incêndios que todos os anos vão destruindo áreas significativas do parque.
De entre as várias medidas que podem contribuir para minimizar estas situações, uma julgo ser consensual: Aumentar a vigilância. É fundamental uma presença mais efetiva de vigilantes da natureza, para exercer a sua função de vigilância, fiscalização e monitorização dos valores naturais que as áreas classificadas encerram, e também pela função pedagógica e informativa que podem desempenhar.
É notório que o PNPG não dispõe de meios humanos suficientes para cumprir estas funções, de tal modo que, neste verão, as portagens na Mata da Albergaria, apenas funcionaram durante os fins de semana.
Por esta altura, e porque esses problemas se tornam mediáticos, assistimos ao surgimento, na comunicação social, de ministros, secretários de estado e outros responsáveis, para mostrarem a sua “preocupação” e anunciar medidas, que todos sabemos, ficarão esquecidas até ao verão seguinte.
Assim, em plena crise dos incêndios no PNPG, em particular nas serras da Peneda e do Soajo, o Ministro do Ambiente veio anunciar que o PNPG iria ter “rosto” e mais meios. Passadas duas semanas, é anunciada a contratação de 20 vigilantes da natureza, que aumentarão o efetivo dos 119 existentes para a fiscalização e defesa das áreas protegidas que representam 700 mil de um total de dois milhões de hectares incluídos na Rede Natura. Sublinho que esses 20 vigilantes contratados serão para todo o país. Não sei, tão pouco, se algum deles será afeto à área do PNPG, até porque, segundo notícia do Observador: “O Ministério do Ambiente admite que possam ser destacados para áreas com maiores carências, como Algarve, Alentejo e zonas marinhas.
”O Governo invoca “custo incomportável” para limitar contratação de vigilantes da natureza. A contratação dos 200 vigilantes da natureza – que segundo o ICNF, seriam necessários para todo o país – teria um custo de 4 milhões/ano. Certamente que 4 milhões por ano é um valor considerável, mas há também alguns valores consideráveis e que também deviam ser vistos como incomportáveis.
Senão vejamos:
“Cada hora de voo de um Kamov custou 35 mil euros” – Expresso (06.04.2016)
“Estado gastou cinco milhões de euros com aluguer de dois aviões Canadair” – Expresso (16.08.2016)
Só este ano, o PNPG viu cerca de 14% da sua área total ser consumida por incêndios. Qual terá sido o custo no combate a esses incêndios? Dir-me-ão que o aumento de vigilantes não iria acabar com a existência de incêndios. Certamente que não, mas podiam ajudar na prevenção ou mesmo numa resposta mais imediata e efetiva no combate aos mesmos.Existem, ainda, custos que não são mensuráveis. Não se pode quantificar o custo da destruição sistemática e contínua do único Parque Nacional e Reserva Mundial da Biosfera. É um custo? Certamente que é, do mesmo modo que é um custo a preservação do nosso património cultural. Não será, também, uma função do estado zelar pela conservação do seu património natural?
Finalmente, a contratação de vigilantes da natureza, criaria emprego no interior, cada vez mais desertificado, e poderia/deveria ser associado à recuperação das casas florestais, cujo abandono e degradação deveria envergonhar as entidades responsáveis.
O pior é que este é apenas mais um caso paradigmático de dissonância entre o discurso de preocupação com o abandono e desertificação do mundo rural do interior e as medidas efetivas, porque a implementação destas, para o poder central, têm sempre um “custo incomportável”.
António Cunha
Crónica publicada no jornal “O Amarense” de Outubro de 2016.
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