sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Insónia...

Carris, 28 de Janeiro de 2007

...o sono não chega... saio para o telhado e no frio da noite tento vislumbrar a montanha ao longe... fecho os olhos e imagino o caminhar na montanha... a última subida...

...parado junto à velha cancela que já não existe há muitos anos... lembro-me da velha fotografia e no sonho imagino-a lá... fecha parêntesis! ...passo os limites... "Quem vem lá? Quem é você?", pergunta o velho guarda que nunca conheci... sou uma sombra da noite envolto numa mortalha... as casas, velhas ruínas, permanecem lá... quase eternas mas degradadas... pela janela sai uma fraca luz batida pelo vento, frio, da noite... desaparece coberta pela escuridão que ocupa o seu lugar, já há muito que esperava pelo momento... a escuridão...

...do outro lado a velha cantina agora deserta... o cheiro a trabalho escorre pelas paredes e ensopa o chão... o ruído da electricidade desapareceu há já muito tempo, os homens foram dormir e os despojos da noite arrumam-se amanha... pelo espaço da velha porta vislumbra-se o contorno da banca partida no chão, canos esventrados... a humidade substitui o cheiro das longínquas noites...

...paredes destruídas, buracos no chão, molhos de erva e bosta... montes dela...

...a porta fecha-se depois das contas... aconchega-se o casaco pesado sobre o corpo fugindo assim ao frio e vento cortante da montanha... lá dentro da casa o calor da lareira e o corpo quente esperam... ânsia pelo seu cheiro, da carne lavada... um cheiro suave... lentamente vai percorrer as suas curvas... momentos únicos...

...o frio da mina, o sabor do metal... negro como a noite, rico como o ouro... negro, o metal... olha para cima ... aqui nunca haverão estrelas...

...inebriado pela montanha e envolto pela noite, silêncio, no meio da pequena rua e longe de tudo... miro as estrelas... o som do vento a lamber o granito... fecho os olhos neste sonho e imagino-me lá no alto pelo Pico da Nevosa, corpo nú ao vento... sentir toda a montanha... olhar do alto...

...volto ao telhado, esta maldita insónia...

Fotografia: © Rui C. Barbosa

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