domingo, 5 de janeiro de 2020

Trilhos seculares - Entre Germil e Vilarinho, uma visita à Carvalhinha


A Carvalhinha é uma elevação situada não muito longe da pequena aldeia de Germil. Encimado pelo costumeiro marco geodésico, a Carvalhinha (com os seus 1.096 metros de altitude) permite uma paisagem privilegiada para o Vale do Rio Lima e Serra do Soajo, bem como para a Serra do Gerês.

Deixando Germil, segue-se inicialmente pelos traçados do Trilho de Germil e da Grande Rota da Serra Amarela, para os deixar pouco depois e seguindo por velhas calçadas e carreiros de pé posto que se vão confundindo na encosta. Este será um dos problemas para quem não estiver atento ou equipado com uma carta militar ou traçado auxiliado por GPS.



Vencida a encosta sobranceira a Germil, a Carvalhinha será facilmente distinta pela presença do marco geodésico e a caminhada torna-se então mais fácil. As zonas por onde vamos passando vão-nos oferecendo motivos de conversa: ora serão as lajes ao alto assinalando locais improváveis, ora são os abrigos toscos em zonas curiosas. O objectivo principal da jornada era a passagem pela sempre enigmática zona das Casarotas.

Existem espaços nas montanhas que de imediato nos transportam no tempo. A impressão inicial submerge-nos num tempo abandonado por entre construções em ruínas. O mistério e o debate sobre a função destes abrigos de montanha mantém-se nos nossos dias. Citado na obra "O Gerês - De Bouro a Barroso", de Rosa Fernanda Moreira da Silva, Jorge Dias refere "(...) haver uma relação com as cabanas dos pastores e talvez fosse conduzir a uma curiosa solução, que traria também um elemento de grande interesse para a Etnografia. Poderia ser uma antiga branda dos pastores de Vilarinho. Uma branda há séculos abandonada, porque os habitantes da região descobriram uma maneira mais cómoda de aproveitar as pastagens altas, mediante uma organização colectiva, em que dois pastores substituídos diariamente por outros dois, à vez por todos os vizinhos, só precisam de passar uma noite na serra, para que lhes basta uma cabana em cada local de pernoita. Parece-me esta a hipótese mais plausível, mas, como disse, só depois de se fazerem escavações teremos talvez a solução" (in, "As Casarotas na Serra Amarela - construções megalíticas com uma inscrição" - 1946).




Assim, segundo Jorge Dias, as casarotas teriam uma função relacionada com a pastorícia na Serra Amarela. Porém, Rosa Fernanda Moreira da Silva tem outra interpretação para a função destas peculiares construções. Na página nº 90 da sua citada obra lê-se "Somos de opinião que as Casarotas foram um dos elementos da célula defensiva das Portelas que, além dessas pequenas construções incluía, pelo lado Norte, uma pequena Trincheira, com o comprimentos de algumas dezenas de metros. Estes elementos estão estrategicamente localizados numa rechã inacessível do lado nascente. Mas perfeitamente enquadrados em relação às restantes edificações defensivas do vale do Homem, ou seja, as Casas do Facho, das Peças e da Guarda. De acordo com os argumentos apresentados as Casarotas foram um dos elementos da célula defensiva da Portela da Serra Amarela. Entretanto, seria muito enriquecedora a concretização de estudos sobre esta temática que, ao alargarem a análise temporal, poderiam contribuir para o equacionar de novas teorias sobre o passado."

No seu romance "Rio Homem", André Gago relata a jornada de Rogélio Pardo e Alda até aquele local num dia de calor. Refugiando-se no interior de uma daquelas construções, os dois irão consumar um amor há muito desejado nas páginas do livro. Assim, por entre o silêncio e o vento cinematográfico que percorre aquelas alturas, podemos imaginar esta passagem do romancista.


Local de pastoreio, de defesa ou de romance, é um espaço que abre horizontes à imaginação de quem a montanha é um local de contemplação e onde propositadamente nos desprendemos de pedacinhos de nós próprios.

Depois de apreciar os muros do Fojo de Vilarinho e as encostas sobranceiras à Louriça, iniciamos a descida para a Barragem de Vilarinho das Furnas (ladeando a Corga Má) seguindo o traçado do Trilho da Serra Amarela.


































Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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