quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

A Serra! (V)

Esta é a quinta parte do artigo "A Serra!" que em Junho de 1935 os repórteres da defunda Latina escreveram após visitarem a Serra do Gerês.

Disponível no seu n.º 4 - Julho de 1935 (Vol. II), este artigo escrito por Camacho Pereira (Director da Revista Latina), descreve um passeio pela Serra do Gerês. O texto é aqui transcrito mantendo as suas características originais.

"(...)

Seguimos êste Prado da Messe que faz parte dos Prados Caveiros, é muito extenso e por êle em fóra vamos encontrando vitelinhos que se espolinham à vontade.

Mais uma subida, por entre os blocos que pizamos sussurra a água escondida, arbustos de ramagens fortes tolhem-nos o caminho.

Passamos junto à Fonte das Alvas, à Abelheirinha ao Cantarelo; num prado encontramos uma espécie de algodão, outros prados eram todos cheios de água e por fim atingimos um limite, o Alto do Peito da Escada é qualquer cousa de grandioso. Devassamos a outra vertente da serra do Gerez e devassámo-la sobranceiros de mais de quinhentos metros quási a pique e faz calafrios lembrar que é por ali que temos de descer.

É o quatro ponto de vista maravilhoso da serra do Gerez e quel dêles o melhor, qual deles o mais variado.

Elevam-se altaneiros, ao nosso nível, os três colossos, Las pêdo, ao nosso lado cortado a prumo sôbre o vale do rio Leonte, os picos da Bargiela entre o vale do Leonte e o do Homem, e o de Eiras na direcção da fronteira. Êstes três colossos têm umas lindíssimas peles, são todos cobertos por um arvoredo frondoso e verdejante, desde o fundo dos talwegues com os carvalhos seculares, até aos azevinheiros dos cabeços; nêste imenso anfiteatro ressoam centenas de cascatas que tombam de todos os lados, algumas como fitas de fogo reflectindo o sol no declínio.

É um assombro de vegetação em contraste com o assombro de esterelidade das Fechinhas, estamos em pleno ámago da região florestal, o vale de Leontesubindo até Leonte; o vale do Homem enorme, longínquo, onde se adivinha a geira romana; a nossos pés sempre arvoredo, avistam-se as casas-matas de Albergaria e da Portela do Homem; muito longe na planície que se abre despida e nua e que é já Espanha divisam-se as aldeolas galegas de Lobios e Imterime.

Mas temos de descer!

(...)"

Fotografia: © Rui C. Barbosa (Original da Revista Latina)

2 comentários:

joca disse...

Fantástico este artigo. É muito importante que se perceba a saneira que está a cometer com as taxas estúpidas que o ICNB quer estabelecer.
No livro de Tude de Sousa já há algumas referências a passeios de montanha, mas este relato demonstra claramente que o pedestrianismo já é uma prática antiga.
Parabéns

Rui C. Barbosa disse...

Correcto! De facto as actividades de montanha sempre tiveram uma adesão significativa em Portugal desde que a «moda» foi trazida lá de fora... se é que se pode falar assim. Certamente que a tradição de montanha já existia em Portugal antes da chegada da «villegiatura» ao nosso país, mas como sempre nos tratamos como uns atrasados seja em que for, nunca ninguém terá dado muito valor a isso.

O pedestrianismo em Portugal é de facto uma prática antiga.