O texto seguinte não foi escrito pelo autor deste blogue, mas na essência reflecte o sentimento de muitos de nós para os quais o Parque Nacional em geral e a Serra do Gerês em particular, são muito mais do que o destino de umas férias de Verão...
O texto é da autoria do Rui Humberto.
Apenas uma reflexão de uma noite de Verão...
Mês de Agosto no Gerês, especialmente no Arado e nas Barjas é de uma insanidade mental absolutamente aterradora.
Hoje resolvi levar a minha filha a conhecer mais um pouco do Paraíso. Local de partida: Arado. Cheguei por volta das 9h30, já um pouco tarde para o meu gosto. Ainda poucos carros, logo poucas pessoas. Óptimo! Ainda assim passagem a toda a velocidade pelo miradouro da cascata e só respirei fundo quando tive em ponto de mira a Giesteira. Em cerca de 3 km passei da "civilização" para o Paraíso. Em menos de uma hora estava no Vale da Teixeira acompanhado apenas pela minha filha e pelo Lord. E assim foi durante as cinco horas que lá passámos.
Ar puro, paisagens arrebatadoras, sombra restauradora, uma pequena lagoa para retemperar o corpo e para as brincadeiras da filha e do fiel companheiro para os quais água é sinónimo de felicidade. Como música de fundo "apenas" a brisa a acariciar as folhas das árvores e a água a correr por entre as rochas. Perfeito!
Chegadas as 15h30 resolvemos voltar com o intuito de dar uma volta por Pincães e Cabril. Chegada ao Portelo da Teixeira e já o cenário entrava em alerta vermelho. Lá de cima já se escutavam os grunhidos de gente sem civismo e que definitivamente não tem lugar num Parque Nacional. À medida que descíamos, o filme de terror adensava. Gente que se metia pela Giesteira mas queria chegar ao Poço Azul..."desculpe, mas quer ir para onde?", perguntei com um misto de incredulidade e já a entrar em estado de ebulição; gente que tinha subido do miradouro da cascata mas que não encontrava o caminho de volta... que estava a dez metros por detrás de umas rochas (precisamente de onde tinham vindo); na descida íngreme para o miradouro uns artistas que acham que masculinidade é sinónimo de imprudência e inevitavelmente um deles aterrou com os queixos cinco metros mais abaixo e miraculosamente não partiu nenhuma haste frontal contra um penedo... "estás bem?" (neste caso, como sinónimo silencioso de... que pena que não tenhas partido o focinho que assim já descias devagarinho como se aprende desde pequenino); chegado ligeiramente acima do miradouro tivemos que esperar uns bons minutos porque lá não cabia nem uma mosca tal a feira montada, e ainda por cima achando que "o cãozinho é tão giro" e que tinha que as/os aturar; finalmente quando percebo uma nesga de terreno livre rapidamente aproveitamos para dali sair... mas ainda a tempo de ver um grupo de escuteiros (!? há coisas que só vendo para acreditar!?) a tentar descer do miradouro para a cascata lá embaixo... no mesmo local onde já morreram pessoas, e mesmo tendo "rosnado" que o que estavam a fazer era demencial ainda fui olhado como alucinado porque afinal "qual era o mal?". "Nenhum", respondi. "Só tenho pena é dos que andam todos os dias a tentar salvar o vosso coiro!".
Não estava para mais chatices e por isso desci pelos degraus do acesso ao miradouro, contemplando um pai a subir com uma criança de colo a levar com o sol nas fronhas e a subir calçado com umas belas havaianas... certamente equipadas com o último grito de borracha aderente ao solo, assistindo ainda a uma senhora de provecta idade (certamente mais de 70 anos) amparada pelos netos(!?) e que lhe diziam carinhosamente "é só mais um bocadinho"...(de cerca de 50 metros de degraus degradados e acentuada inclinação para ver uma cascata sem água porque pasme-se... no verão há pouca água para selfies assinaláveis); chegados à ponte e já no caminho para o carro estacionado feito asno no cimo do estradão onde há espaço para o fazer sem incomodar ninguém, sendo brindados com óptimas colunas de pó levantadas pelas excelências que munidos dos seus SUV acham que por ali passa o rally; e finalmente, contemplar até ao cruzamento para a Ermida a quantidade abismal de carros estacionados (!?) em todo e qualquer sítio, inclusive deixando apenas espaço para a circulação de uma fila, e pedindo ajuda divina para não encontrar nenhum até sair dali para fora.
"Mas estas pessoas são todas malucas?".
"Não sei, filha. Mas já falta pouco para o fim de Agosto!"
Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
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