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quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Uma curta história da política florestal em Portugal

 


Nos últimos anos, Portugal tem-se tornado num palco de um verdadeiro circo com muitos palhaços em palco. A História da política florestal em Portugal esvai-se em fumo a todos os Verões e o país fica cada vez mais pobre e mais deserto.

Os sucessivos governos não souberam aplicar políticas de preservação da floresta e os espaços florestais que ao longo de séculos foram sendo dizimados ou plantados à sombra de decisões económicas, nunca garantiram o futuro das nossas florestas.

No seu livro "Portugal: O Vermelho e o Negro - A Verdade Amarga e a Dolorosa Realidade dos Incêndios Florestais" (Dom Quixote, Julho de 2006), Pedro Almeida Vieira fala-nos do "Mito Florestal": "Portugal alimenta vocações, recorrendo a mitos. Todos, por certo, terão já ouvido até à exaustão que o país tem vocação florestal! Esta locução, de tão repetida, tornou-se uma doutrina, tão excessivamente arreigada, por via da insistência com que os políticos a propalam, que já se transformou em doutrinária. E tão regida está por princípios supostamente imutáveis e absolutos, que quem procura refutá-la se arrisca a críticas. Contestemos, portanto, porque tem sido a assunção dessa vocação - definida, em qualquer dicionário, como a disposição natural e espontânea para produzir algo - uma das principais causas para a tragédia da política florestal.

Portugal, como território, pode até ter vocação florestal - como qualquer país que não sofra de clima desértico -, mas os portugueses não a têm."

A nossa floresta não tem estabilidade, organização e muito menos estrutura, o que impede a sua correcta e eficaz gestão. O resultado? Milhares de hectares ardidos, vidas perdidas (humanas e não humanas) e um chorrilho de interesses instalados que se premeia através desta hecatombe anual.

Por mais de 100 anos, os espaços florestais eram geridos pelos Serviços Florestais cuja origem é traçada até à Administração Geral das Matas do Reino, criada em 1824. Em 1886, e após uma gradual transferência dos serviços da Administração Geral para a Direcção-Geral do Comércio e Indústria, dá-se uma alteração significativa dos objetivos de política florestal, que passam a priorizar o racional aproveitamento dos terrenos estatais, comunitários e privados ainda incultos, incluindo a sua arborização e beneficiação silvopastoril. Por esta altura, os Serviços Florestais são ficam responsáveis pela arborização de dunas móveis do litoral e as serras do interior, iniciando (1888) os trabalhos nas serras da Estrela e do Gerês.

De notar que os Serviços Florestais encontravam-se organizados regionalmente por Circunscrições que integravam Administrações Florestais locais, com técnicos, guardas e pessoal florestal devidamente dimensionado, com "orçamentos anuais atribuídos pelos serviços centrais, resultando daí obra feita, de que se destaca a arborização dos baldios das serras do interior e das areias e dunas do litoral, a criação de viveiros florestais, a abertura de estradas e caminhos rurais, a correção torrencial em algumas bacias hidrográficas e a proteção de arvoredos" (Sr. primeiro-ministro: por favor, arrume de vez as florestas!)

Já por várias vezes relatei neste blogue como foi a relação entre os Serviços Florestais e as populações da Serra do Gerês (na Serra da Estrela e noutros espaços florestais as relações foram semelhantes).

Esta situação muda em 1993 com a extinção dos Serviços Florestais e desde então, dão-se sucessivas alterações, "cada qual pior do que a anterior" segundo refere Octávio Ferreira no seu artigo de 22 de Fevereiro de 2022, publicado no jornal PÚBLICO.

Em 1993 (Cavaco Silva) são criadas Delegações Florestais que vêm a substituir as antigas Circunscrições Florestais, e são também criadas as Zonas Florestais em vez das Administrações Florestais, tendo estas áreas de intervenção diferentes e sedes noutras cidades.

Em 1996 (António Guterres) surge nova alteração que desmantela por completo a estrutura dos antigos Serviços Florestais, surgindo os denominados "Serviços Florestais Regionais" que estão integrados nas Direções Regionais de Agricultura, ficando em Lisboa os Serviços Florestais Centrais sem serviços descentralizados. Nas Direções Regionais de Agricultura surge uma Direção de Serviços das Florestas com uma actuação insuficiente tendo em conta as acções a serem desenvolvidas.

Em 1998 os elementos então existentes da Guarda Florestal passam a depender única e exclusivamente dos Serviços Florestais Centrais. Cinco anos mais tarde (Durão Barroso) ocorre nova reforma do sector, com os Serviços Florestais Regionais a passarem de novo a depender dos Serviços Florestais Centrais em Lisboa. No entanto, os Guardas Florestais nunca mais regressariam às Matas Nacionais e baldios. Nesta fase já ocorre uma redução contínua de recursos humanos disponíveis, "devido à aposentação de funcionários sem que houvesse novas admissões, designadamente de técnicos e de assistentes operacionais." Em 2006 (José Sócrates), a Guarda Florestal é transferida para a Guarda Nacional Republicana.

Em 2012 (Passos Coelho) dá-se a integração da Autoridade Florestal Nacional (descendente dos Serviços Florestais) no Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), criando o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) - tutelado pelo Secretário de Estado do Ambiente e pelo Secretário de Estado das Florestas - mas em 2019 passa para a tutela do Ministério do Ambiente.

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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