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terça-feira, 19 de novembro de 2024

Os trabalhos dos Serviços Florestais na Serra do Gerês em 1910-1911 (parte III)

 


Esta é a terceira parte do artigo sobre os trabalhos realizados pelos Serviços Florestais na Serra do Gerês em 1910-1911. A primeira tarte poder ser lida aqui e a segunda parte pode ser lida aqui.

(A fotografia em cima mostra a Casa do Guarda do Vidoeiro antes da reflorestação)

Neste ano fez-se apenas uma sementeira num total de 36,5 hectares realizada na encosta da Pedra Bela e em seguimento e ligação com a sementeira do ano anterior que o fora em continuação de outras que em anos sucessivos se foram realizando desde 1907-1908 na encosta Nascente seguindo de Norte para Sul, desde o Rio da Figueira para a extrema de Porcas.

Por seu lado, fizeram-se importantes plantações de árvores dispersas em diversos maciços.

Na bacia do Rio Gerês, da Preguiça para baixo, escolheram-se as árvores essenciais que assim o exigiam, procurando-se as situações mais convenientes conforme as suas exigências e indicações culturais. Porém, fez-se uma plantação maior e continua na encosta de Secelo, do Rio da Figueira para cima, que neste ano se começou a conquistar para a arborização, e em maciço fez-se, como de mais importância, a plantação de 49.494 Pinus sylvestris e a de 19.120 Pinus Laricio Corsica.

A plantação de Pinus sylvestris fez-se do Rio do Forno, em Albergaria para Cagademos, de Norte para Sul, entre o caminho de Leonte à Portela e o Rio de Maceira, que entra no Homem abaixo da Ponte Feia.

Esta plantação fez ligação com outras da mesma natureza que vem já desde o Rio de Monção, adoptando-se a seguinte distribuição das plantações: do Rio de Monção para Norte, até ao Rio Homem, Pinus Laricio Corsica; do Rio de Monção para Sul, Pinus sylvestris, devendo-se em ambos os casos ir conquistando as encostas de baixo para cima nos locais onde a desnudação do terreno o permita.

Na bacia do Homem, em regra, só se tem empregado coníferas, porque aquela zona é muito frequentada de gado bovino em todo o tempo, mesmo de Inverno, e não chegam lá nunca, ou só muito raramente, as cabras, não tendo os bovinos nenhuma predilecção pelas coníferas. Não podendo exercer-se por lá uma fiscalização muito activa, está indicado, por este motivo, o critério adoptado.

Na bacia do Gerês, onde as condições de meio são mais temperadas e onde os cuidados de vigilância são mais activos, as folhosas são, se não as preferidas, pelo menos mais largamente empregadas.

Este ano, foi de 92.701 o número de árvores plantadas.

Continuaram-se os trabalhos de implementação e preservação dos viveiros florestais com os cuidados que têm merecido em anos anteriores, obtendo-se deles muitos milhares de plantas que anualmente se utilizam na arborização da Serra do Gerês e em cedência a outras matas, corporações administrativas e venda a particulares.

Além das 92.701 árvores plantadas, forneceram-se 1.000 à Câmara Municipal de Guimarães e 50 à Câmara de Terras de Bouro; venderam-se 500 e ficaram 146.909 árvores de diferentes idades, sendo grande o número de sementeiras de diversas espécies.

Foram realizados diversos trabalhos de limpeza de maciços, tais como em Gramelas, onde, além de antigas plantações de Pinus sylvestris, existe arvoredo espontâneo, e onde já no ano anterior se fizera limpeza; em Palheiros, em pinhal e arvoredo espontâneo; no Vale do Rio Caldo (Rio Homem) em pinhal; em Cagademos, Água da Adega, Leonte e Lage em arvoredo espontâneo; nas encostas do Escuredo e Pereira e na da Galeana em pinhais e no arvoredo espontâneo das ravinas respectivas, todas muito arborizadas.

Nestas limpezas procurou-se sempre arrancar as raízes dos matos de fácil rebentação, principalmente as urzes. Também se fez por meio da queima dos rebentos laterais e baixos e pela aplicação de petróleo co, azeite nos ramos altos e terminais o combate contra a Bombyx Processianaria na encosta da Pereira.

Tendo-se estabelecido na superintendência dos Serviços Florestais do Gerês, o posto de reprodução da raça bovina suíça de Schwitz, conforme as ideias da Direcção Geral em 1909, com o intuito de estudar as condições de adaptação e de valor daquela raça no Gerês, para a criação e fomento das indústrias dos laticínios, e não dispondo a mata de terrenos próprios para as instalações e para a cultura de forragens para aqueles animais, adquiriu a mesma Direcção Geral, pela verba de Expropriações da Repartição dos Serviços Florestais, as propriedades particulares pertencentes a Serafim dos Anjos e Silva, encravados na mata, desde Vidoeiro ao Rio da Figueira e Torgo. Tendo uma superfície de cerca de 15 hectares, apenas talvez uma terça parte estava em cultura, mas mal cuidada, por arrotear.

Toda a propriedade estava as más condições de granjeio, com as terras exploradas empobrecidas por uma cultura continuada quase sem estrumes e sem amanhos, de forma que se tornaram indispensáveis despesas inadiáveis com a abertura de novas levadas e reparação das existentes, levantamento de socalcos para segurança de terras, arroteamento de novos terrenos conquistados para a lavoura e outros, além dos serviços culturais que já se realizaram para as sementeiras e colheitas.

Igualmente, no Campo da Laje, comprado no ano anterior, se continuaram trabalhos para a sua adaptação à produção de ervagens e, quer neste, que nos de Vidoeiro e Palas, mais depezas há a fazer para os pôr em condições de tirar deles o melhor rendimento.

Tendo os Serviços Florestais adquirido um Junho de 1890, juntamente com os terrenos onde depois foi construída a casa da Repartição, a nascente de água do Forno Novo, chamada da Poça de Ana Tereza, nunca aquelas águas tinham sido aproveitadas perdendo-se pelo monte. Canalizaram-se e conduziram-se este ano para os terrenos anexos à Repartição para a sua rega, e como a nascente está a 147 metros acima da mesma casa, aproveitar-se-á esta circunstância para vir a estabelecer-se a sua defesa contra qualquer caso de incêndio, colocando-lhe as necessárias bocas para a alimentação de agulhetas.

Além dos trabalhos de conservação de vários caminhos, continuou-se a abertura do caminho do Vidoeiro à Pedra Bela, cuja construção foi autorizada pela Ordem de Serviço n.º 73, de 6 de Agosto de 1907, da Direcção Geral da Agricultura.

Pouco trabalho se produziu este ano, porque a maior parte da verba respectiva foi aplicada na construção da vacaria e anexos, custeados pela mesma secção do orçamento.

Iniciou-se o estudo do lanço da estrada da base do monte da Preguiça a Leonte feito pela Direcção das Obras Públicas de Braga, mas com pessoal auxiliar fornecido e pago pela Mata.

Tendo os terrenos de Vidoeiro e Palas, de Serafim dos Anjos e Silva, sido comprados especialmente por causa dos animais do Posto Bovino de Reprodução da Raça Schwitz e encontrando-se aqueles animais desde que vieram para o Gerês, em Julho de 1909, alojados num estábulo cedido por favor pela Sociedade de Melhoramentos do Gerês, deu-se logo começo aos trabalhos preparatórios para a construçlão da vacaria, cujo edifício, começando-se em Fevereiro de 1911, não ficou de todo concluído, mas já próximo a poder receber as vacas no fim do ano económico.

É uma construção ampla, espaçosa, ventilada, com todos os requisitos para bem servir ao fim a que se destina, tendo lugar para 20 cabeças e por cima um grande palheiro, com capacidade para algumas dezenas de carros de feno e palha.

Para melhor aproveitamento e fabricação dos estrumes, construiu-se junto da vacaria uma montureira coberta, para onde foram canalizados todos os líquidos da vacaria e onde se reúnem e manipulam os estrumes das camas dos animais.

Não ficou concluída, faltando-lhe calçar e cimentar o pavimento para o tornar impermeável e das uma aguada de cimento nas paredes interiores, para o mesmo fim.

Além do Posto Bovino Schwitz e dos porcos Iorkshire do ano anterior, estabeleceu-se em Abril de 1911 um Posto Hípico para cobrição de éguas, vindo para esse fim da Coudelaria Nacional o cavalo luso-árabe 'Quanah' de 7 anos de idade, que, depois de terminado o seu serviço especial, continuou no Gerês, para os serviços da Repartição. Foi muito apreciada pelos lavradores vizinhos a vinda deste animal, tendo sido muito procurado.

O touro suíço cobriu 14 vacas de lavradores da região, o porco Iorkshire cobriu 51 porcas e o Cavalo Quanah cobriu 32 éguas.

Tendo os faisões sido introduzidos com a intenção de se multiplicarem para povoamento da serra, instalaram-se de maneira a tentar-se a criação e multiplicação naturais, conservando-os num grande recinto todo fechado, de rede alta, para dentro se poderem conservar pequenas árvores, matos, pedras, água corrente, etc.

Deram entrada no Gerês em Agosto de 1909, vindos de Inglaterra, 6 machos e 13 fêmeas, tendo morrido uma fêmea na viagem.

Nos dois primeiros meses morreram 3 fêmeas, que chegaram já bastante magoadas, e outras mais e alguns machos foram morrendo, de forma que em 30 de Junho de 1910 havia apenas 4 machos e 7 fêmeas.

Como se ignorava a maneira de criar estas aves e como o intuito era deixá-las multiplicar-se livremente, ao fazerem-se as posturas, deixou-se ficar os ovos nos ninhos, esperando que as fêmeas os chocassem, mas, infelizmente, tal não sucedeu, passando os períodos de incubação, sem que as criações fossem surgindo. E assim se inutilizaram quase todos os ovos (cerca de 50), apesar do nascimento de algumas pequenas aves... que desaparecerem logo no dia seguinte, comidos por algum animal daninho, ou mortos por lhes faltarem os cuidados de que tanto precisam nos primeiros tempos.

Surgiu, porém, a ideia de se experimentar a criação com galinhas com a supervisão de Tude de Sousa e, dando a uma 17 ovos a 4 de Maio de 1909, obtiveram-se 9 faisões a 29 do mesmo mês. Destes, morreram 4, criando-se 3 fêmeas e 2 machos, que mais tarde se juntaram aos mais velhos.

Devido a circunstâncias que se atribui principalmente à falta de cuidados do pessoal encarregado de tratar dos faisões, e a distância a que eles estavam, em Albergaria, que impedia uma continuada fiscalização superior, a mortalidade foi continuando por forma que, no fim do ano económico findo, dos 19 vindos de Inglaterra e dos 5 criados no Gerês, já não havia senão 1 macho e 5 fêmeas, das quais apenas uma fêmea era das primitivas e de cuja postura não vingou nenhum ovo.

As outras fêmeas, como só tinham 1 ano, não puzeram qualquer ovo, de forma que nennhum faisão se criou no ano económico de 1910-1911.

Parece poder-se concluir que o melhor processo é a criação por meio de galinhas, sob as vistas cuidadosas de quem pelo caso se interesse e tanto assim, que da única galinha deitada em 1910 se obtiveram 7 faisões em 1910 e em 1911 obtiveram-se também por meio de galinhas na criação poarticular de Tude de Sousa e sob os seus cuidados directos, criações de faisão dourado, lady e daly x dourado.

De rseto, as grandes criações em Inglaterra, França e na Alemanha, fazem-se à mão em grandes faisendeiras, sendo dali depois levados às florestas onde são caçados e onde, por ventura, depis alguma fêmea criará também.

A 19 de Fevereiro de 1911 um grande incêndio percorreu grande parte da encosta de Palheiros e vizinhanças. O fogo foi lançado ao mesmo tempo no Rio de Palheiros, uma das ravinas e encostas mais arborizadas de carvalhos e mais pitorescas, seguindo pelas Gramelas a Calvos; no Penedo Redondo, perto da Portela, e nos Vales, e no Rio Homem, junto da ponte de S. Miguel para o alto, estes três últimos pontos com pinhal de várias idades.

Os estragos foram maiores onde havia pinhal; no resto, por haver arvoredo de grande desenvolvimento e o fogo correr com lentidão, devido à época, passou sem causar tão grande dano.

A região de Palheiros tinha já sido toda queimada por um dos maiores incêndios nos terremos do Estado, em Agosto de 1901.  

Plantações

Encosta de Monção

- Pinus Laricio Corsica..............19120

Encosta do Rio do Forno

- Ulmus americana nigre............300

Cagademos (Chã do Pereiro)

- Cedrus atlantica.......................19

- Cupressus glauca.....................50

- Pinus sylvestris........................16595

- Pseudo-tsuga Douglassi (Colorado).20

- Pseudo-tsuga Douglassi (Sprusse)...50

- Sequoia gigantea......................70 (TOTAL 16804

Chã de Ranhado

- Pinus sylvestris.........................32599

Preguiça - Secelo

- Cupressus glauca......................100

- Pinus sylvestris.........................2600

- Betula alba................................18

- Castanea vulgaris......................24

- Fagus sylvatica.........................1830

- Fraxinus americana alba...........190

- Platanbus orientalis...................6

- Quercus pedunculata................610

- Quercus americana rubra.........450

- Ulmus americana nigra............80 (TOTAL 5908)

Rampa da estrada para Leonte (Campo das Palas e Vidoeiro)

- Aylanthus glandulosa................97

- Eucalyptus blobus.....................68

- Robinia pseudo-acacia..............103 (TOTAL 268)

Encosta do Zanganho

- Fagus sylvatica..........................2760

- Fraximus amaricana alva..........425

- Quercus penduculata................2520

- Quercus americana rubra..........497 (TOTAL 6202)

Encosta do Escuredo

- Quercus penduculata................100

- Pinus sylvestria........................11400 (TOTAL 11500)

Texto adaptado de "Mata do Gerês - Subsídios para uma Monografia Florestal" (Tude Martins de Sousa, 1926)

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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