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segunda-feira, 24 de outubro de 2022

A 'Real Fábrica dos Vidros de Vilarinho da Furna'

 


Já muito se escreveu e é bem conhecida a história da Real Fábrica dos Vidros de Vilarinho da Furna que em tempos existiu na, actualmente submersa, Chã de Linhares, talvez na zona denominada como 'Ínsua da Fábrica', também submersa.

Pessoalmente, tinha uma certa «esperança» de que nas semanas anteriores o nível da albufeira da Barragem de Vilarinho das Furnas viesse a descer o suficiente para poder visitar tal local. (In)felizmente tal não foi possível com a chegada das tão necessárias chuvas ao nosso país. Certamente, ficará para outra altura, talvez quando a tão falada 'reparação da barragem' aconteça.

Assim, aquilo que se escreve aqui não é novidade, apenas um apontamento que nos faz relembrar a história da Real Fábrica dos Vidros de Vilarinho da Furna.

A 20 de Março de 1805, o príncipe regente D. João concedia a Feliz Jozé Pereira Lima a autorização para a criação de uma fábrica para a produção de «...diversas qualidades de vidros, na planície de Linhares." Aparentemente, Feliz Jozé Pereira Lima não conseguiu concretizar os seus objectivos de imediato, mas a 9 de Outubro de 1805 era criada a Real Industria de Vidro de Vilarinho da Furna, que era propriedade de Feliz, Gomes, Mattos, Araújo e Companhia.

A fábrica poderia utilizar "...sem reserva, embarcação ou ónus algum as lenhas, giestas e mais lenha, que lhe forem preciso de todos os bosques e matas, maninhos, seja qual for a distância." Localizada nas proximidades da mancha florestal da Albergaria e tirando partido do abundante quartzo e feldspato existentes na serra, a fábrica teria o fornecimento de combustível assegurado para a sua laboração.

Segundo Pereira Caldas na obra "O Vidro em Portugal" (Vasco Valente, 1950), citado por Rosa F. Moreira da Silva em "O Gerês de Bouro a Barroso - Singularidades patrimoniais e dinâmicas territoriais" (Outubro de 2011), a Real Fábrica dos Vidros de Vilarinho da Furna produziu "variados artefactos de nítida vidraria com auspiciosos prelúdios de longo alcance industrial, sendo só mal vista sempre de refalsados portugueses, para quem nada era a indústria pátria, ao passo de ser tudo para elles a indústria inglesa".

No entanto, e devido à sua ligação com a influência francesa, o destino deste investimento estava traçado. São apontadas duas datas para a sua destruição pelo fogo: 29 de Junho de 1808 e 11 de Julho de 1808. A 20 de Novembro de 1807 forças francesas e espanholas invadem Portugal, chegando a Abrantes a 24 de Novembro. Localizada não muito longe da fronteira da Portela do Homem, e numa zona de difícil acesso na época, "...a situação política política criada pelas invasões napoleónicas foi aproveitada para o desenrolar de graves tensões sociais locais..." No seu livro "Serra do Gerez. Estudos, Aspectos, Paisagens" (1909), Tude de Sousa refere que "(...) a ignorância e a má vontade dos povos próximos que não viam com bons olhos a sombra de tão poderosa vizinhança, cuja importância e benefícios não sabiam medir, e a intriga que intensamente se forjou dispuseram mal pelo futuro da fábrica; e assim foi que, com o pretexto da entrada dos franceses pela Portela, e capitaneados pelo abade de Carvalheira, seduzido por influências inglesas, que odiavam os progressos industriais do país, os povos assaltaram e saquearam a fábrica lançando-lhe fogo a 11 de Julho de 1808. Destruída, não mais pensaram os seus possuidores em a relevantar, caindo-lhe os últimos restos da parede, que ainda podiam ver-se em 1855/56".

A existência da Real Fábrica dos Vidros de Vilarinho da Furna é um aspecto importante na história do concelho de Terras de Bouro que por vezes nos passa despercebida e que deveria merecer um pouco mais de atenção.

Fotografia: Arquivo Aqualibri Biblioteca Digital do Cávado

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