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segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Histórias do povo de Cabril - "Os carvoeiros e o burro que pegou fogo"


Esta não é a história que me apraz contar, mas lembro as palavras do "Ti" João do Albino do lugar de S. Lourenço, que falava com autoridade do alto dos seus 82 anos: "Era tempo de fome e muita miséria, eu lembro-me de ser um rapazote e a minha mãe me mandar soltar os porcos, que andavam às cabeçadas à porta da corte, tinham fome, ela só dizia, ide a vossa vida e governai-vos, eram tempos ruins de miséria, tanto para os animais como para nós." Ou então as palavras do "Ti" Manel Barreiro: "Olha, eu passei tanto por essa serra, passei frio e fome, não havia nada, era só côdeas de pão milho, comi tanto, ainda hoje não posso ver o pão milho."

Eram realmente tempos muito difíceis, em que o povo de Cabril só vivia da terra e dos animais. Eram tempos que a Serra do Gerês estava cheia de gente; eram os agricultores que tinham o centeio nos currais, espalhados um pouco por toda a serra; era os contrabandistas a fazer pela vida, os guardas fiscais a tentar detê-los; e havia ainda os que se dedicavam a extracção do volfrâmio, o ouro negro, e que fez com que a serra fosse esventrada um pouco por todo o lado. 


Eram tempos que ser vezeireiro era um privilégio, e não era fácil conseguir esse trabalho, apesar de ser um trabalho sazonal de três meses a guardar e pastorear os animais na serra. Eram esses três meses que garantiam o sustento para o resto do ano, pois o vezeireiro era pago em géneros alimentares pelo resto da população. 

E depois havia ainda os carvoeiros, pessoas que passavam muito tempo na serra a arrancar os torgos de urze e a fazer os buracos para o carvão, como diz o "Ti" João da ponte: "Oh pá! Era um trabalho excomungado, era sempre sujo, todo negro, as mãos estavam todas gretadas, mas prontos dava para ganhar alguns tostões."


O "Ti" João da Ponte fala como uma pessoa conhecedora da realidade, ou não tivesse ele feito muito carvão e dormido muitas vezes nas cabanas da serra, e carregado muito carvão para o depósito no Teixo, é também ele que a determinada altura conta a história do burro que pegou fogo: "Naquela época andava-se a fazer o carvão no Cambeiro, andavam lá dois ou três homens, já não me recordo, e o Custódio do Luís e ele trazia um burro com ele, para o ajudar nas cargas, eles acabaram de fazer o carvão e carregou o burro e pôs outro saco às costas e começou a subir a serra pelo Curral dos Bezerros até à Cidadelha, onde naquela altura estavam a dormir. Era na cabana que guardavam a comida, e ele foi a cabana botar uma bucha, para depois subir a Revolta até ao Teixo, onde estava o depósito de todo o carvão feito na serra. Também havia lá uma loja que vendia pão e vinho, e mais umas coisitas, só que enquanto foi à cabana o burro desapareceu, andou para cima e para baixo e nada do burro, foi dar com ele passado umas horas, todo chamuscado, já perto da Arrocela, estava vento e o carvão não estava bem apagado e pegou fogo, coitado do burro, só parou quando as cordas que atavam o carrego arderam, e ele livrou-se do fogo. Andaram um mês a carregar o carvão as costas até ao Teixo, pois o burro teve de vir para a aldeia para recuperar, ainda se queimou bem, eram uns tempos... Mas olha que eu ainda me lembro é tenho saudades desse tempo, apesar da miséria, agora para vós é tudo muito fácil, naquela altura não havia nada de nada era trabalhar par sobreviver, era mesmo só para sobreviver... "

Texto e fotografias © Ulisses Pereira (Todos os direitos reservados)

Paisagens da Peneda-Gerês (MCCII) - Surreira do Meio-Dia

 


Os primeiros raios de Sol iluminam ainda de forma tímida os alcantilados graníticos da imponente Surreira do Meio-Dia, Serra do Gerês.

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

Previsão meteorológica para Nevosa/Carris (31 de Janeiro a 8 de Fevereiro)

 


Os dias vão continuar frios nas Minas dos Carris com as temperaturas a terem tendência para descer ligeiramente a partir de 3 de Fevereiro. Não está prevista precipitação.

domingo, 30 de janeiro de 2022

Serra do Gerês - Do Campo às Caldas e depois a volta

 


Esta foi uma caminhada entre o Campo do Gerês e as Caldas do Gerês aproveitando um dia de Primavera neste Inverno que nos engana com as suas manhãs de geada.

A saída do Campo do Gerês não foi muito madrugadora, pois primeiro era necessário homenagear o 25 de Abril exercendo o acto nobre da Democracia, mesmo que esta sirva para manchar a Assembleia da República com as nádegas sujas dos fascistas e liberais.

Tomando a direcção do Corvelho e Meadei, passamos o Ribeiro da Roda seguindo depois pelas encostas do Monte das Chãs até chegar ao Curral de Bostelo. Daqui, seguimos na margem oposta à Fraga Que Fala e chegávamos à Chã de Junceda passando pela Boca do Rio, prosseguindo da direcção do Miradouro da Junceda já no traçado da Grande Rota da Peneda Gerês (GR50) e do Trilho dos Miradouros (PR6 TBR). Seguindo este, iríamos ainda visitar o Miradouro da Boneca depois da Chã de Lamas e iniciávamos a descida para o Miradouro da Fraga Negra.

Deixando o Miradouro da Fraga Negra para trás, seguimos em direcção à Chã da Pereira (onde se localizava um antigo viveiro florestal e o Observatório Meteorológico) e depois passávamos pela Cascata das Caldas. Ainda no traçado comum à GR50/PR6 TBR, chegávamos ao Miradouro do Penedo da Freira sobre as Caldas do Gerês. 

Um texto de Tude de Sousa publicado na sua obra de 1927, "Gerez (Notas Etnográficas, Arqueológicas e Históricas)" ilucida-nos sobre a lenda da Freira (no seu texto original, aqui transcrito)


A Casa da Freira

Tem todos os visos de verdade aquela história de amor aventuroso da freira do Pôrto, que à sombra e aos murmúrios das árvores e das águas do Gerez se recolhera com o amante e que a tradição guardou com encanto até agora.

Na verdade, assim o confirmam as notas que próprio punho de Camilo Castelo Branco escreveu à margem do seu exemplar da Crónica de Cister, por Fr. Bernardo de Brito, edição de 1602, que pertencera ao mosteiro de S. Bento da Ave Maria, do Pôrto, e por onde as noviças faziam as suas leituras durante as refeições.

Nessas notas dizia Camilo que haveria então (1865) uns oitenta anos que uma freira fugida do convento se refugiara na serra do Gerez com o amante, indo ambos depois para Roma impetrar do papa licença para se casarem, o que com o tempo vieram a conseguir.

Tiveram filhos, e em Roma todos se ficaram, não impedindo, porém, êsses laços de amos e de sangur que o descaroável amante os abandonasse e á mãe, que por um irreflectido, ou impulsivo arrebatamento de paixão, rompera a clausura na forma em que o fêz.

Como à freira de Beja, o amor foi para esta desventurada o grande calvário da vida.

A todos valeu a protecção do papa Ganganelli, que educou os filhos da freira na vida clerical e lhes deu bom arrumo na vida.


Não dizem as notas de Camilo, nem o diz a tradição, os nomes dos dois heróis desta aventura, indicando apenas aquelas que a freira era tia de um professor do liceu do Pôrto na data em que êle as escreveu e esta que êle seria um castelhano; mas parece não ser, talvez, difícil reconstituir o drama em tôdas as suas prováveis minudências, seguindo o rasto que deixam bem aberto as alusões do romancista (1).

No nosso livro Serra do Gerez (Pôrto, 1909), referindo o caso dos amorosos foragidos, dávamo-lo como andando na tradição e reproduziamos um soneto que se dizia a êle referente.



Êsse soneto teve origem do seguinte:

Publicado aquele nosso livro, o falecido e sábio arqueólogo e professor, filho amantíssomo da serra, Padre Martins Capela, fêz-lhe várias anotações e referências em artigo publicado na revista católica Estudos Sociais, de Coimbra, no número de Junho de 1910 e, aludindo ao caso de lá se dizer que a lápide onde o soneto está gravado fôra encontrada por uns pastores de Vilar da Veiga e levada depois para o Bom Jesus de Braga, diz o seguinte:

«Há nisto um equívoco. A lápide, que ainda há poucos anos vi no Bom Jesus, nunca esteve no Gerez.

«O soneto foi composto por um professor de retórica, dr. Jerónimo, aqui de Braga, e mandado insculpir por uma roda de literatos românticos, com intenção de o irem lá colocar na tal cova ou quinta do Castelhano, o que, aliás, não realizaram. Isto tendo de uma testemunha contemporânea, digna de todo o crédito. Quanto à lenda, se algum fundo tinha de verdade, é presumível fôsse ampliada, por amor da arte, na mão dos românticos da época, que de muito menos faziam cousas bem maiores.»


Também Albano Belino, publicando o soneto no seu livro das Inscripções e letreiros da cidade de Braga e algumas freguezias ruraes (Pôrto, 1895), dia que a pedra fôra encontrada em 1844 ao abandôno, atrás da Igreja do Bom Jesus e que êle (o soneto) alude a um facto histórico acontecido na serra do Gerez, facto que, aliás, não explica.

A Casa da Freira, de que hoje não há restos, nem memória firme de situação, parece ter sido no local designado por Zanganho, antes chamado a Cova ou Quinta do Castelhano, logo após a saída das Caldas, à direita, no caminho para S. João do Campo, quanto aos versos evocadores da infortunada freira, que tanto padeceu por muita amar, são como segue e vem no livre de Belino:

Passageiro! êste chão que vês diante,
Na encosta dêste monte desabrido,
Dim castelhano foi que, perseguido,
Aqui se recolheu co'a terna amante.

Quebrando por êle a fé constante,
Que havia ao espôsp eterno prometido,
Trocou por ermo agreste e desprovido
Sua cela mimosa e abundante.

A era em que isto foi vai indo perto;
Mas da choça que aos dois prestou abrigo
Nem sequer um calhau se aponta ao certo.

Tudo o tempo varreu, levou consigo,
E só tradição no livro incerto
Se encontra o caso que eu aqui te digo (2)

Mas, nem só os velhos românticos de Braga se impressionaram com o sabor apaixonado da lenda da probre freira: o tema, próprio para excitar as fibras de maior sensibilidade dos corações, deu rebate também à inspiração deliciosa de Azul, um distinta Senhora (D. Zulmira Franco Teoxeira Falcarreira), que muiyo queria ao Gerez, para o soneto que se segue, por ela publicda em Agôsto de 1913 (3), e que aqui fica também a perfurmar a suavíssima tradição da que trocou as delícias da clausura e do hábito, pelos espinhos cruciantes da aventura e do pecado, embora êle, talvez por necessidade de rima, altera bastante a tradição.

A Casa da Freira
(Lenda gereziana)

Para a mais pitoresca e recortada
Serra que existe - a Serra do Gerez -
Fugiu, segundo a lenda, uma vez,
Uma freira professa e excomungada.

Segue-lhe os passos pela rude estrada
Um desertor, oficial francês;
De amor funde-se o hábito e o arnês
No seio de uma brenha ensombreada

Trinta anos sofre a natureza bruta
Os amores sacrilegos da gruta,
Que a mêdo as águas segregando vão...

E ainda hoje, em sonhos, julga o forasteiro,
Verna rocha uma espada de guerreiro
Envolvida num véu de profissão.

(1) As interessantes notas vêm reproduzidas no livro Camilo, 16 de Março, 1825-1925, comemorativo do centenário do nascimento de Camilo Castelo Branco, editado pela Comissão, a páginas 57 e 58, em artigo que o seu autor, o sr. J. M. Cordeiro de Sousa, teve a amabilidade de nos comunicar e para o quel remetemos o leitor.

(2) Este soneto tem umas pequenas variantes o que vem publicado no nosso livro e que não nos recorda já onde e como o obtivemos. Talvez no jornal de Lisboa O Século, de 11 de Setembro de 1908, onde, em artigo datado de Braga e assinado, A. R. se diz: «Ao lado do Hotel do Sul, na encantadora estância do Bom Jesus do Monte, ergue-se e mostra-se uma elegantíssima fonte... Por detrás mesmo dessa fonte... está o tal granito onde se gravou com esmêro e cuidado, o ligeiro drama de amor que teve por scenário a cordilheira do Gerez». Ainda sôbre êste assunto, dizia-nos em Janeiro de 1913 o distinto publicista sr. Alberto Veloso de Araújo: «O soneto que V. apresenta no seu belo livro Gerez mereceu do velho Guimarães da Estamparia do Bolhão. Êste Guimarães falecido aos 94 anos de idade, foi íntimo amigo do Dr. Advogado, velho cliente e autor do soneto. Há mesmo dêste advogado lisboeta uns lindos versos de consagração às águas do Gerez. O velho Guimrães recitou muitas vezes êsse soneto ao genro, que o possui e conhece muito bem a lenda». Também nos nossos apontamentos encontramos a nota, cuja autenticidade não pudemos verificar, de que um jornal de Braga publicava em 1885 ou 86 um artigo do falecido dr. Pereira Caldas, relativo a êste assunto.

(3) Em um jornal, cremos que o Diário de Notícias, de Lisboa, de onde ao tempo o recortámos.

Deixando aqui o traçado da GR50, seguimos pelo PR6 TBR até Pedrogo onde fizemos uma paragem para o almoço antes de iniciar a longa subida em direcção a Junceda. O percurso vai-nos levar a passar na proximidade do antigo Viveiro da Vacaria no Vidoeiro, passando acima das Palas e pelo Campo Grande, subindo depois encosta acima em direcção à Fraga do Torgo e passando sobre a Roca Grande e perto da escondida Cascata do Torgo, antes de vencer os metros finais até Junceda.

Entrando de novo no traçado da GR50, seguiu-se pela Chã de Junceda e através de uma paisagem que teve uma magnífica intervenção por parte dos Sapadores Florestais, até chegarmos ao ponto de partida na aldeia do Campo do Gerês no final de 21,1 km e 994 metros D+.










Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

Paisagens da Peneda-Gerês (MCCI) - Olhando a Calcedónia

 


Olhando a Calcedónia, Serra do Gerês, com o céu em tons de nuvens de fumo das inúmeras queimadas neste e noutros dias.

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

sábado, 29 de janeiro de 2022

Trilhos seculares - O desafio da Escaleira até ao Lago Marinho

 


O desafio está sempre lá, a olhar para nós todas as vezes que passamos Cabril a caminho das terras altas de Xertelo ou para rumarmos a paragens cada vez mais embrenhadas em Trás-os-Montes. Sabemos que a parede não é inexpugnável, mas aquelas vertentes quase a prumo escondem os velhos carreiros seculares que os pastores, carvoeiros, contrabandistas e apanhistas das terras de Cabril foram abrindo por entre as dobras do granito, aproveitando os patamares que a orografia lhes foi concedendo.

Com o passar dos anos, estes trilhos vão-se enchendo de vegetação que esconde a história daquelas gentes que foram fazendo as tréguas possíveis com a serra que os mira silenciosa. É como um Adamastor adormecido que ali se ergue, imponente, rude e sem misericórdia para quem o desafia pensando que - mesmo que o suba - o terá vencido. Não, a montanha apenas teve compaixão por quem a venera e respeita.

É assim a subida da Escaleira iniciando no lugar de Cabril; algo que se deve fazer com respeito e em profunda veneração pela sua imponência que se agiganta a cada vislumbre das paredes alcantiladas da Surreira do Meio-Dia.



Iniciando o dia em Cabril, continuamos através de Cavalos para o Rio Cabril, passando por Porto de Chãos, Chão e atravessamos o rio no Pontelhão. Daqui, seguimos para o Carvalhal onde se toma um carreiro que lentamente nos vai levar a ganhar altitude até chegar à Laje da Ponte, empinando serra acima até chegar ao Vale da Escaleira, seguindo pelas Lajes da Escaleira para a Chã da Escaleira e Chã das Edras, passando nos Picotos para o Vale Pedra Cavalos. Toda a subida deve ser feita com cuidado e apreciando a paisagem que se vai afundando atrás de nós. O vislumbre das paredes da Surreira do Meio-Dia merece paragens contemplativas e o mesmo se deve fazer para o Vale do Rio Cabril no qual os pequenos lugares e a paisagem humana se vão desenhando com menos detalhe à medida que ganhamos altitude. As paisagens são únicas e deslumbrantes, e mesmo o Fojo de Xertelo nos vai parecer como que apenas um estranho e alienígena desenho na vertente da montanha.




O carreiro pelo Vale Pedra Cavalos, recentemente intervencionado pelas gentes de Cabril, vai-nos levar até ao estradão da EDP (que termina no Porto da Laje), descendo depois ligeiramente para os Currais de Virtelo. O carreiro vai sendo assinalado pelas altas mariolas que eventualmente nos levam até ao Lago Marinho.

Segundo Carlos M. Ribeiro (que o refere como 'Lagoa do Marinho'), o Lago Marinho está "(...) situada no sector sudeste da Serra do Gerês, dentro da bacia de drenagem do ribeiro do Couce (afluente do rio Cabril), a Lagoa do Marinho é uma área endorreica - o escoamento das águas faz-se através de uma depressão interior, sem saída para o mar. 

Parte da sua área envolvente está ocupada por uma moreia terminal em forma de arco. Para os menos conhecedores da matéria, as moreias são um amontoado de sedimentos com diversas dimensões, que foram transportados e acumulados pelo glaciar à frente e aos lados da língua glaciar, até quando e onde este se fundiu. Quando observadas ao pormenor, permitem a reconstituição do movimento glaciar, e são um indicador fundamental dos limites de máxima extensão da glaciação. Significa isto que, o limite de um dos glaciares que ocupou a Serra do Gerês, foi a Lagoa do Marinho. 

Com uma orientação nne-ssw, esta é ocupada por uma turfeira com cerca de 100 metros de comprimento por 50 metros de largura. A título de curiosidade, as turfeiras são habitats naturais de elevado valor biológico que ocorrem em biótopos permanentemente encharcados. São consideradas um dos maiores reservatórios de carbono do planeta, e a acumulação do CO2 é vista como uma das alternativas para atenuar o aquecimento global - na sua maioria são atapetadas por musgos (género Sphagnum), onde coexistem também bolas de algodão (Eriophorum Angustifoliumas), Urzes (Calluna Vulgaris), Tojos (Ulex Minor) e plantas insectívoras como a Orvalhinha (Drosera Rotundifolia). 

Topograficamente, esta lagoa posiciona-se dentro de uma área de relevo aplanado sobre um substracto granítico a cerca de 1200 metros de altitude. A esta altitude, ainda que relativamente baixa, e na presença de uma maior concentração de raios ultra-violetas e de uma menor poluição atmosférica, o azul do céu já é dominante (...)."





Após uma visita ao Lago Marinho, descemos então para o Abrigo de Lagoa, local de uma paragem para o almoço e merecido descanso após tremenda trepada desde Cabril. O silêncio profundo da montanha envolve o visitante que se deixa embalar pelo ocasional soprar do vento e por um estranho calor de Inverno que nos aquece a pele ainda com a memória das primeiras horas gélidas da manhã em terras de Cabril.

Eventualmente, é então hora de encetar o regresso, seguindo em direcção a Lagoa e tomando o estradão no sentido descendente. Nas proximidades da Roca Alta, seguimos então por um velho carreiro que nos levou a passar por Lajes de Lagoa, seguindo então pelo Couçadoiro, Teixinhal, Curral do Carvalho, Penedo do Encosto e Porto Tapado. Caminha-se por pequenos vales e corgas que impedem o correr do vento e consequentemente da brisa fresca de uma tarde de Inverno, aumentando a sensação de calor fazendo despir os corpos. Chegando a Porta Fernandes, temos já o vislumbre de Taboucinhas.

Taboucinhas guarda a história do "Ti" Secundino. Na verdade, ninguém sabe dizer de onde veio o "Ti" Secundino, apesar de ainda existir muita gente que o conheceu. Dizem que apareceu em Cabril com uma filha, pois antigamente aparecia assim muita gente que ficava a dormir nos palheiros. Havia muitos pobres, muita gente a fazer esse modo de vida. Ninguém sabia qual era a terra dele, alguns dizem ser de Cabeceiras, outros de Fafe e ainda aqueles que afirmam ser de Celorico. Veio para Cabril como resineiro e acabou por ficar, fixando residência no lugar de Cavalos, no sítio da Balteira e por lá ficou, até que teve a possibilidade de comprar uma parcela de terreno a comissão fabriqueira de Cabril. Porém, o pedaço de terreno era muito longe das aldeias, demasiado longe, e estava localizado em Taboucinhas, mesmo no começo da serra. Isso não o desanimou o "Ti" Secundino, que murou o pedaço de terreno, cavou, lavrou, procurou água, fez duas poças, construiu casa.

O homem passou a morar em Taboucinhas, cultivava batatas e milho na sua época, couves, vinho, tinha árvores de fruto, chegou a criar porcos e galinhas. Apesar de ter a residência na aldeia de Cavalos, o "Ti" Secundino e o seu burro, só desciam quando as condições eram muito adversas.

Com a morte do "Ti" Secundino, tudo em Taboucinhas e na sua "mini" branda morreu. A casa acabou por arder, restam as paredes. As cerejeiras caíram, as vides morreram, as couves e as batatas deram lugar a silvas, tojos e fetos, sinais do tempo...

Após um curto descanso em Taboucinhas, inicia-se a jornada final até Cabril, descendo pela Corga do Gavião, Gavião, Cavada, Queixadoiros, Buracos e Azerim, através de uma refrescante sombra proporcionada pelo arvoredo que nos fez ter uma trégua do Sol. Descíamos então pela Encosta do Carvão para o Carvalhal - por onde havíamos passado de manhã - e enveredamos por São Ane, atravessando o Rio Cabril e finalmente chegando ao nosso ponto de partida depois de uma jornada de 16,9 km com 941 metros D+.

Ficam as fotografias do dia... 




























Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)