O Corrego de Cambeiro, que confundia com a Corga de Valongo, era daquelas zonas na Serra do Gerês que nos incutia respeito só de olhar para as curvas de nível num mapa. Foi assim a primeira vez que «li» sobre a Corga de Valongo, neste caso o Corrego de Cambeiro, quase como um lugar impenetrável no coração do Gerês.
Mas como em quase todos os lugares do Gerês, e por ser uma serra na qual o Homem tem uma relação de simbiose com a mesma, por entre a imensa vegetação que por lá fora crescendo devido às alterações nessa relação escondia-se quase de certeza as suas marcas. Impenetrável, restavam os relatos dos habitantes das aldeias de Pincães, Fafião, Cabril e de outros lugares que contavam como o carvão era fabricado e depois transportado serra fora para um local de venda no Teixo, Vale do Rio Homem.
Assim, os carreiros e abrigos iam desaparecendo quer da paisagem, quer da memória. Sabia que logo no início do Corrego de Cambeiro, quase à sombra das Quinas de Arrocela, existia (existe) um curral, o Currais de Conze, mas o que existia para lá deste espaço permanecia um enigma.
Infelizmente, há uns anos atrás, um incêndio criminoso varreu o Corrego de Cambeiro e muitas das corgas, e vales na zona. Muitos destes lugares, especialmente aqueles mais afastados das zonas húmidas, estão transformados em zonas quase desérticas onde a vegetação demora a retomar a paisagem.
O que resta dos caminhos no Corrego de Cambeiro está agora visível e a oportunidade surgiu para visita-la antes que a Natureza a volte a fechar. Paisagem granítica onde restam poucas árvores de grande porte que tenham sobrevivido, a Corga de Valongo inicia-se no início do Rio da Pigarreira e termina na base da Torrinheira (Cabeço da Cova da Porca, Estorrinheira). É ladeada no seu início a Sul pelas Quinas de Arrocela (lado esquerdo) e pelas vertentes Nascentes de Porta Ruivas (lado direito). A corga era percorrida por um carreiro em quase toda a sua extensão, carreiro esse quase desaparecido devido à erosão das encostas e que a certa altura permitia o acesso ao Curral de Borrageiros, levando também às proximidades da Mina da Arrocela.
Encontrei três características interessantes no Corrego de Cambeiro: os já falados Currais de Conze perfeitamente delimitado e com um abrigo pastoril alagado, um abrigo de pedra solta que denominarei de Pala de Cambeiro (agradeço qualquer correcção) e uma magnífica zona de derrocada de época geológica que marcou e modificou de forma profunda a paisagem do Corrego de Cambeiro.
O percurso desta jornada Geresiana levou-me desde a Portela de Leonte a passar pela Chã do Carvalho, Vidoal, Preza, Chã da Fonte e percorrer a Chã de Gralheiras em direcção à Lomba de Pau, Conho, Porto do Ribeiro das Vacas e a ladear o Curral da Pedra e os Prados da Messe. Entrando no Gerês profundo, passei ao lado do Curral de Bezerros e mais adiante ao lado do Curral de Premoinho. Seguindo o carreiro em direcção ao Borrageiro, divergi a certa altura para descer a Corga de Valongo, tendo-a percorrido na sua totalidade. No fim do Corrego de Cambeiro, e passando os Currais de Conze - maravilhando-me com a imensidão dos alcantilados graníticos das Quinas da Arrocela que se precipitam sobre o vazio - e o Sobreiral, segui em direcção ao Porto da Laje e depois para o Curral da Touça, local de merecido descanso. Deixando a Touça para trás, enveredei pelo Vale do Rio Laço e passei pelo Curral do Laço, subindo depois para o Estreito e seguindo para o Curral de Vidoeirinho, Curral de Rocalva, Curral de Roca Negra, Arco do Borrageiro e Chã da Fonte, descendo depois à Preza e Vidoal. Daqui, voltei a Sul para passar no Mourô, Corga de Mourô, Curral da Raiz e desci a Costa da Cantina, chegando depois à estrada nacional EN103-8 até tomar o velho caminho florestal de volta à Portela de Leonte passando pelo Escalheiro.
Algumas fotografias do dia...
Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
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