O trilho para as Minas dos Carris inicia-se a uma altitude de 720 metros na margem esquerda do Rio Homem quando este é atravessado por uma ponte de alvenaria erradamente designada Ponte de S.Miguel. Iniciando o caminho, rapidamente nos apercebemos que não será fácil para os mais desprevenidos. A sua dificuldade vai aumentando ao longo do percurso não tanto pela inclinação, mas mais pelo estado do próprio trilho. Em quase 9,8 km de extensão, é na sua maioria composto por pedra solta que dificulta a progressão. São escassas as extensões em que o terreno é suave.
Na quase totalidade do seu comprimento o caminho é acompanhado pelo jovem Rio Homem e o seu rumor por entre as rochas acompanha-nos quase sempre.
Convém salientar que este traçado está inserido num vale de extrema importância para o Parque Nacional da Peneda-Gerês e que para o seu percorrido deverá ser solicitada a respectiva autorização ao Instituto da Conservação da Natureza e Florestas por se encontrar numa Zona de Protecção Total.
No início dos anos 90 ainda era possível observar ao longo do Vale do Alto Homem uma linha de postes de madeira sobre os quais assentava o cabo metálico de telefone, que permitia as comunicações com o complexo mineiro. Nos nossos dias são raros os sinais, ao longo do caminho, daquilo que mais tarde iremos encontrar no sopé de Carris. Tirando os trabalhos mais recentes levados a cabo pelo Parque Nacional da Peneda-Gerês, com o objectivo de melhorar o caminho para a reflorestação de zonas de alta montanha, é possível observar, mesmo no início do trilho, conjuntos alinhados de rochas que marcam o que então teria sido uma estrada em terra batida que permitia a passagem de camiões para o transporte do minério e não só. Como curiosidade, posso referir que no início da sua construção existia um pequeno caminho que ligaria a Portela de Leonte a Carris e pelo qual as largas telhas que iriam cobrir as casas mineiras eram transportadas em ombros pela quantia de 2$50 nos idos anos de 40. Voltando aos nossos sinais... ao longo do trilho vamos observando um ou outro pequeno muro, ou um ou outro alinhamento de pedras que nos podem sugerir a existência de uma rude estrada serrana. O primeiro sinal sólido da existência de algo mais complexo na serra, surge-nos junto da zona que dá pelo nome de ‘Água da Pala’. Aqui, e já coberta pela vegetação, observamos à nossa esquerda (não se esqueçam de que estamos a subir o trilho, cansados... mas a subir!!!) uma área delimitada por um pequeno e baixo muro. Em tempos terá servido de curral para abrigo dos rebanhos, tal como é referido num artigo publicado no Século Ilustrado em 1955. Do lado direito podemos observar, também por entre a vegetação, uma pequena construção com tijolos de cimento que nos dá a ideia de ser uma pequena guarita, mas que foi referenciada como um pequeno abrigo dos cantoneiros que mantinham o estradão em estado de circulação. Esta zona antecede uma ponte de pedra. Toda este lugar é extremamente peculiar e bucólico.
Na Água da Pala iniciava-se um trilho de pé posto que, embora não estando assinalado na Folha 31 – Outeiro (Montalegre) da Carta Militar de Portugal (escala 1:25 000), editada em 1997 pelo Instituto Geográfico do Exército (IGeoE) e baseada em trabalhos de campo levados a cabo em 1996, surge numa edição mais antiga baseada em trabalhos de campo desenvolvidos em 1949. Este trilho atravessava o Rio Homem e subia ao longo do rio pela sua margem direita no sopé da Encosta do Sol até atingir o topo do Cabeço do Modorno, algumas centenas de metros após atravessar novamente o Homem sensivelmente à cota de 1050 metros de altitude. Não havendo registos cartográficos deste trilho em direcção a Carris, documentos fotográficos atestam a sua continuação para as zonas mais elevadas da serra. Quem observa a Encosta do Sol a partir da Água da Pala, terá a sensação de ainda poder vislumbrar o traçado deste pequeno trilho que, sem dúvida, nos proporcionaria uma visão distinta do vale. Porém, e após várias tentativas de observar no terreno a sua progressão, cheguei à conclusão de que este trilho já desapareceu e será extremamente difícil tentar seguir o seu antigo percurso, senão mesmo impossível.
Após passar a Água da Pala, o trilho para Carris entra numa zona mais plana. Até aqui, e olhando para a nossa direita, temos a oportunidade de observar os picos escarpados que delimitam os Prados Coveiros (segundo a Folha 31, com trabalhos de campo de 1949) ou Prados Caveiros (segundo a Folha 31, com trabalhos de campo de 1996 e edição de 1997). Esta fase mais plana do trilho segue pela Ponte do Cagarouço sobre a Ribeira do Cagarouço, um pequeno afluente do Rio Homem. É nesta fase que o caminho se volta a inclinar ligeiramente e ouvimos o rugido do jovem rio a poucos metros de distância. Por entre a vegetação é por vezes fácil ter um olhar sobre lagoas que no Verão são sempre uma forma de retemperar forças.
O trilho ultrapassa a cota dos 1000 metros de altitude, a poucos metros de entrarmos numa fase do caminho onde vamos superar vários metros de altitude em pouca distância, ultrapassando assim um bom declive. O trilho flecte para a direita no que são conhecidas como as ‘Curvas do Febra’ e em pouca distância subimos 30 metros em altitude antes de flectir para a nossa esquerda. Nesta parte do caminho podemos ter uma imagem do Vale do Homem só superada pela paisagem que nos aguarda poucos metros após a passagem da Ribeira do Modorno. Poucos metros mais à frente entramos numa parte do caminho que é ladeado, à direita, por uma parede sólida de granito e, à esquerda, por uma queda de 50 metros que termina no Rio Homem. O declive aqui é acentuado e notório, mas o esforço para chegar à meia distância merece a pena.
Somos chegados a meio do caminho e o descanso na Ponte do Modorno é merecido. A água da ribeira é sempre fresca e corrente, mesmo no Verão. Ao entrar neste pequeno vale temos a visão de uma pequena queda de água por debaixo da ponte e são poucos os que resistem a uma fotografia. Situados na ponte em direcção ao final do vale, por onde vemos o Rio Homem, temos à nossa direita o imponente Cabeço do Modorno, uma escarpa granítica que atinge os 1317 metros de altitude (Folha 31 / 1997). Conheci todas as pontes até ao Modorno já em cimento, mas o meu fascínio por este vale e por Carris começou a ser despertado pelas velhas pontes de madeira que antigamente permitiam a passagem célere e um tanto ou quanto aventureira.
É sempre bom descansar e retemperar forças junto do Cabeço do Modorno, mas é hora de prosseguirmos pois, logo ali à frente, temos uma surpresa à nossa espera. Prossigamos então a nossa caminhada. Logo após abandonar a Ponte do Modorno e seguindo o nosso trilho, vamos encontrar uma das mais fantásticas paisagens que a Serra do Gerês tem para nos oferecer. É com deslumbre que observamos o Vale do Alto Homem e a forma como este se projecta no céu. O seu delimitar pelos picos das serras leva-nos a imaginar, sonhar um mundo antigo. Atenção ao vocabulário, pois é aqui que nos começam a faltar as palavras... Ao longe vemos a Serra Amarela e com bom tempo facilmente se vislumbram as antenas do Muro localizadas na Louriça. Saindo do pequeno vale da Ribeira do Modorno entramos novamente no vale por onde corre o Homem e logo ali à nossa frente observamos uma estreita queda de água com uma altura superior a 110 metros, a Água da Laje do Sino. Toda este zona proporíamos paisagens deslumbrantes em ou após dias de chuva com as paredes rasgadas pelos cursos de água que se precipitam no vale, ou então nos frios dias de Inverno com a imagem das quedas de água geladas que se amarram às paredes graníticas.
Prosseguindo o trilho ao longo do vale vamos ganhando altitude, atingindo os 1200 metros de forma suave. Nesta fase o trilho chega a complicar-se devido ao estado do «pavimento». O Rio Homem é, nesta fase, constituído por uma série de pequenos ribeiros que têm origem nos inúmeros vales que golpeiam o topo da serra. Aos 1200 metros de altitude, na zona do Teixo (que assim se chama porque se diz que antigamente ali existia uma árvore desta espécie), o trilho flecte ligeiramente para a direita seguindo um dos pequenos riachos que, juntamente com o riacho do Corgo dos Salgueiros da Amoreira, irá mais tarde formar o Rio Homem. O nosso trilho segue a base da Rocha da Água do Cando, passando pela Ponte das Águas Chocas (1285 metros) e entrando nas Abrótegas até atingir a Ponte das Abrótegas (1325 metros). As Abrótegas definem, juntamente com o Outeiro Redondo, um pequeno planalto que é atravessado pelo trilho até atingir e seguir ao longo da base do contraforte de Carris. Foi neste planalto onde esteve montado nos dias 17 a 19 de Setembro de 1908 o acampamento da primeira expedição venatória levada a cabo na Serra do Gerês. Neste planalto têm origem vários trilhos de pé posto, sendo o mais interessante aquele que segue para as Minas das Sombras (Espanha) e para os Cocões do Concelinho (através das Lamas de Homem) e, mais tarde, Minas do Borrageiro e Lagoa do Marinho. Na Ponte das Abrótegas somos interrogados por umas peculiares construções semelhantes a pequenos pilares de rocha e cimento que tinham essa mesma função. Estas construções serviriam de ponto de apoio, certamente de uma conduta metálica para transportar água desde uma pequena represa ali existente até à lavaria nova situada no topo da Corga de Lamalonga. A paisagem aqui permite-nos observar o marco geodésico de Carris (1508 metros), o Altar de Cabrões (1538 metros), tal como é denominado na Folha 31 / 1949, ou Altar dos Cabros, segundo a Folha 31 / 1997 (com a indicação de 1490 metros e estando deslocado em relação à referência anterior). Neste planalto podemos também observar vários currais destinados às pastagens de altitude e à transumância ainda levada a cabo na Serra do Gerês.
A zona das Abrótegas permite o descanso antes da subida final, verdadeiro calvário para quem já está cansado da subida. Ao percorrer o início da subida, um pormenor passa despercebido à quase totalidade das pessoas. Logo no início do declive a antiga estrada dividia-se em duas, com uma a seguir a direcção do Salto do Lobo, local onde decorreram as primeiras explorações de volfrâmio tirando partido do aluvião vindo da Corga da Carvoeirinha. No terreno é difícil vislumbrar sinais desta parte da estrada e só andando alguns metros no caminho principal que segue em direcção a Carris, e depois olhando para trás, é que se vê a antiga estrada já coberta de vegetação. Nesta área não existem construções ou edifícios, exceptuando uma ou outra pequena construção de pastores (os 'fornos') ou outros abrigos. Esta zona provavelmente teria o apoio de edifícios de madeira dos quais não existem quaisquer sinais. Por esta zona deveria passar uma conduta de água que teria a sua origem numa pequena represa próximo da Ponte das Abrótegas e que, apoiada em pilares feitos com aglomerados de pedra, atravessava o pequeno planalto para lá das Abrótegas. Mais pilares são visíveis no extremo deste planalto, que serve de pastagem de altitude ao gado que nos meses da vezeira passeia pela serra, já próximo do caminho antes deste flectir para a esquerda para iniciar a subida final. Seguindo o prolongamento deste caminho secundário e depois entrando em trilhos de pé posto, chega-se às Minas de Carris pela sua zona inferior junto da lavaria nova, no extremo topo do vale da Corga de Lamalonga.
Mas voltemos à estrada principal e iniciemos a subida final para Carris. A parte final da estrada vence um declive de 70 metros ao longo da Corga da Carvoeirinha e sem dúvida que é para muitos a parte mais complicada de todo o trajecto. No entanto, o final do árduo caminho é sempre uma motivação forte para vencer estes últimos metros.
No troço final o declive torna-se menos intenso, com a estrada a tornar-se quase plana mesmo a chegar ao muro que delimitava a entrada no complexo mineiro de Carris.
Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)
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